Descrição de chapéu The New York Times indústria

Trump falha com promessas à indústria enquanto economia enfraquece

Esforços para revitalizar indústria manufatureira dos EUA foram minados por suas próprias políticas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Washington | The New York Times

Em uma cerimônia de fundação de uma fábrica da Foxconn em Wisconsin, em 2018, o presidente Donald Trump declarou que a fábrica seria a "oitava maravilha do mundo" —um polo de US$ 10 bilhões (R$ 56 bilhões) que contrataria 13 mil trabalhadores para fazer televisores de tela plana no interior dos Estados Unidos.

Neste mês, o estado de Wisconsin negou à Foxconn subsídios fiscais porque ela descumpriu seus planos de investimento. A companhia contratou menos de um quarto dos 2.080 trabalhadores que deveria empregar no ano passado e investiu apenas US$ 300 milhões (R$ 1,6 bilhão), em vez dos esperados US$ 3,3 bilhões (R$ 18,6 bilhões), segundo um relatório da Divisão de Orçamento e Finanças do Executivo de Wisconsin.

A fábrica da Foxconn, disse o relatório, parece ser usada basicamente para armazenamento, e é "fora dos padrões para ser considerada uma instalação fabril". Centros de inovação que a empresa de Taiwan deveria abrir em todo o estado continuam vazios.

Donald Trump com o presidente da Foxconn, Terry Gou, durante o evento inovador em Wisconsin - Tom Brenner - 28.jun.2018/The New York Times

O fracasso da Foxconn em criar o tipo de locomotiva industrial que Trump descreveu demonstra que a promessa do presidente de um renascimento industrial dos Estados Unidos nem sempre resultou nos empregos ou no investimento econômico esperados.

Trump ameaçou empresas como General Motors, Harley-Davidson e Carrier com impostos pesados e boicotes se elas levassem suas fábricas para o exterior, muitas vezes obtendo promessas de empregos dessas firmas. Mas em muitos casos as promessas foram descumpridas quando Trump mudou sua atenção para outra coisa e as realidades do mercado não puderam ser ignoradas.

No primeiro debate presidencial em setembro, Trump afirmou que recuperou 700 mil empregos fabris depois que o governo Obama negligenciou o setor. Os empregos aumentaram realmente nos primeiros três anos de seu mandato, mas não no grau que ele sugeriu: o emprego na manufatura subiu quase 500 mil vagas, apenas. Até agosto, o emprego no setor tinha caído mais de 200 mil em comparação a quando Trump assumiu o cargo, com uma onda de fechamentos de fábricas e a recessão da pandemia.

"O presidente gosta de fazer um show de que está envolvido e está fazendo algo", disse Matthew Jewell, professor de ciência e engenharia na Universidade de Wisconsin-Eau Claire, que esperava que seus alunos encontrassem empregos em um dos centros de inovação da Foxconn próximos, que continuam vazios. "Foi frustrante para nós."

O local de construção da Foxconn em 2018; de acordo com um relatório recente, a planta parece ser usada principalmente para armazenamento - Lauren Justice - 14.set.2018/The New York Times

Essas promessas não realizadas podem ter pouca importância para os apoiadores de Trump, que veem a retórica e a pressão do presidente como evidência de que ele está lutando duro pelos trabalhadores americanos. A maioria das pesquisas continua mostrando Trump em vantagem sobre Joe Biden, o candidato democrata, no que se refere à gestão da economia.

De certa maneira, os esforços de Trump para revitalizar a indústria manufatureira dos EUA foram minados por suas próprias políticas. Seus cortes de impostos em 2017 estimularam os investimentos e fizeram muitas empresas prometerem novos empregos. Mas suas lutas comerciais com a China, a Europa, o Canadá e o México foram um obstáculo para a economia, quando os EUA impuseram tarifas a seus maiores parceiros comerciais, provocando impostos retaliatórios sobre os produtos americanos.

As tarifas de Trump sobre o aço e o alumínio importados e sobre produtos chineses no valor de US$ 360 bilhões (R$ 2 trilhões) pesaram particularmente sobre o setor manufatureiro, que entrou em recessão no ano passado. Depois disso, a pandemia do coronavírus perturbou totalmente a economia, apagando o "boom de trabalhadores" que as autoridades do governo Trump vinham promovendo.

No mês passado, Trump convidou Steve Burns, o executivo-chefe da Lordstown Motors, para ir à Casa Branca anunciar a nova caminhonete elétrica da companhia. A visita pretendia comemorar o papel de Trump como salvador de empregos. Em 2019, ele forçou com sucesso a General Motors a vender uma fábrica em Lordstown, no Estado de Ohio, que ela planejava fechar, para a Lordstown Motors, fabricante de carros novata. O plano pretendia evitar cerca de 1.600 demissões.

A Autoridade de Créditos Fiscais de Ohio disse estar pedindo que a GM pague US$ 28 milhões (R$ 158 milhões) em créditos fiscais e invista US$ 12 milhões (R$ 67,7 milhões) no Vale do Mahoning por sua decisão de fechar a montadora em Lordstown. Ela tinha recebido os créditos fiscais em 2008, sob a condição de que empregaria 3.700 trabalhadores na cidade durante 20 anos.

Depois da venda, alguns funcionários da General Motors se empregaram em outras fábricas, mas a Lordstown Motors atualmente emprega apenas cerca de 50 engenheiros. Burns disse que pretende contratar mais 600 trabalhadores no próximo ano e aumentar o número significativamente em 2021.

