Cresce busca por financiamentos coletivos de pequenas empresas

Queda de juros favoreceu a busca por diversificação, mas especialistas alertam para riscos

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São Paulo

Além do mercado de ações, outro beneficiário da queda da taxa de juros foi o equity crowdfunding, ou financiamento coletivo de empresas privadas. Segundo plataformas de captação, com a Selic na mínima histórica de 2% ao ano, a demanda cresceu, levando ofertas a arrecadarem mais do que o previsto.

“Está tendo muita procura, empresas captaram 130% da meta das ofertas”, diz Gustavo Bertotti, economista da Messem Investimentos.

“A queda da Selic foi um presente para o setor. Estamos com muita demanda”, diz Leonardo Jianoti, cofundador da Platta, plataforma eletrônica de investimento coletivo e sócio-fundador da CWB Capital.

O equity crowdfunding é um financiamento coletivo voltado para pequenas e médias empresas. Ele acontece pela internet, via plataformas regulamentadas pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários).

Nesse modelo, o investidor empresta uma determinada quantia à empresa e vira seu sócio. Caso a empresa cresça, ele pode receber dividendos, que geralmente superam 10% ao ano, ou vender sua participação por um valor maior. Se a empresa quebrar, o investidor fica sem receber e pode ter outros custos sendo sócio.

A modalidade é diferente do crowdfunding imobiliário, no qual investe-se via compra de cotas (títulos de dívida).

Há um limite de captação de até R$ 5 milhões a cada 12 meses por empresa, valor muito inferior ao limite mínimo de R$ 100 milhões de captação de um IPO (oferta pública inicial, na sigla em inglês), por exemplo. Dessa forma, o equity crowdfunding se torna uma forma de captação para empresas de menor porte, sem capacidade de fazer um IPO.

Ofertas na Bolsa de Valores cuja captação fica próxima do limite mínimo são chamadas de mini-IPOs. Com a possibilidade de captar até R$ 5 milhões via financiamento coletivo, o economista Leonardo Jianoti, da Platta, chama as captações de equity crowdfunding de nano-IPO.

“Poucas vezes as captações alcançam R$ 5 milhões. O que mais restringe o mercado é o limite de aporte por investidor de R$ 10 mil por ano”, diz Jianoti. No caso do investidor qualificado (com mais de R$ 1 milhão investido), não há limite.

Na CVM, porém, está em discussão uma proposta para elevar o limite de captação para R$ 10 milhões, aumentando também o faturamento bruto máximo da companhia para R$ 30 milhões anualmente. Hoje, a companhia não pode ter faturado mais que R$ 10 milhões no ano anterior. Segundo Jianotti, isso deve acelerar o mercado, abrindo as portas para empresas maiores.

Em agosto, a CVM flexibilizou a modalidade durante 2020 devido a uma maior demanda de capital das empresas durante a pandemia.

Antes, a CVM exigia que dois terços da meta estipulada fossem levantados para aprovação da captação e, agora, é necessário apenas metade. Além disso, empresas com receita bruta anual de até R$ 5 milhões em balanço intermediário apurado entre 1º de janeiro e 30 de junho deste ano se tornaram elegíveis a captar via crowdfunding.

Na decisão, a CVM cita a “especial vulnerabilidade de micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) à retração da atividade econômica e a dificuldade enfrentada por elas para financiar suas operações por meio da obtenção de crédito junto ao sistema bancário” como justificativa para a liberação. A CVM diz ainda que os nano-IPOs podem ser “fonte alternativa ou complementar para financiamento de capital de giro e para manutenção das operações dessas empresas durante o contexto crítico”.

Em sua maioria, as empresas que captam via equity crowdfunding são startups com pouco tempo de vida e sem muito caixa.

Segundo dados mais recentes, de 2019, houve um salto de ofertas lançadas em relação a 2018, de 56 para 81. O percentual de ofertas encerradas dentro da meta, porém, caiu de 82% para 74%.

“É um mercado que vai crescer muito. O investimento coletivo fomenta empresas que podem virar grandes com produtos inovadores. Geralmente, são iniciativas de setores que ainda estão iniciando no Brasil, como energia solar fotovoltaica”, diz Bertotti.

Segundo o economista, há um risco elevado nestes aportes. “Geralmente, são projetos arriscados. A empresa tem que executar um planejamento que, no médio a longo prazo, pode não se bancar. Não é porque a empresa paga 10% a 12% ao ano que é um investimento seguro.”

Bertotti também alerta para o risco de golpes. No final de setembro, a CVM cancelou a autorização de funcionamento de uma plataforma de crowdfunding após suspender todas as suas ofertas em maio. Entre as irregularidades apontadas, estavam operação fraudulenta e falta de padrões de diligência.

“É preciso ter cuidado e procurar empresas e plataformas com aval da CVM, observando a organização societária. O investidor deve buscar o máximo de informação possível, olhando sempre a reputação da plataforma”, diz Bertotti.

Segundo José Raymundo de Faria Júnior, planejador financeiro pela Planejar, outro fator na análise é a oferta, que deve estar de acordo com as regras da CVM.

“O investidor tem o risco de perder tudo. Cerca de 75% das empresas quebram depois de 10 anos de abertura. É preciso investir em mais de uma para compensar as que não dão certo”, diz Faria Júnior.

Segundo ele, o investimento em nano-IPOs tem uma vida média de 3 a 5 anos e o mercado não tem liquidez para permitir a saída da empresa investida antes, sem prejuízo. Também não há marcações a mercado para o valor da empresa.

“É arriscado, mas o retorno pode ser maior. É um ramo muito novo que tem espaço pra crescer, impulsionado pela taxa de juros baixa”, afirma Faria Júnior. Por ter um alto risco, o equity crowdfunding é indicado apenas para o investidor agressivo, que aceita mais risco na carteira, e tem tempo para estudar as empresas e seus ramos.

Para analisar a empresa, Faria Júnior recomenda se atentar à experiência da equipe que a comanda e aos seus sócios-fundadores.

“É importante que eles tenham experiência financeira e comercial dentro do ramo, o que dá mais chance de sucesso ao negócio”.

“A análise é limitada porque startup não tem histórico de resultados, são poucos os dados a serem estudados. Avaliar o valor de uma pequena empresa em ascensão não tem nada a ver com a análise de grandes empresas.”

O planejador financeiro recomenda que o investidor analise também o setor da companhia —se estiver em expansão e com espaço para novos concorrentes, pode ser um bom negócio.

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