Chance de nova onda de Covid é baixíssima, diz secretário de Guedes

Sachsida afirma que país alcançaria imunidade com 20% de contaminados, tese questionada por OMS

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Brasília

O secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, afirmou nesta terça-feira (17) que considera baixíssima a probabilidade de uma nova onda de coronavírus no país.

Segundo ele, estudos feitos por sua equipe indicam que a chamada imunidade de rebanho já estaria sendo alcançada no país e, com isso, haveria pouca chance de uma nova escalada da pandemia.

"Vários estados já atingiram ou estão próximos de atingir imunidade de rebanho", disse. "Acho baixíssima a probabilidade de segunda onda. Não apenas isso. Acho que os dados que temos mostram algo concreto, que é a força da retomada econômica", afirmou Sachsida.

Secretário de Política Econômica, Adolfo Sachsida
Secretário de Política Econômica, Adolfo Sachsida - Jefferson Rudy/Agência Senado

Questionado, o secretário afirmou que os estudos consideraram como imunidade de rebanho quando 20% da população ficaria contaminada pelo Sars-CoV-2. Mas esse percentual está longe de ser considerado um consenso na comunidade científica.

O projeto Comprova, coalizão que reúne 28 veículos na checagem de conteúdos, verificou há menos de um mês não haver dados que indiquem que o país já teria alcançado os percentuais necessários para uma proteção coletiva capaz de frear o vírus Sars-CoV-2.

De acordo com a reportagem, a imunidade de rebanho é um conceito com origem na proteção proporcionada pelas vacinas, e não naturalmente pelas doenças. A partir de um percentual de pessoas imunizadas, outras ainda suscetíveis à doença e que não se vacinaram também ficariam protegidas porque o agente deixaria de circular.

Cientistas ressaltaram ao Comprova que o novo coronavírus ainda demanda estudos antes de ser afirmar a existência de uma eventual imunidade de rebanho. “Não dá pra dizer isso. Nem para o Brasil, nem para outros países. Essa pandemia é muito misteriosa, e sabemos muito pouco sobre esse vírus”, afirmou o epidemiologista Fernando Barros ao responder sobre o tema no mês passado.

Os técnicos do Ministério da Economia enviaram à Folha o estudo que comentaram durante a coletiva. Na verdade, trata-se de um artigo publicado por três integrantes da SPE (Secretaria de Política Econômica) pela UFPel (Universidade Federal de Pelotas).

O texto foi publicado pela universidade gaúcha para o processo ser mais rápido, já que é uma das poucas instituições cujo programa de pós-graduação aceita esse tipo de artigo (o chamado working paper, em geral não submetido a pares para alterações). Também foi submetido a uma revista científica, mas ainda está sob avaliação.

Entre os autores está Erik Figueiredo, subsecretário de Política Fiscal (professor e pesquisador da Universidade Federal da Paraíba que trabalha cedido ao Ministério). Os outros dois são Démerson André Polli, assessor da SPE; e Bernardo Borba de Andrade, coordenador-Geral de Política Fiscal.

O texto afirma que 2% da população brasileira está infectada com Covid-19, conforme apontam indicadores oficiais como a PNAD-Covid (pesquisa conduzida pelo IBGE). Mas diz que os casos estão subnotificados, por fatores como o número limitado de testes, resultados de falsos negativos ou a simples não testagem de assintomáticos.

Segundo o artigo, estima-se que a taxa de infecção nacional estaria, na verdade, em torno de 10,8%, podendo chegar a 16,6%. E que essa taxa varia conforme o estado, variando entre 5,8% (no Rio Grande do Sul) e 30% (em Roraima).

O estudo não chega a dizer que o país está próximo da imunidade de rebanho, por reconhecer que está em aberto qual seria o percentual da imunidade coletiva.

"Se admitirmos que a imunidade coletiva só é atingida em limiares altos (em geral acima de 50%) obtidos com a fórmula padrão, o Brasil ainda estaria longe de tal imunidade. Se o limiar estiver mais próximo dos valores propostos por [autor Ricardo] Aguas, digamos em 20%, então a conclusão seria de que boa parte do Brasil já estaria próxima da imunidade coletiva", afirma o texto.

Apesar disso, os autores defendem que o limiar de imunidade tem possibilidade de ser inferior e que há espaço para o debate.

Sachsida foi questionado se existe um plano a ser acionado no caso de uma nova onda de Covid-19, e afirmou que não haveria uma resposta neste momento porque a pergunta é "hipotética". "Uma vez que cenários de contingência ocorram, é responsabilidade institucional da SPE ter planos de contingência", afirmou.

Em outro momento, ressaltou que o Ministério da Economia não faz estudos na área de Saúde, dizendo que essa função é da pasta comandada pelo ministro Eduardo Pazuello.

Além da discussão sobre qual seria o percentual da imunidade de rebanho, a própria aplicação desse conceito como estratégia para lidar com a Covid-19 é contestada por autoridades de saúde.

Usar a imunidade de rebanho para conter a pandemia é “antiético” e “não é uma opção” para países que queiram derrotar o vírus, disse há cerca de um mês Tedros Adhanom Ghebreyesus​, diretor-geral da OMS (Organização Mundial de Saúde).

“Nunca na história da saúde pública a imunidade coletiva foi usada como estratégia para responder a um surto”, disse o chefe da OMS, chamando essa ideia de “cientificamente e eticamente problemática”.

A OMS diz que, para obter imunidade coletiva contra o sarampo, por exemplo, cerca de 95% da população deve ser vacinada. No entanto, de acordo com as estimativas, menos de 10% da população global tem alguma imunidade ao coronavírus, deixando a grande maioria do mundo suscetível.

“Deixar o vírus circular sem controle, portanto, significa permitir infecções desnecessárias, sofrimento e morte”, disse Tedros.

A possibilidade de uma nova onda de coronavírus no Brasil é levantada após países como Estados Unidos, França e Alemanha registrarem aumento nos casos de Covid-19, recentemente. Lideranças dessas economias adotaram novas restrições de circulação após um período de relaxamento das medidas para combater o vírus.

Na segunda-feira (16), o Brasil registrou média de mortes nos últimos sete dias de 490, voltando a se aproximar da casa dos 500. A variação foi de +34% em comparação com a média de 14 dias atrás, indicando tendência de alta das mortes.

Os números têm variado bastante nos últimos dias, pois as secretarias estaduais voltaram a atualizar dados que estavam em atraso devido a problemas nos sistemas do Ministério da Saúde.

Em São Paulo, o aumento de casos e de internações por Covid-19 nos hospitais públicos e privados de São Paulo observado nesta semana acendeu o alerta das autoridades de saúde para as confraternizações e festas de fim de ano.

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