'Uber de abelhas' leva colmeias para polinizar plantações

Aplicativo criado por startup conecta apicultores a produtores rurais

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Belo Horizonte

Um aplicativo criado por uma startup de Ribeirão Preto, no início do ano passado, vem ganhando destaque como uma espécie de "Uber das Abelhas". O objetivo da plataforma é conectar apicultores e produtores rurais que veem na polinização por abelhas uma forma de impulsionar suas safras.

A tecnologia, que leva o nome de Agrobee, o mesmo da startup que a criou, oferece um vínculo maior com os clientes do que os aplicativos de mobilidade urbana. Ao cadastrar a fazenda na plataforma e solicitar o serviço de polinização, o produtor rural tem todo o processo acompanhado por profissionais da empresa.

A plataforma conta com uma rede de apicultores donos de cerca de 60 mil colmeias e aproximadamente 100 produtores rurais, em 20 mil hectares espalhados por São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Goiás e Paraná.

Segundo o presidente da startup, Guilherme Sousa, a Agrobee firma o contrato com os produtores agrícolas e repassa 70% do valor acertado para os apicultores.

Em suas redes sociais, a empresa também promove lives e discussões com dicas de como manusear as abelhas, procurando incentivar os profissionais a alugarem as colmeias para polinizar plantações.

"Cerca de 70% da renda de um apicultor norte-americano vêm do serviço de polinização, mas, no Brasil, isso é insignificante. Os apicultores que ganham com a polinização estão mais concentrados em Santa Catarina, com as plantações de maçã, e um pouco no Nordeste, com o melão. São mercados bem restritos", afirma Sousa. Quase toda a renda do apicultor brasileiro vem de mel e própolis.

"A polinização é o sexo das plantas. É o transporte do gameta masculino, o pólen, para outra flor, onde tem o gameta feminino, que seria o óvulo. As sementes são o embrião, e as flores seriam os órgãos reprodutivos", explica Cristiano Menezes, pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) Meio Ambiente.

O processo natural de polinização ocorre com vários agentes, como vento, água, aves e insetos, mas o mais frequente são as abelhas, que se alimentam do néctar e do pólen das flores.

Ao todo, existem cerca de 20 mil espécies conhecidas de abelhas em todo o mundo; no Brasil, são 2.000. Nos apiários, as mais comuns são as chamadas africanizadas.

Tendo como referência um estudo de 2015, Menezes afirma que, dos dez cultivos mais relevantes da agricultura brasileira, só o cacau não depende da polinização por abelha.

"Soja, café, algodão, laranja, melancia, melão e maçã são beneficiados pela abelha que é usada na apicultura. Outros dois cultivos atraem espécies não africanizadas, como o tomate e o maracujá, este polinizado pela abelha mamangava, pouquíssimo manejada."

Segundo Guilherme Sousa, presidente da Agrobee, a startup surgiu, inicialmente, com o foco voltado para a cafeicultura, mas foi alcançando outros mercados, como o de abacate, soja e citros.

"O café arábica é uma planta autopolinizada, ou seja, mesmo sem a polinização gera frutos. Por muito tempo, acreditou-se que ela não se beneficiava de maneira alguma da polinização, mas estudos científicos defendem que o café se beneficia da polinização com aumentos de produtividade que superam, às vezes, 30%", afirma Sousa.

Atualmente, a empresa tem como clientes a Nescafé e a Nespresso, marcas da Nestlé.

Em Piracicaba, a 200 km de Ribeirão Preto, também funciona uma rede de apicultores e produtores rurais, a GeoApis. Desenvolvida em 2019 pela engenheira agrônoma Elaine Basso, em parceria com a Associação Brasileira de Estudo das Abelhas, a iniciativa tem como principal objetivo propiciar a comunicação entre as duas categorias e evitar a morte de abelhas.

"Desde 2014, quando comecei a trabalhar com a problemática da mortalidade das abelhas em campo, verifiquei que faltam relacionamento e conhecimento. Às vezes, uma parte não conhece a outra, e os apicultores acabam colocando suas colmeias em propriedades rurais [sem avisar], já que é muito difícil achar quem é o responsável por aquela área. Daí começam conflitos: as abelhas atacam funcionários e as pulverizações na plantação matam as abelhas", diz Basso.

Segundo Cristiano Menezes, pesquisador da Embrapa Meio Ambiente, um levantamento feito pela ONG Bee Or Not To Bee, apontou que, de 2013 a 2017, o Brasil perdeu cerca de 20 mil colônias devido a pesticidas. O número, ainda de acordo com ele, representa 1% do total de colmeias no país.

Apicultor borrifa fumegador em abelhas para acalmá-las
Aplicativo criado pela startup Agrobee, de Ribeirão Preto, conecta apicultores e produtores rurais. - Pierre Duarte/Folhapress - 26.jul.2021

Ao se cadastrarem na plataforma, os apicultores recebem alertas sobre as datas em que as pulverizações estão agendadas e podem proteger suas colmeias. Profissionais ligados à empresa ainda monitoram as condições dos apiários para detectar possíveis mudanças na população das abelhas.

Além disso, quanto maior for a rede, melhor será o grau de informações dos donos sobre quais apicultores estão utilizando suas terras.

De acordo com Basso, o lucro de sua empresa vem da mensalidade dos grandes produtores rurais, que dependem de certificados de boas ações ambientais para conseguir exportar seus cultivos.

"A cana-de-açúcar, por exemplo, não precisa de abelha para polinização, mas as áreas de floresta de matas são riquíssimos espaços para as abelhas produzirem o mel e para a gente fazer o engajamento socioambiental. Com isso, do outro lado, a usina acaba ganhando com esse envolvimento", diz a agrônoma.

Ao todo, a rede conta com uma área de 150 mil hectares e 150 apicultores cadastrados, com um total de 2.000 colmeias. O serviço ainda está restrito a São Paulo, mas, nos próximos meses, deve se expandir para o Mato Grosso do Sul e o Rio do Grande do Sul.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.