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Detalhes triviais dão ritmo a livro sobre trajetória de Ometto e seu conglomerado

Fã de novelas, empresário chama Aguinaldo Silva para contar sua história desde a infância em usina de cana até a formação do grupo

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São Paulo

O empresário Rubens Ometto, presidente do conselho de administração da Cosan, que sempre se declarou um noveleiro, não se importou de ter de assistir a reprises durante a pandemia. Achou até bom porque o fez lembrar de capítulos de que tinha se esquecido.​

Foi justamente por causa da memória que Ometto chamou o dramaturgo Aguinaldo Silva, mas não para falar de novela. Foi para escreverem juntos a biografia do empresário emaranhada à trajetória dos negócios desde o nascimento e a infância em uma usina de cana da família em Piracicaba até a forma atual do grupo, que é hoje um dos maiores do Brasil, com atuações em energia, combustíveis, lubrificantes e logística, como Raízen, Moove e Rumo.

O resultado é o recém-lançado “O Inconformista”, que começa fazendo uma analogia com o filme “Cidadão Kane”.

Rubens Ometto Silveira Mello, presidente do conselho de administração da Cosan e da Rumo - Alan Santos - 8.abr.2021/Presidência da República

Ele conta que, certa vez, durante uma entrevista, o repórter quis saber qual era o seu “Rosebud”, o enigma pessoal do grande empresário. Ometto, então, volta à usina onde nasceu para se lembrar da bronquite asmática de que sofria aos cinco anos de idade e que deve lhe render fobias até hoje. Sem conseguir respirar, saía do quarto à noite em uma ansiedade que evoluiu ao longo dos anos para a energia que o move nos negócios e na vida.

Crescido, mudou-se para a casa dos primos, em São Paulo, para fazer cursinho e sofreu bullying porque era caipira. Isso foi às vésperas da fase mais terrível da ditadura militar, um ano antes do AI-5, mas o jovem não estava preocupado com a política, só pensava nos estudos e no futuro.

Mônica, a mulher de Ometto, aparece logo no início da história, quando ele conta como a conheceu em Guarujá, litoral paulista, onde passava as férias na adolescência. Casado há 50 anos, cita o nome dela ao menos 50 vezes mais ao longo das 184 páginas.

Ele investe longos trechos no tributo à família antes de começar a desenhar o perfil do Ometto empresário.

Mas é no excesso de detalhes triviais que o livro ganha ritmo, como as ligações que fez para a mãe e o médico antes de correr para a maternidade no nascimento da primeira filha, ou a cor dos olhos de um neto e o time para o qual torce o outro.

Na narração da lua de mel com Mônica, nos Estados Unidos, ele descreve como ficou inconformado ao perceber que a conta do hotel estava errada, mas foi incapaz de contestar porque não falava uma palavra em inglês. De volta ao Brasil, matriculou-se no curso imediatamente. Diz que precisava saber falar para não ser mais passado para trás.

A maturidade vem com a morte do pai e a forte afinidade que desenvolveu com José Ermírio de Moraes Filho, presidente da Votorantim (que na época era o maior grupo empresarial do país) e amigo do sogro.

Aos 24 anos, foi eleito diretor financeiro da Votorantim e ainda encontrou tempo para uma excêntrica experiência como cineasta.

Entre as discussões inflamadas de que gosta de lembrar, aparece uma passagem com Delfim Netto, então ministro do governo João Figueiredo, por causa de um crédito rural para o plantio de cana. Por fim, Delfim saiu dizendo que Ometto era um “capitalista selvagem”, de acordo com o empresário.

Tudo o que conta no livro, segundo Ometto, foi revelado com a preocupação de garantir o registro histórico, sem intenção de se autopromover. E ele não queria um relato que interessasse apenas aos aficionados pelos negócios, por isso as minúcias da vida pessoal alimentam a curiosidade do leitor.

Hoje, diante da tragédia das mortes pela pandemia no Brasil, Ometto disse à Folha que está inconformado.

“Eu confronto muito, se vê pelo próprio título do livro. Sou uma pessoa que não aceita as coisas como elas são. Procuro fazer isso nos bastidores. Por isso, tomo cuidado para que a minha opinião não venha muito a público, para não criar o confronto, porque, na hora em que se cria o confronto publicamente, se coloca um no ataque e o outro na defesa.”

O empresário diz que enxerga os problemas da gestão da crise sanitária. “Sem querer politizar, teve muitos erros de planejamento, de organização, essa mistura do científico com o que não é. Sou um inconformista. Não aceito. Acho que tem muita coisa errada. O Brasil apanhou muito. E mesmo nas relações internacionais, para convencer os outros países a nos apoiar”, diz.

Por outro lado, ele também aponta o dedo para a postura coletiva.

“Existe uma irresponsabilidade na nossa população muito grande, nesses eventos com muita gente sem máscara, em festas. E há muita coisa de que o povo não tem culpa, como esse problema da mobilidade, do pessoal que tem de trabalhar, pegar ônibus. Mas eu acho que houve uma falta de planejamento enorme”, afirma.

O Inconformista

  • Preço R$ 44,90 (184 págs.)
  • Autoria Rubens Ometto, com Aguinaldo Silva
  • Editora Portfolio Penguin
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