Descrição de chapéu Reforma administrativa

Desigualdade entre servidores varia por atividade, Poder e região do país

Sem carreiras jurídicas, diferença salarial entre setor público e privado cai de 13% para 4%

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São Paulo

Uma das principais justificativas para a realização de uma reforma administrativa é acabar com os privilégios de servidores públicos, argumenta o governo. Entidades que representam a categoria, porem, afirmam que altos salários e benefícios generosos não são a regra, e exceções, sim, devem ser combatidas.

Segundo essas entidades e especialistas na área de gestão pública, existe desigualdades entre os funcionários públicos e a reforma administrativa do governo federal pode contribuir para ampliá-la, já que não afeta justamente carreiras mais favorecidas, como juízes, desembargadores, procuradores e promotores.

“Não mexe com as estruturas mais caras, com a cúpula do Judiciário, não mexe com os políticos e nem com os militares. A média de salário dos professores de R$ 1.200 no município é menor que o auxílio-moradia de um juiz”, diz Sergio Antiqueira, presidente do Sindsep (Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo).

Dados sobre a remuneração no setor público mostram grandes desigualdades por Poder, sexo e região do país. Também se destacam as diferenças nos rendimentos dos servidores da saúde na comparação com as carreiras jurídicas e dentro da área de educação.

De acordo com levantamento do economista e pesquisador do Ipea Sandro Sacchet de Carvalho, divulgado pela Fonacate (Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado), entre as ocupações de nível superior, as maiores diferenças entre salários do setor público e privado se concentram em três ocupações: advogados e juristas, outros profissionais do Direito de nível superior e especialistas em organização da administração pública e de empresas.

Segundo o estudo, ao retirar as carreiras jurídicas da conta, a diferença salarial entre estatutários e empregados privados com carteira cai de 13% para 4%. A proporção de ocupados que recebem acima de R$ 8.000 torna-se praticamente a mesma.

Os dados também mostram defasagem nos salários de funcionários de saúde no setor público. Entre as ocupações de nível superior listadas, apenas médicos recebem menos no setor público (R$ 9.798) do que no privado (R$ 10.976).

Médicos estão praticamente no mesmo patamar salarial de professores universitários e profissionais de TI no setor público. Já no setor privado, os salários de médicos são 90% maiores na comparação com as outras duas categorias.

Médicos também ganham cerca de 50% menos no setor público do que advogados e juristas. No setor privado, essa situação se inverte: médicos têm remuneração 84% superior à dessas categorias.

Há também desigualdades dentro da área educacional. Professores do ensino fundamental e médio recebem R$ 2.950, o que corresponde a 30% do salário de um professor universitário no setor público, segundo o estudo.

No setor privado, a distância entre as remunerações é menor, com esse esse percentual subindo para 44%.

Segundo o estudo, nesse caso “as diferenças se refletem claramente na qualidade da universidade pública em comparação às privadas”.

Entre os profissionais de nível médio, os dados mostram uma vantagem salarial entre servidores dos serviços de proteção e segurança, de operações financeiras e administrativa e ocupações que congregam agentes da administração tributária, inspetores de polícia, detetives e policiais.

Por outro lado, há desvantagem entre os profissionais de nível médio da saúde e serviços pessoais.

“Nos municípios, os salários são em geral baixos. É o analista do Banco Central que ganha muito ou o professor do Rio Grande do Sul que ganha pouco?”, questiona Rudinei Marques, presidente da Fonacate.

A diferença salarial entre homens e mulheres também é mais acentuada no setor público. Homens recebem 71% a mais nas carreiras de nível superior e 41% mais nas de nível médio que as mulheres. Entre trabalhadores com carteira no setor privado, as diferenças são de 50% e 25%, respectivamente.

“O governo não tem intenção de mexer nos privilégios de uma elite do setor público formada por homens brancos. Isso vem associado a um discurso de desqualificação dos servidores, [categoria] na maioria composta por mulheres, muitas vinculadas a políticas sociais que vêm sofrendo cortes. São mulheres que recebem salário muito distante dessa elite do setor público”, afirma Denise Carreira, professora de política educacional e coordenadora da Ação Educativa e da Coalizão Direitos Valem Mais, que divulgou uma nota técnica defendendo a instituição de um piso emergencial de gastos para serviços essenciais.

As discrepâncias podem ser grandes dentro de um mesmo município. João Batista Gomes, servidor que faz parte do Sindsep e também da diretoria nacional da CUT, afirma que o menor piso entre as carreiras na prefeitura de São Paulo é de R$ 755, valor abaixo do mínimo, mas que sobe para R$ 1.132 com gratificações.

Na outra ponta, há carreiras que ganham mais que os cerca de R$ 24 mil pagos ao prefeito da capital paulista. Em alguns casos, a renda está acima do teto federal (cerca de R$ 39 mil), como auditores fiscais e procuradores municipais. “Tem gente que ganha acima de R$ 40 mil, o que é inconstitucional”, diz.

De acordo com o Atlas do Estado brasileiro, documento divulgado no ano passado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), o salário médio de um servidor no Poder Judiciário federal corresponde a seis vezes o ganho médio do funcionário de uma prefeitura, que por sua vez recebe um terço do que é pago no Executivo federal.

Segundo o documento do Ipea, a concentração de remunerações mais altas em cargos federais pode ser explicada pelo fato de esses servidores desempenharem normalmente funções mais complexas, de gestão e controle.

No nível municipal, a grande maioria atua em funções executoras, operacionais ou de menor complexidade gerencial. O nível estadual apresenta as remunerações com valores intermediários, “o que talvez reflita a natureza híbrida das atividades”, diz o Ipea.

Ao tratar da diferença entre os setores público e privado, o documento ressalta que ela é menor (cerca de 20%) quando se compara com o Executivo municipal, que está na base dos salários do funcionalismo e abrange prefeituras dos mais diferentes portes.

Outra forma de enxergar a questão é olhar para a evolução dos salários. No Judiciário, eles subiram em média quase 90% de 1986 a 2017, já descontada a inflação, tanto no nível federal como estadual.

No Executivo, os salários cresceram 76% no plano federal, 28% no estadual e 41% no municipal. No Legislativo, houve queda nos salários federais e municipais e alta de 24% nos ganhos nas Assembleias Legislativas.

As desigualdades no funcionalismo também podem ser vistas em termos regionais. No nível estadual, o Centro-Oeste (puxado por Brasília) e o Sul possuem os melhores salários. No municipal, destacam-se o Sul e Sudeste.

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