Juízes folgam em ponto facultativo do Dia do Servidor

Fóruns trabalhista e criminal de SP funcionam em esquema de plantão nesta sexta (30)

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São Paulo

Os portões fechados a cadeado, estacionamentos vazios e nenhum movimento de carros ou pessoas no Complexo Judiciário da Barra Funda, onde são vizinhos os maiores fóruns criminal e trabalhista da América Latina, não deixam dúvidas: é feriado no Judiciário nesta sexta-feira (30).

Os magistrados folgam no Dia do Servidor, apesar de parte da categoria argumentar que não são servidores, uma das justificativas para não terem sido incluídos na reforma administrativa apresentada pelo governo ao Congresso em setembro. ​

O ponto facultativo do Dia do Servidor Público de 2020 foi transferido da quarta-feira (28) para a sexta, por decisão de uma portaria da Secretaria Geral do Conselho Nacional de Justiça (nº 35/20).

Com a mudança de data, centenas de juízes puderam dar início nesta sexta-feira chuvosa a um feriado prolongado de quatro dias, que só termina na segunda-feira (2), dia de Finados.

Segundo o segurança Carlos da Silva, que trabalha há dois anos no Fórum Criminal da Barra Funda, o órgão atende atualmente em horário reduzido, das 13h às 17h, devido à pandemia, comparado ao horário normal de funcionamento das 9h às 19h.

Mas, nesta sexta-feira, o complexo não abre o dia todo. “Hoje só trabalham os faxineiros e nós da segurança”, diz Silva. “O fórum sempre fecha no feriado do servidor, os juízes nunca trabalham nesse dia.”

A poucas quadras dali, no Fórum Trabalhista Ruy Barbosa, uma segurança que preferiu não falar seu nome também confirma que o órgão estará fechado ao público o dia todo nesta sexta, mas diz que o movimento anda muito abaixo do normal mesmo em dias úteis, já que as audiências no fórum têm acontecido apenas com hora marcada.

O taxista Lucio, que preferiu não falar seu sobrenome, trabalha há 18 anos no ponto vizinho ao tribunal trabalhista e também relata o baixo movimento.

Segundo ele, levar juízes não é muito comum, já que a maioria tem carro. Mas antes da pandemia, pelo menos uma vez por semana algum magistrado utilizava seus serviços. Agora isso ficou ainda mais raro. E nessa sexta-feira? “Sem chance”, diz Lucio.

Segundo a assessoria de imprensa do TJSP (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo), o Complexo Criminal da Barra Funda conta com 72 magistrados e nas suas varas estão pendentes 78,3 mil casos, conforme dados de setembro.

Na Justiça Estadual de São Paulo como um todo, são 2.509 juízes, com 14,9 milhões de processos no estoque a espera de decisão, em 1.527 varas na capital e interior. Ainda segundo o TJSP, a média diária de decisões tomadas na primeira e segunda instâncias ultrapassa 4 mil.

No Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, que inclui o Fórum Ruy Barbosa, são 600 magistrados, com 204,4 mil processos em tramitação, conforme a assessoria do órgão.

Tanto no TRT como no TJSP o Judiciário trabalha nessa sexta-feira em regime de plantão.

A discussão sobre se magistrados são ou não servidores públicos ganhou fôlego com a decisão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de deixar de fora da reforma administrativa categorias como juízes, membros do Ministério Público, militares e parlamentares.

Quando apresentou a proposta, o Ministério da Economia disse que o Poder Executivo não tem autonomia para propor mudanças de regras para membros de outros Poderes, embora a proposta também tenha impacto sobre servidores da área administrativa do Judiciário.

O governo diz que juízes, desembargadores, procuradores, promotores e congressistas obedecem a normativos próprios, que não podem ser alterados pelo Executivo.

Em entrevista recente à Folha, a presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), Noemia Porto, defendeu que são servidores públicos os funcionários do Judiciário regidos pelo artigo 37 da Constituição, que trata da organização da administração pública.

“Servidores públicos estão vinculados à disciplina constitucional da administração pública. Já magistrados e membros do Ministério Público são tratados em uma outra topografia constitucional, da organização dos Poderes”, afirmou a presidente da Anamatra.

“Nesse sentido, não tem a menor relação entre órgãos do Poder Judiciário —e os juízes são órgãos do Poder Judiciário— com os servidores públicos, que são tratados em outra parte da Constituição, relacionada à organização da administração pública.”

A presidente da Anamatra afirmou ainda que os servidores têm uma lei diferente da legislação da magistratura. “O que rege a magistratura é uma lei orgânica, com status de lei complementar. O que rege o Ministério Público é uma lei complementar. O que rege os servidores é uma lei ordinária no âmbito da União, a lei 8.112/90, que não é aplicada aos magistrados”, disse.

A Amatra-2 (Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2a Região) respondeu a questionamento da Folha sobre por que os juízes folgam no Dia do Servidor, se não são servidores.

“Nestas ocasiões, o tribunal funciona em esquema de plantão. Demandas urgentes são atendidas. Não tem nada desamparado”, segundo Frederico Monacci Cerutti, presidente da Amatra-2, que engloba São Paulo Capital, região metropolitana e Baixada Santista.

“Não há justiça sem os servidores. A comemoração mais do que justa é o reconhecimento histórico da importância das pessoas que fazem a máquina da justiça funcionar”, completou o magistrado.

Procurada, a Anamatra não se manifestou.

O presidente da Anamages (Associação Nacional dos Magistrados Estaduais), juiz Magid Nauef Láuar, do TJMG (Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais), afirmou que “lato sensu [em sentido amplo], todo aquele que exerce atividade pública, é servidor público. Stricto sensu [em sentido específico], alguns dos servidores públicos, que exercem atividades típicas de Estado, como os membros dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, são denominados agentes políticos.”

Ainda conforme Láuar, os agentes políticos são submetidos a regimes jurídicos próprios e, especialmente os magistrados, têm garantias e prerrogativas que garantem o exercício da função com independência, mas, de outro lado, também possuem restrições não impostas aos servidores públicos que não integram carreiras típicas de Estado.

Entre essas restrições, ele cita a vedação ao exercício de atividade político partidária, a proibição de outra atividade remunerada, à exceção do ensino em curso de nível superior, entre outras.

“Certo é que o Executivo e o Legislativo, em reconhecimento ao valor e dedicação dos servidores públicos, postergaram o ponto facultativo neste ano. No âmbito do Poder Judiciário, a despeito de ser ponto facultativo, não houve interrupção da prestação jurisdicional, assegurada através de regime de plantão”, completou o juiz.

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