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Como a GM pretende superar a Tesla pela coroa do carro elétrico

Montadora tenta conciliar avanço tecnológico e negócios de carros e caminhões tradicionais, onde detém a maior participação no mercado americano

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Claire Bushey
Chicago | Financial Times

Quando a executiva-chefe Mary Barra anunciou a produção acelerada de 30 modelos de veículos da General Motors, em novembro, disse que a fabricante de carros está "decidida a lutar pela participação no mercado de veículos elétricos até sermos a número 1 nos Estados Unidos".

Ela não citou a Tesla pelo nome –e nem precisava.

Há uma década, a GM era a maior companhia dos Estados Unidos em veículos elétricos (VEs). Em 2012, quando a Tesla lançou o Model S, a GM vendeu mais de 23 mil Chevrolet Volts, quase o dobro de seu concorrente mais próximo, o Toyota Prius, e representando 18% do mercado total de veículos elétricos americano.

Mas desde que a Tesla começou a vender o Model 3, dois anos atrás, bateu o recorde de vendas de carros elétricos no país –uma pequena fração do mercado total de veículos– e transformou a GM, de 112 anos, em uma fraca concorrente. A Tesla dominou o mercado de elétricos em 2019 com 58% de participação, e algumas estimativas sugeriram que sua parcela aumentou até 80% no primeiro semestre de 2020.
Barra disse que a GM vai aumentar o valor que investe no desenvolvimento de veículos elétricos em 2025.

O Bolt, carro elétrico da General Motors, no Salão Internacional de Automóvel Norte-Americano em Detroit, Michigan - Bill Pugliano - 9.jan.2017/AFP

Nesse ritmo, dizem analistas, a montadora de Detroit provavelmente não conseguirá superar sua concorrente da Califórnia, que se somou à GM entre as empresas blue chips no S&P 500 no mês passado.
"Neste momento, em elétricos puros nos EUA, a Tesla está dominando", disse David Whiston, analista da Morningstar.

A GM também precisa administrar seus negócios de carros e caminhões tradicionais, onde detém a maior participação no mercado americano, para garantir apoio a seu avanço nos veículos elétricos.

"É como se você estivesse operando sobre si mesmo", disse Adam Jonas, analista do Morgan Stanley, que está confiante na Tesla. "É possível. É apenas um desafio a mais."

Especialistas da indústria concordam que em certo momento o mercado de veículos elétricos se tornará o mercado de veículos inteiro –a questão é quando.

A empresa de pesquisas de mercado IDTechEx avaliou que os VEs vão ocupar 20% do mercado mundial até 2030, e até 80% em 2040. Mas Luke Gear, analista sênior de tecnologia da firma, disse que as estimativas certamente serão revisadas para cima, com a posse do democrata Joe Biden na Casa Branca e as multas por poluição na Europa entrando em vigor neste ano.

A meta da GM de 1 milhão de veículos e uma enxurrada de novos modelos está "esquentando o jogo", disse Gear. A bateira Ultium da GM permite que novos modelos sejam desenvolvidos mais depressa, e a fábrica planejada de baterias da companhia em Lordstown, em Ohio –uma joint venture com a LG Chem–, deverá possibilitar a produção de baterias suficientes para suprir as metas de Barra.

Mais modelos de veículos significam mais opções para os consumidores, apressando a adoção mais ampla dos VEs. A Tesla teve alguns problemas de qualidade importantes, como uma capota que se desprendeu de um Model Y na Califórnia em outubro, no mesmo dia em que o dono apanhou o carro na revendedora. A jogada da GM significa que os clientes que quiserem comprar um veículo elétrico "não terão de escolher a startup de 15 anos que tem problemas de qualidade", disse Gear.

Por enquanto, a Tesla ainda é melhor em fazer baterias mais baratas que a concorrência, disse Gear. Isso significa veículos mais baratos, tornando-os uma opção para um grupo maior de potenciais clientes.
Em 2019, o VE mais vendido nos EUA foi o Model 3 da Tesla, com preços a partir de US$ 38 mil. A companhia vendeu quase 155 mil unidades. Em comparação, o segundo mais vendido foi o Model X da Tesla, veículo utilitário-esportivo com preço a partir de US$ 80 mil, que vendeu 19 mil unidades.

Emmanuel Rosner, analista do Deutsche Bank, avaliou em uma nota que a GM vai reduzir o custo das células de bateria para aproximadamente US$ 100 por kilowatt-hora em três anos, e depois para cerca de US$ 75 por kWh até 2025. Mas ainda ficaria atrás da meta da Tesla para meados da década, de US$ 50 por kWh.

"O preço vai determinar quem é a líder do mercado, e a Tesla parece decidida a ganhar no preço em um futuro previsível", afirmou Gear.

A vantagem da Tesla em veículos elétricos é ampliada pela enorme diferença entre o valor das duas companhias. Com US$ 600 bilhões (R$ 3,2 trilhões), a capitalização de mercado da Tesla é hoje dez vezes a da GM, dando-lhe uma vantagem para levantar capital, disse Jonas.

Além disso, como uma companhia somente de veículos elétricos, a Tesla está livre de conflitos que poderiam prejudicar a GM, disse Jonas. Todos os seus investimentos vão para veículos elétricos, e isso pode ser uma vantagem para atrair engenheiros talentosos.

A GM também poderá enfrentar custos futuros se o público e o governo começarem a ver a poluição emitida por motores de combustão interna como um problema em longo prazo, do tipo que provoca regulamentação, legislação e litígios. Isso faz alguns investidores pensarem que a fabricante de automóveis ainda poderá criar uma empresa spin-off de VEs, apesar de suas declarações em contrário.

"Estamos ouvindo investidores que começam a ver os carros [com motor de combustão interna] como cigarros e amianto", disse Jonas.

Segundo analistas, é improvável que a GM realize a ambição de superar a Tesla nesta década, ou algum dia. A empresa tem "um longo caminho a percorrer" se quiser ultrapassar a Tesla no mercado norte-americano de veículos elétricos, disse Whiston. Mas a Tesla dominou nos últimos anos em parte porque não tinha concorrência.

"Quando você entra em pontos de VE mais baratos, não pode contar com os fanáticos pela Tesla para colocá-lo em primeiro lugar no mercado", disse Whiston. Mesmo que a GM nunca controle uma parcela maior do mercado dos EUA do que sua adversária, se "eles continuarem lançando toneladas de ótimos produtos... e tirarem uma tonelada de participação da Tesla, seus esforços com veículos elétricos serão um fracasso? Eu diria que não".

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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