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The New York Times

Obstáculos para a recuperação dos EUA são grandes

Economia cresce explosivamente em alguns setores e, em outros, continua deprimida

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Neil Irwin

Correspondente sênior de economia do jornal The New York Times

The New York Times

Quase sempre, o anúncio de um crescimento econômico de 6,5% seria motivo de festa nas ruas. Só na estranha economia de 2021 um número como esse poderia ser considerado como um pouco decepcionante.

Não é simplesmente pelos analistas terem antecipado um número dois pontos percentuais mais alto para o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto (PIB), embora isso tenha acontecido. E nem mesmo é pela produção econômica americana continuar abaixo de seu percurso de crescimento anterior à pandemia, levando em conta a inflação, ainda que isso também tenha acontecido.

O que torna os números do PIB anunciados nesta quinta-feira (29) menos que empolgantes é o fato de que pintam um retrato de um país que continua a enfrentar dificuldades para concluir um imenso reajuste econômico.

Os números oferecem alguns motivos para otimismo, com certeza. O crescimento no primeiro semestre do ano ultrapassou facilmente as taxas que os analistas calculavam, no final do ano passado, e o forte crescimento do investimento em equipamentos para empresas é um bom prenúncio para o futuro.

Mas a economia anda irregular —em alguns setores, cresce explosivamente, em outros continua deprimida.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, em discurso na Casa Branca - Erin Scott - 6.mar.21/Reuters

Os novos números mostram uma economia onde existe muita procura, mas na qual as restrições de oferta em certos setores são graves, e reduzem o crescimento a um ritmo mais lento do que o que deveria ser possível.

Considere o setor de habitação. De certa forma, ele está passando por um boom, com os preços das casas (e os dos aluguéis) em alta rápida. Mas em termos de contribuição para o PIB, o investimento em construção residencial se provou um forte fator negativo no segundo trimestre, com uma contração de 9,8% em termos anualizados.

Se os construtores não encontram madeira, eletrodomésticos e outros insumos no mercado aos preços esperados, ou a preços que façam sentido economicamente, torna-se impossível construir casas. E assim, a despeito da demanda extraordinária por moradia, o setor na verdade subtraiu meio ponto percentual do resultado geral do PIB.

Houve contração semelhante, da ordem de 7%, no investimento em edificações empresariais, o que provavelmente reflete uma mistura de escassez de suprimentos e incerteza quanto à demanda futura por certas categorias de imóvel comercial, como escritórios e hotéis. E há os estoques de produtos, que subtraíram 1,1 ponto percentual do ritmo de crescimento do segundo trimestre.

Economistas tendem a ignorar oscilações de estoques porque elas em geral não revelam muito sobre o percurso futuro da economia. Neste caso, porém, a queda de estoques é reveladora. E é compatível com o que as empresas vêm dizendo sobre terem de reduzir estoques na luta por atender à demanda (pense, por exemplo, nas vendas de carros perdidas porque há menos carros e picapes entre os quais escolher do que costuma ser o caso).

Enquanto isso, o grande reajuste que precisa acontecer na economia entre o consumo de bens e o de serviços —embora tenha prosseguido no segundo trimestre— ainda tem um longo caminho a percorrer.

Considere um mundo hipotético no qual a pandemia não tenha ocorrido e a economia tenha continuado a crescer como era previsto que fizesse nas projeções de janeiro de 2020, com os diversos segmentos do PIB mantendo fatias constantes do bolo econômico.

O consumo de serviços no segundo trimestre continua 7,4% abaixo do nível que teria naquele universo alternativo, e os gastos com bens duráveis continuam 34% mais altos.

São variações extraordinárias naquilo que a economia está sendo solicitada a produzir, e não é chocante que o lado dos bens físicos na economia esteja esbarrando em limites de capacidade, diante de uma realocação de tal ordem na procura.

O que aconteceu nos últimos meses não foi que os americanos tenham transferido dinheiro de suas compras de bens físicos para a de serviços, mas sim uma alta nas duas categorias —com ritmo de crescimento variável, porém.

Os gastos com bens duráveis subiram em 9,9% no segundo trimestre, depois de uma alta de 50% no primeiro trimestre. Os gastos com serviços subiram em12% no segundo trimestre. São esses os números que propelem as pressões sobre a oferta de muitos bens físicos.

Além disso, os dados do segundo trimestre surgiram antes da alta no número de contágios causada pela variante delta do vírus. Ainda não sabemos se sua difusão afetará a economia de forma significativa, mas caso o faça os efeitos prováveis incluirão agravar o desgaste na oferta de produtos físicos e retardar o reequilíbrio da economia em direção dos serviços.

Seria pouco realista esperar que os traumas econômicos de 2020 sejam corrigidos em alguns poucos trimestres, mas o que os dados recentes —tanto sobre o PIB quanto sobre o emprego— demonstram é que encontrar um novo equilíbrio será realmente trabalhoso.

Que a expansão da economia continue robusta é uma notícia fantástica, claro. Entre 2001 e 2019, houve apenas um trimestre no qual o crescimento anualizado tenha excedido os 6%; em 2021, houve dois deles em seguida.

A cura está acontecendo. Mas os números novos refletem o quanto são severas as cicatrizes do ano passado.

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