Como sempre, toda grande mudança começa por uma enorme pressão popular. Noventa e quatro por cento dos europeus colocam o meio ambiente como prioridade e mais de um terço mudaram seus hábitos de consumo. Essa forca, ancorada pela ciência, energizada pelo ativismo e vista como a nova competição global, levou a UE a aprovar o gigantesco Plano Europeu de Investimento do Acordo Verde ("The EU Green Deal"), com orçamento de € 1 trilhão até 2030.
O Acordo apressa a inclusão e aprovação de regras de governança corporativa. Mudanças rápidas são raras em Bruxelas, como sabem as doze mil entidades registradas para fazer lobby, na maioria empresas, ONGs e governos. A revisão da lei da privacidade - GDPR em inglês, demorou mais de uma década.
Veja por exemplo as diretrizes para os relatórios não financeiros, que passam pela sua terceira revisão em seis anos. Em fevereiro de 2021 a UE apresenta a sua nova proposta, que, se for ancorada pela consulta pública deste ano, trará mudanças profundas.
Nesta consulta, participantes de várias partes do mundo responderam que são a favor da obrigação de relatórios não financeiros para todas as empresas, com comparabilidade, confiabilidade e relevância, incluindo auditoria e a avaliação de materialidade. Votaram também por um único padrão com uma versão simplificada para as pequenas e médias empresas. São respostas claras para a consolidação de um único balanço, aproximando a governança ambiental e social da financeira.
A maioria dos respondentes deseja que os relatórios se estendam a todos com negócios na Europa, impactando as empresas multinacionais brasileiras e possivelmente os exportadores e investidores. Além desse ponto de contato, há o histórico no Brasil de convergência regulatória com a UE, foi assim no GDPR.
Outra mudança é a revisão dos direitos dos acionistas. Agora, eles precisam divulgar a sua política de voto anualmente, com foco nos impactos ambientais e sociais. Para não haver duplas interpretações do que é “verde”, há uma lei própria de definições ("EU Taxonomy Regulation") que foi proposta em março de 2018 e já está em vigor.
Boa parte da iniciativa privada participa deste momento de mudança. “Os conselhos das empresas precisam agora exercer uma supervisão mais proativa. Não fazer nada para promover a sustentabilidade não é uma opção, eles devem incluir o interesse dos stakeholders relevantes em sua estratégia de longo prazo”, diz Beatrice Richez-Baum, diretora-geral da ecoDa, a voz europeia de cinquenta mil membros de conselhos de administração de 21 países, incluindo alguns fora da UE, como a Suíça e o Reino Unido.
Por outro lado, há várias iniciativas das empresas. Um exemplo de proatividade vem do Capítulo Zero, uma iniciativa do Forum Econômico Mundial para aumentar a conscientização, participação, decisão, gestão, mitigação e a comunicação dos conselhos sobre riscos e oportunidades climáticas.
Henrique Luz, Presidente do Conselho do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) diz que a “entidade optou por representar o Capítulo Zero no Brasil para desafiar os conselhos de administração a incluírem mudanças climáticas na agenda das suas empresas”. Ele lembra que “as empresas têm sido chamadas a agir com protagonismo pois são responsáveis pelos impactos que causam no tecido social e no ecossistema em que se inserem”.
No total, esse conjunto de regras e iniciativas resulta, na prática, como a regulamentação do "Stakeholder Capitalism".
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