Amazon é acusada de uso desleal de dados do varejo na Europa

Responsável por concorrência na UE afirma que gigante de tecnologia evita riscos e favorece seus próprios negócios; empresa nega irregularidade

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Bruxelas

A União Europeia anunciou nesta terça (10) uma acusação formal e uma nova investigação sobre abuso de poder de mercado contra a Amazon, gigante americana de comércio eletrônico.

Na acusação, etapa chamada de Declaração de Objeções no processo antitruste europeu, a UE acusou a Amazon de usar indevidamente em seu próprio proveito dados de vendedores terceirizados que usam sua plataforma e seus serviços de comércio eletrônico.

Se for condenada, a companhia pode ser multada em até 10% de seu faturamento global, ou cerca de US$ 19 bilhões (R$ 102 bilhões).

Moça de cabelos grisalhos bem curtos gesticula coma mão direita, com a palavra amazon ao fundo em letras brancas sobre fundo azul
A vice-presidente-executiva da Comissão Europeia, Margrethe Vestager, anuncia acusação e nova investigação sobre a Amazon em casos de concorrência desleal - Olivier Hoslet/pool/AFP

O caso foi aberto em julho de 2019, e foram analisadas 80 milhões de transações envolvendo 100 milhões de produtos, segundo a responsável por concorrência na UE, a vice-presidente-executiva Margrethe Vestager.

A conclusão foi que a Amazon agrega e processa dados de seus clientes —como o número de unidades de produtos encomendados e enviados, as receitas e o desempenho anterior dos vendedores, o número de cliques em suas ofertas, dados relacionados ao envio e reclamações de consumidores— para calibrar seus preços e tomar decisões estratégicas de varejo, como concentrar suas próprias ofertas nos produtos mais vendidos em cada categoria.

Com isso, segundo a UE, a Amazon evita os riscos que seus concorrentes precisam assumir e desequilibra a concorrência a seu favor. Segunda a companhia, 150 mil empresas europeias usam suas lojas virtuais para vender seus produtos.

A distorção, diz Vestager, é agravada pela presença dominante da companhia americana nas duas maiores economias europeias, Alemanha e França —onde 80% e 70% dos consumidores, respectivamente, dizem ter usado o site de compras no último ano.

A comissária disse que os processos são ainda mais importantes com o crescimento das vendas online na Europa, cujo valor quase dobrou em cinco anos, chegando a 720 bilhões de euros neste ano (R$ 4,57 trilhões). “Com a pandemia de Covid-19, as compras online viraram um hábito entre os europeus, o que torna ainda mais importante garantir a todos os vendedores um acesso justo e sem distorções aos consumidores”, disse Vestager.

Segundo a comissária, a Amazon ocupa uma posição privilegiada no comércio eletrônico porque tem dupla atuação: é ao mesmo tempo varejista e intermediária para a venda de seus concorrentes.

Esse papel duplo está na raiz também da segunda investigação anunciada nesta terça, que tem como alvo dois aspectos das vendas online pelo site da Amazon: o chamado “buy box”, o sistema que faz o botão “adicione ao carrinho” aparecer vinculado a um determinado produto, e o acesso a consumidores Prime.

São dois casos em que um acesso privilegiado pode distorcer a concorrência, pois pesquisas indicam que artigos que aparecem na página com o botão do carrinho são 80% das vendas no site, e consumidores Prime são os que tendem a comprar mais e gastar valores mais altos.

A suspeita da comissão é que, ao mostrar produtos vinculados a botão “adicionar ao carrinho”, a gigante de vendas online dê preferência a suas próprias ofertas ou à de clientes que também comprem seus serviços de logística e entrega —o que os pressionaria a contratar esses serviços.

A comissão também investiga se a companhia privilegia os clientes de seus serviços no acesso aos consumidores Prime. Na Alemanha, o órgão nacional antitruste também apura, desde 2018, se a companhia usa seu poder de mercado para forçar varejistas terceirizados a aceitar termos contratuais desfavoráveis.

Em comunicado, a empresa afirmou: “Discordamos das afirmações preliminares da Comissão Europeia e continuaremos a fazer todos os esforços para garantir que uma compreensão precisa dos fatos”.

A Amazon tem rejeitado o argumento europeu de que ela seja dominante no mercado, ao afirmar que representa menos de 1% do mercado global de varejo. Vestager, no entanto, disse que o mercado em questão nos processos da UE é o de serviços para comércio eletrônico, e não o varejo em geral.

Não há prazos legais para encerrar uma investigação antitruste. Com a Declaração de Objeções anunciada nesta terça, a UE enviou à Amazon documentos de sua investigação, e a empresa pode responder por escrito e solicitar uma defesa oral.

A Amazon é alvo de outras investigações na Europa e nos Estados Unidos —onde faz parte de um grupo de empresas fiscalizadas pelo Comitê Judiciário da Câmara e está sob investigação do Departamento de Justiça e da Federal Trade Commission.

Em seu segundo mandato como comissária encarregada de concorrência na UE, Vestager já abriu três processos contra o Google, por motivos distintos, que resultaram em multas de mais de € 8 bilhões (R$ 51 bilhões). A empresa está recorrendo.

Em outro caso bilionário, a Apple foi condenada a pagar € 13 bilhões em impostos atrasados ​​ao governo irlandês, mas a Justiça da UE acatou seu recurso em julho deste ano. A Comissão recorreu da decisão em setembro.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.