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Solange Srour

Ano eleitoral e agenda para 2023 vão mostrar se PIB é sustentável

Questões como segurança jurídica, fortalecimento das agências reguladoras, abertura comercial e melhor estrutura tributária bem atrasadas

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Solange Srour

Economista-chefe de Brasil do banco Credit Suisse. É mestre em economia pela PUC-Rio.

O PIB (Produto Interno Bruto) do 1º trimestre cresceu 1,2% em relação ao mesmo período de 2020, bem acima da mediana das previsões, em torno de 0,8%. O mais surpreendente é que, há poucos meses, a expectativa média do mercado era bem negativa, com previsão de contração.

O encerramento de diversos estímulos governamentais, a aceleração da inflação e o recrudescimento da pandemia eram os fatores por trás do elevado pessimismo. Com o resultado divulgado nesta terça (1º), o PIB praticamente voltou ao patamar do quarto trimestre de 2019, antes da pandemia do novo coronavírus.

As projeções para 2021, que no fim do ano passado estavam perto de 3%, caminham para algo entre 4,5% e 5%, e muitos economistas preveem números superiores a 5%.

Há alguns fatores por trás da maior resiliência da economia brasileira.

Em primeiro lugar, o nível de isolamento não subiu como o esperado mesmo com uma grave evolução da pandemia. Houve menor adesão da sociedade ao distanciamento social, explicada por diversos motivos: a necessidade de sair para as ruas para recompor renda, a fadiga do isolamento e uma sensação de maior segurança com o avanço da vacinação.

Segundo lugar, o forte crescimento mundial tem puxado preços de commodities para cima, o que é bastante relevante para uma economia exportadora de insumos básicos como a do Brasil.

Terceiro, a diminuição dos estímulos fiscais teve o efeito oposto ao que o consenso pressupunha: evitou a perda total da confiança e permitiu o começo da retomada dos investimentos.

Por fim, houve a adaptação dos trabalhadores ao novo ambiente de baixa mobilidade social, com possíveis ganhos de mais longo prazo, como a digitalização de ampla parte da economia.

Ainda que o cenário para o PIB tenha se tornado mais benigno, a recuperação tem sido bastante desigual entre setores. Embora a agropecuária, a indústria de transformação e o comércio já se encontrem hoje com um nível de produção bem acima do nível pré-pandemia, construção civil e serviços, sobretudo os mais relacionados ao contato social, estão ainda bem deprimidos.

Os reflexos no mercado de trabalho são dignos de nota: o emprego formal tem se recuperado de forma bem mais acentuada do que o informal.

Os riscos para o crescimento neste ano não são poucos, como a ocorrência de novas ondas mais severas de contágio, a aceleração da inflação, principalmente a de alimentos, que pressiona o poder de compra da população, além de um agravamento do quadro hidrológico do país.

A possibilidade de a expansão da economia surpreender está relacionada ao cenário externo.

O ambiente internacional pode continuar benigno por mais tempo com o recrudescimento do risco inflacionário nos Estados Unidos, uma apreciação cambial que pode trazer uma queda da inflação mais acelerada e a possibilidade de sairmos da crise com juros reais mais baixos do que antes da Covid.

Tudo indica que o Brasil terá uma recuperação vigorosa neste ano. Mas a uma grande dúvida permanece: quão sustentável é esse crescimento? Tudo vai depender da travessia do ano eleitoral e da agenda que será posta em 2023.

O futuro da política fiscal ganhou complexidades com a pandemia, e os desafios para colocar a nossa dívida em trajetória sustentável são maiores.

A desigualdade social se aprofundou e vai exigir desenhos melhores de políticas públicas. Questões como segurança jurídica de longo prazo, fortalecimento das agências reguladoras, abertura comercial e melhora de eficiência na nossa estrutura tributária estão bem atrasadas.

Crescer de forma cíclica é fácil, difícil é tornar esse crescimento estrutural.

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