Ao menos 35 empresas teriam deixado consórcio do DPVAT

Debandada ocorre em meio a denúncias de fraude e gestão temerária de recursos públicos

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Já somam 35 as baixas no consórcio do DPVAT, o seguro obrigatório para proprietários de veículos que é alvo de investigações sobre fraudes e gestão temerária de recursos públicos. A debandada inédita na história do seguro representa quase 80% do seu quadro acionário.

O prazo para que os associados peçam desligamento a partir do dia 31 de dezembro expirou nesta sexta. As baixas são muito superiores às do ano passado, quando 17 empresas, que representavam 25% das ações, decidiram sair.

As desistentes não comentam as razões da saída, mas o setor vê o movimento como uma estratégia para evitar desgates de imagem ou eventual responsabilização em caso de condenação da Seguradora Líder, empresa que administra o seguro, em investigações sobre as fraudes.

O grupo que pediu desligamento inclui desde subsidiárias de grandes bancos, como Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Bradesco, e seguradoras de todos os portes. O movimento veio à tona há uma semana, quando a Porto Seguro, maior acionista, comunicou ao mercado a sua saída.

A Folha apurou que os bancos estatais responderam também a determinação do governo, que tentou extinguir o DPVAT no fim de 2019, mas foi contestado pelo STF (Supremo Tribunal Federal), em ação movida pela Rede Sustentabilidade.

Após a derrota judicial, a Susep baixou o valor do seguro para R$ 5,23, no caso de automóveis de passeio, reduzindo a margem de lucro das consorciadas, que têm direito a 2% do resultado da Líder.

Esse modelo é questionado pelo Ministério Público Federal, que acusa a empresa de superdimensionar suas contas para ampliar o valor do prêmio e, por consequência, dos lucros. Em agosto, a Procuradoria pediu bloqueio de R$ 4,4 bilhões da Líder, valor que teria sido arrecadado a mais de forma fraudulenta.

A Líder e a Susep (Superintendência de Seguros Privados) defendem que não haverá impactos na operação do seguro, mas a debandada reduz a capilaridade no atendimento aos segurados: até o momento, o número de empresas que faziam a recepção de processos do DPVAT caiu de 36 para 17.

Com as baixas, o número de integrantes do consórcio cairá de 56 para 21. Na Seguradora Líder, o quadro de acionistas cairá para 17 empresas — nem todas as integrantes do consórcio participam da seguradora, algumas operam apenas como receptoras e reguladoras de processos de sinistros.

O governo vê o movimento como um reforço à proposta de pôr fim ao monopólio da Líder na oferta do seguro DPVAT. A extinção do seguro foi engavetada e hoje a ideia é propor um mercado competitivo, com a oferta do produto por várias empresas.

Em nota enviada à Folha, a Líder diz que o modelo atual segue resolução de 2006 do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), que determina que o seguro seja administrado por uma seguradora líder, responsável pela gestão da arrecadação dos prêmios e pagamento de indenizações.

Diz também que, nos últimos três anos, realizou investimentos em novas tecnologias e sistemas para aperfeiçoar e agilizar a operação do seguro, com redução no prazo de pagamento de indenizações, e que lançou aplicativo para pedidos de indenização.

Afirma ainda que conta com mais de sete mil pontos autorizados entre seguradoras consorciadas, agências dos Correios e corretores parceiros. Desse total, acrescenta, 96% dos pontos de atendimento estão concentrados nas agências dos Correios, garantindo a capilaridade do atendimento em todo o Brasil.

"Em outra frente, foi intensificado o combate às fraudes, com uso de tecnologia de ponta. Apenas em 2019, foram identificadas 6.435 fraudes e 213.386 pedidos foram negados tecnicamente e cancelados. No total, foram evitadas perdas na ordem de R$ 817 milhões antes que os sinistros fossem liquidados", afirmou a empresa.

O seguro DPVAT foi tema de uma série de reportagens da Folha em 2020, que mostraram denúncias de mau uso do dinheiro arrecadado —com a compra, por exemplo, de veículos e garrafas de vinho— e de conflito de interesses e favorecimento de sindicatos de corretores.

Em 2015, a Líder foi alvo da Operação Tempo de Despertar, que investigou fraudes na concessão dos seguros e deu início a uma série de questionamentos ao consórcio e fiscalizações por parte da Susep e do TCU (Tribunal de Contas da União).

O consórcio é questionado também pelo sindicato dos trabalhadores da Susep (Superintendência de Seguros Privados), que vê repasses irregulares de recursos do DPVAT a sindicatos de corretores e conflito de interesses na gestão do órgão regulador.

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