Câmara rejeita desvincular repasses de fundos e da Receita Federal

Em derrota para o governo, parlamentares derrubaram trecho da PEC Emergencial

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Brasília

Em uma derrota para o governo, a Câmara rejeitou nesta quarta-feira (10) a desvinculação de receitas de impostos a fundos, despesas e órgãos específicos. A decisão desidrata a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial.

Em sessão de plenário, os deputados analisam destaques de bancadas de partidos, que sugerem alterações na proposta. O texto-base foi aprovado em primeiro turno na madrugada desta quarta.

Em um dos pontos, o PDT (Partido Democrático Trabalhista) sugeriu a retirada do dispositivo que proíbe a vinculação de receitas tributárias a órgãos, fundos e despesas específicas, com algumas exceções. Parlamentares e auditores fiscais afirmam que essa medida colocaria em risco o repasse de recursos à Receita Federal.

Câmara rejeita desvincular repasses de fundos e da Receita Federal; greve dos auditores fiscais está no segundo dia
Câmara rejeita desvincular repasses de fundos e da Receita Federal; greve dos auditores fiscais está no segundo dia - Najara Araújo/Divulgação - Câmara dos Deputados

Embora o ministro Paulo Guedes (Economia) tenha afirmado internamente que não é favorável à desvinculação para a Receita Federal, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), orientou que os partidos da base aliada mantivessem a medida no texto.

“As pessoas receberam ligações dizendo que o Ministério da Economia estava favorável, mas não é verdade. A posição do governo é manter o texto”, disse em plenário.

Para manter o texto, o governo precisava alcançar 308 votos. O resultado, porém, ficou em 302 pela manutenção do texto. Outros 178 votaram pela supressão do dispositivo.

Ainda serão analisadas outras sugestões de mudança no texto, como a eliminação de gatilhos de ajuste fiscal.

Auditores fiscais relatam ter recebido, na sexta (5), um comunicado em que o secretário-especial da Receita Federal, José Tostes Neto, dizia ter ouvido do ministro Paulo Guedes a confirmação de que a vinculação seria mantida.

O aviso foi publicado em sistema interno da Receita Federal. Os auditores acreditavam, então, que a garantia de financiamento das atividades tributárias seria mantida na Constituição.

Na terça (9), porém, a base do governo agiu para manter o texto do relator e evitar novas desidratações. Representantes dos policiais vinham pressionando para que fossem poupados do congelamento de salários e promoções previsto na PEC Emergencial.

Para os auditores fiscais, Guedes não cumpriu o compromisso fechado na sexta. Eles iniciaram na terça uma paralisação de dois dias, a que batizaram de "apagão".

Nesta quarta, 220 ocupantes de cargos de chefia comunicaram ao secretário Tostes que colocariam os cargos à disposição, caso o texto do Senado não fosse alterado.

No manifesto encaminhado ao chefe da Receita Federal, os auditores dizem que a desvinculação é inapropriada quando o governo assume um discurso de ajuste fiscal. “Um dos meios para superar a crise”, afirmam, seria “buscar manter suas estruturas arrecadatórias funcionando com a
máxima eficiência possível.”

O Sindifisco (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal), que na terça convocou a categoria a entregar cargos, anunciou apoio ao manifesto. Segundo o sindicato, cerca de 90% dos auditores teriam aderido ao apagão, que termina nesta quarta.

A Receita Federal foi procurada, mas ainda não respondeu.


O QUE PREVÊ A PROPOSTA?

Auxílio emergencial

Permite nova rodada da assistência em 2021, com custo de até R$ 44 bilhões.
Novo auxílio fica fora do teto de gastos.

Texto não detalha público e valor do auxílio. Governo editará MP para efetivar o programa, que deve ter parcela padrão de R$ 250 por quatro meses (mulher chefe de família receberá valor mais alto, e pagamento será menor para pessoas que vivem sozinhas).

Medidas de ajuste fiscal

Decreto de calamidade pública nacional

Pode ser acionado em situação de crise aguda e generalizada no país, como por exemplo em uma pandemia. Neste ano, o governo não pretende decretar nova calamidade.

Cria dispositivos para enfrentamento dessas crises, como a flexibilização de limites de gastos e afrouxamento de regras para compra de insumos e contratação de pessoal.

Durante a vigência da calamidade, gatilhos de controle de despesa também são acionados. Objetivo é compensar o endividamento provocado pelo aumento de gastos.

Entre os gatilhos, estão a suspensão de reajustes de servidores, de criação de cargos e concursos públicos, além de vedação de aumento de auxílios e criação de despesas obrigatórias ou incentivos tributários.

Fica autorizado o uso do saldo financeiro dos fundos públicos para abater a dívida pública.

Emergência fiscal

Para a União, cria gatilhos a serem acionados temporariamente em caso de aperto nas contas públicas, quando a despesa obrigatória primária passar de 95% da despesa total. Para estados e municípios, o ajuste é facultativo, quando a despesa corrente ultrapassar 95% da receita corrente.

Objetivo é limitar o crescimento das despesas da União e assegurar que estados e municípios poupem.

Medidas de ajuste fiscal são as mesmas previstas para a calamidade.

Outras medidas

Prevê que uma lei complementar traga regras e medidas visando a sustentabilidade da dívida pública.

Determina um prazo de seis meses para que o governo apresente um plano para redução gradual dos benefícios tributários. Proposta terá que estabelecer corte de benefícios em 10% ao ano, levando o montante a até 2% do PIB em oito anos (hoje está acima de 4% do PIB).

Prorroga de 2024 para 2029 o prazo para que estados e municípios paguem precatórios.

Acaba com a obrigatoriedade de que União crie financiamentos para ajudar no pagamento desses precatórios.

O que saiu da PEC na Câmara

Proibição de promoções e progressões de carreira para servidores públicos em momentos de emergência fiscal ou calamidade pública. Esse benefício é mantido.

Desvinculação de receitas tributárias a fundos, despesas e órgãos específicos. Governo não poderá remanejar recursos que alimentam fundos como os de meio ambiente, cultura, aviação civil, saúde e social. Também será obrigado a manter os repasses à Receita Federal.

O que saiu da PEC no Senado

Extinção do gasto mínimo para saúde e educação

Gatilhos mais rígidos, como corte de jornada e salário de servidores públicos em até 25%, além de redução de pelo menos 20% dos cargos de confiança

Fim das transferências de recursos do FAT ao BNDES

Fim da obrigatoriedade de reajuste anual dos servidores

Limite à correção de valores das emendas parlamentares

Extinção de municípios pequenos que não tenham recurso para se sustentar

Criação do Conselho Fiscal da República

Definição do TCU (Tribunal de Contas da União) como instância superior aos tribunais de contas estaduais e municipais, padronizando entendimentos na área fiscal

Fim de vinculações de receita

Extinção dos fundos públicos

Necessidade de dotação orçamentária para o cumprimento de determinação judicial ou de lei que implique aumento de despesa​

Colaborou Fernanda Brigatti, de São Paulo

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