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O que dizem as folhas do chá chinês sobre o preço das commodities

Mercado mostrou aversão ao risco

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Roberto Dumas Damas

É professor de economia do Insper, mestre em economia pela Universidade de Birmingham, na Inglaterra, e mestre em economia pela Universidade Fudan, na China

Mesmo depois do preço de commodities ter subido mais de 40% nos últimos 12 meses, a semana passada foi marcada por um soluço quando o Bloomberg Commodity index chegou a cair mais de 4% e ter recuperado um pouco no começo desta semana.

Mas o que será que aconteceu para o mercado mostrar uma certa aversão ao risco e assustar os bullish traders?

Vista aérea de plantação de chá na China
Vista aérea de plantação de chá na China - Tao Liang - 20.abr.21/Xinhua
  1. Poderíamos dizer que a reunião do Fomc, no dia 16 de junho, mostrando que o Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, tenderia a subir as taxas de juros antes do antecipado (take the dot spots with a grain of salt! – Jerome Powell), ou seja, em 2023 ao invés de 2024, e ao mesmo tempo suscitar especulações quanto ao anúncio do início de um tapering, mesmo que tímido, na reunião de Jackson Hole em agosto deste ano nos oferece um importante insight quanto a possibilidade do sell-off testemunhado.

  2. Por outro lado, temos a China (sempre ela) tentando frear a inflação dos produtores locais proibindo especulações com commodities, cerceando investidores —que aparentemente faziam estoques para ganhar com especulações - e outras idiossincrasias de uma economia típica capitalista, mas com enorme presença estatal. Pausa aqui. Não, a China não é comunista. Apesar de ser controlada pelo Partido Comunista Chinês (PCChinês) e ser uma ditadura, o modelo de produção chinês é capitalista (“to get rich is glorious” – Deng Xiaoping) com forte presença estatal. Para aqueles que ainda gritam slogans do tipo “vá morar na China para você ver como é o comunismo”, seria estranho constatar um país comunista com duas bolsas de valores (Shanghai e Shenzhen) com capitalização de mercado de US$ 9 trilhões (R$ 44,2 trilhões), empresas bilionárias, como Alibaba, Tencent, Baidu, Didi, Chery, China Unionpay, Sany Heavy Industry e headquarter dos maiores bancos do mundo como os chineses ICBC, BoC, CCB, ABC e BoComm. Mas, como dizia o saudoso Paulo Francis “não deixe os fatos mudarem suas opiniões”.

Além do que, mesmo que a China busque utilizar estoques estratégicos para segurar artificialmente a tendência dos preços de algumas commodities metálicas, o baixo nível de estoque apresentado pela London Metal Exchange não nos autoriza acreditar que a utilização estratégica de estoques nesse nível baixo logrará algum efeito duradouro diferente da trajetória natural dos preços.

Depois dessa breve digressão sobre o modelo econômico chinês, vamos ao que interessa.

Afinal, a China logrará intervir de forma sustentada no preço de commodities como minério de ferro, cobre, zinco, ou produtos agrícolas de que tanto precisa para manter seu crescimento econômico e legitimar seu modelo ditatorial liderado pelo PCChinês evitando tensões sociais?

Particularmente, acho difícil, pois desde as minhas aulas de microeconomia sempre aprendi que commodities são consideradas um perfeito exemplo de organização de um mercado competitivo, onde os participantes geralmente são price takers ao invés de price makers, pelo menos assim dizia o livro texto, usando exemplos nem sempre absolutamente replicáveis na vida real.

Óbvio que cada país pode influenciar localmente o preço das commodities que produz ou compra do exterior por meio de subsídios e controles estratégicos de estoques, mas não tanto a ponto de mudar a trajetória do preço de determinada commodity no mercado internacional.

Mas, os preços não caíram na semana passada?

Sim, mas acho um pouco de excesso de extrapolação intelectual acreditar que, mesmo a China sendo price taker de muitas commodities, evitar a trajetória de alta das commodities metálicas (nem tanto) e agrícolas (com certeza) profanando a máxima lei de oferta e procura. Mas que essas intervenções causam um rebuliço danado nas folhas do chá, ah isso causam.

Mas, então mesmo sendo um capitalismo de estado, o governo chinês não consegue influenciar no preço de alguns ativos. Muita calma nessa hora. Estávamos falando de commodities, se o assunto enveredar para outros ativos como ações, a narrativa muda completamente.

Por ter sua conta capital do balanço de pagamentos fechada, com restrições para investimentos diretos e com enormes restrições para entrada e saída de capital especulativo, o governo chinês intervém pesadamente na bolsa de valores do país comprando e vendendo ações, através de seu braço de investimentos Central Huijin, como forma de limitar a volatilidade excessiva dos ativos, de modo a manter as tensões sociais sob controle.

Posto que como dissemos, a conta capital do balanço de pagamentos é fechada, apesar de porosa, os chineses da China Continental, não de Hong Kong ou Taiwan, tem poucas alternativas de investimentos e os que existem, oferecerem taxas de juros aquém das de mercado, como forma de subsidiar o capital dos empreendedores e tomadores de recursos, preferencialmente, as empresas estatais.

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