O senador democrata Sherrod Brown, de Ohio, disse que a nova empresa é um desenvolvimento bem-vindo, mas criticou Trump por não fazer mais para proteger os trabalhadores na fábrica original da GM, que produzia o Chevrolet Cruze. Muitos funcionários daquela fábrica foram obrigados a procurar emprego em outros estados, e ainda não está claro que tipo de salário eles terão na fábrica da GM quando estiver funcionando. Ele disse que a atenção de Trump já mudou, deixando os trabalhadores a esperar que os empregos se materializem.

"Ele chega com sua empáfia e faz promessas, mas depois os trabalhadores têm de se virar sozinhos", disse Brown em entrevista.

Donald Trump durante visita a fábrica da Carrier em Indianápolis - Doug Mills - 1º.dez.2016/The New York Times

Os poderes de persuasão de Trump às vezes têm apenas um efeito parcial. Em 2016, antes de tomar posse, Trump pressionou a United Technologies, empresa holding da gigante de calefação e refrigeração Carrier, para manter aberta uma fábrica em Indianapolis e não mudar os empregos para o México. Com uma combinação de ameaças e incentivos, a companhia concordou em manter a fábrica aberta, salvando mais de 700 empregos. No entanto, em 2017 e 2018 a Carrier cortou cerca de 500 empregos daquela fábrica, mudando as funções para o México.

Em outros casos, as empresas ignoraram os pedidos de Trump. O presidente criticou a Harley-Davidson dois anos atrás quando ela anunciou que mudaria parte de sua manufatura para o exterior, para evitar tarifas que a Europa impunha a produtos americanos em retaliação pelas tarifas criadas por Trump sobre o aço e o alumínio. O presidente pediu um boicote da empresa, ameaçou-a com novos impostos e a acusou de "render-se". Lutando financeiramente, a companhia de motocicletas seguiu em frente com planos de construir uma fábrica na Tailândia e fechar uma em Kansas City, no Missouri.

Mas no ano passado Trump pareceu abandonar o mau humor. Depois que a Harley-Davidson relatou queda nos lucros por causa das tarifas europeias, Trump disse no Twitter: "Muito injusto com os EUA. Vamos retribuir". Nenhuma medida foi tomada.

Durante a corrida presidencial de 2020, Trump não viu as consequências imprevistas de muitas de suas políticas econômicas, em vez disso gabando-se de que criou a economia mais forte da história. Na campanha do presidente, até alguns anúncios desprezam os desafios que ele criou para setores que tentou salvar, como o do aço.

Trump impôs altas tarifas sobre as importações globais de aço no início de seu mandato, aumentando temporariamente os preços e ajudando os fabricantes americanos. Mas, conforme a demanda global por aço desacelerou em consequência do aumento dos preços, a indústria ficou numa ressaca.

Um anúncio em setembro, relatado antes pela Vice News, mostrou uma imagem de Trump usando um capacete durante uma visita em 2018 a uma usina da U.S. Steel em Illinois. A mesma usina anunciou planos de demitir cerca de 700 trabalhadores neste ano, e a companhia sediada em Pittsburgh disse em maio que reduziria sua força de trabalho em 2.700 cargos, com o aumento dos prejuízos.

FILE -- President Donald Trump tours Granite City Works Hot Strip Mill, in Granite City, Ill., July 26, 2018. Foxconn?s failure to create the kind of factory powerhouse that Trump described demonstrates how the president?s promise of an American manufacturing renaissance has not always resulted in the pledged jobs or economic investment. (Tom Brenner/The New York Times)
Donald Trump durante visita a uma fábrica em Illinois, Estados Unidos - Tom Brenner - 26.jul.2018/The New York Times

O presidente teve algum sucesso ao intervir para proteger empregos quando o governo está diretamente envolvido. Em agosto, Trump demitiu membros da diretoria da Autoridade do Vale do Tennessee, uma corporação de propriedade federal que fornece eletricidade em todo o sudeste do país, depois que anunciou planos de terceirizar mais de cem empregos tecnológicos para contratadas em outros países. O presidente atacou o chefe-executivo da autoridade por ter um salário excessivo e advertiu contra mais demissões antes que a empresa revertesse seu curso.

Peter Navarro, diretor do Escritório de Políticas de Comércio e Manufaturas da Casa Branca, afirmou que as ameaças de tarifas feitas por Trump tiveram sucesso ao obrigar as companhias a manter empregos no país. Ele também afirmou que as políticas democratas de endurecer a regulamentação sobre a indústria energética e potenciais cortes de gastos militares prejudicariam os trabalhadores que essas indústrias sustentam.

"Em um mundo de Biden, esses empregos estariam perdidos", disse Navarro em entrevista.

Quanto à Foxconn, Navarro disse que a companhia está ajudando os EUA a competir em um setor que foi dominado pela China, e rejeitou o fracasso da companhia em cumprir suas metas de investimento em 2019, em vez disso culpando o coronavírus pelo atraso. "O vírus do PCC atrasou tudo", disse ele, referindo-se ao Partido Comunista Chinês.

A Foxconn disse na semana passada que continua comprometida com Wisconsin, mas não deu detalhes sobre como irá avançar.

Em uma entrevista a um canal de televisão de Milwaukee na semana passada, Trump insistiu que —se for reeleito— a Foxconn cumprirá suas promessas.

"Eles farão o que eu lhes disser", disse Trump. "Eles farão o que deve ser feito."

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.