A indústria brasileira teme novo repique no frete marítimo internacional após o encalhe de um navio no Canal de Suez, uma das principais rotas do comércio global. A suspensão da navegação no canal também pressiona a cotação do petróleo, com possíveis impactos nos preços dos combustíveis.
O encalhe do porta-contêineres Ever Given, um dos maiores navios do planeta, suspendeu desde a madrugada desta quarta (24) o tráfego pelo canal, por onde passam cerca de 50 navios por dia. O acidente deixou uma fila de embarcações de carga paradas à espera da desobstrução do canal.
Ocorre em meio a um cenário de caos no transporte marítimo global, que foi desorganizado pela paralisação nos primeiros meses de pandemia e ainda não conseguiu ajustar os fluxos. O desequilíbrio teve grande impacto no custo para transportar cargas.
Em janeiro, o frete da China para o Brasil chegou a bater a casa dos US$ 9.000 (cerca de R$ 50.400, pela cotação atual), mais de quatro vezes a média dos últimos anos. Os valores recuaram nas últimas semanas, para a casa dos US$ 6.000 (R$ 33.600), mas podem voltar a subir, se a crise no canal perdurar.
O impacto ao Brasil é indireto, já que o comércio exterior nacional praticamente não usa o canal. Segundo o presidente da AEB (Associação Brasileira de Comércio Exterior), José Augusto de Castro, se daria sob a forma de novo aumento nos custos de transporte.
"Encalhando, esse navio encalha o comércio mundial como um todo", afirma, frisando, porém, que a evolução do cenário depende do tempo necessário para a liberação do fluxo no canal, que só ocorrerá após o desencalhe da embarcação.
"Ainda não dá para avaliar, porque tudo vai depender do tempo para desencalhar o navio, mas é preocupação a mais nesse momento, porque os custos do transporte marítimo já estão muito elevados", ponderou.
Para Castro, a eventual necessidade de desvios de navios que já estão em curso é outro fator que pressiona os fretes. A alternativa é dar a volta na África, ampliando em até 7.000 quilômetros o trajeto entre a Ásia e a Europa.
Com os navios gastando mais tempo para chegar a seus destinos, a tendência é que o desarranjo no transporte marítimo aumente, já que o problema atual foi iniciado justamente pela ruptura do fluxo de cargas durante o primeiro semestre de 2020.
Com a paralisação no início da pandemia, rotas marítimas foram interrompidas e navios e contêineres ficaram espalhados pelo mundo. Após a reabertura, o esforço de rearrumação foi atropelado pelo crescimento da demanda por mercadorias, remédios e equipamentos hospitalares.
Também frisando que é cedo para avaliações, o presidente da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil), Fernando Pimentel, concorda com o risco de elevação do frete e acrescenta á alta do petróleo entre os motivos de preocupação do setor.
"Se afetar o petróleo, afeta o preço das matérias-primas têxteis sintéticas", explicou. Nesta quarta (24), a cotação do petróleo Brent, referência internacional negociada em Londres, chegou a subir mais de 6%. No fim do pregão, fechou em alta de 5,95%, a US$ 64,41 (R$ 360).
O Canal de Suez é a rota de transporte de petróleo do Oriente Médio para a Europa e, por isso, a perspectiva de redução da oferta afetou o Brent, que vinha em tendência de queda diante das dificuldades no processo de vacinação contra a Covid-19 na Europa.
Com a queda recente —e a valorização do real frente ao dólar,— a Petrobras anunciou nesta quarta cortes de cerca de 4% nos preços da gasolina e do diesel em suas refinarias. Foi a segunda redução da gasolina e a primeira do diesel após meses de alta.
O consultor Adriano Pires, diretor do CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura), avalia que o repique do petróleo nesta quarta é pontual e pode não ter impactos no país. Mas vê possibilidades de nova retomada ao longo do ano caso o processo de vacinação avance no mundo.
"Com o aumento da vacinação o crescimento da economia volta. Acho que esse ano teremos um preço de petróleo médio em torno de US$ 60 (R$ 336) por barril.
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