Descrição de chapéu congresso nacional

Caminho do Congresso pode ser nefasto para a economia do país, diz presidente do Magazine Luiza

Frederico Trajano, que já assinou manifesto contra Jair Bolsonaro, vê risco de retrocesso com reformas açodadas

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Brasília

O empresário Frederico Trajano, presidente do Magazine Luiza, uma das maiores varejistas do país, está “moderadamente otimista” com os rumos do país e da economia. Otimista por conta do avanço da vacinação –que tardou, mas enfim está chegando a todo o Brasil.

Mas o “moderado” é pelo incômodo com a maneira que as reformas vêm sendo conduzidas, especialmente o que ele chama de “minirreforma política”. Nesta semana, a Câmara rejeitou o “distritão” –modelo que enfraquece os partidos e dá destaque a candidaturas personalistas–, mas aprovou a volta das coligações partidárias (que permite a união de partidos em um único bloco para a disputa das eleições e favorece os "partidos de aluguel", sem ideologia).

“Se aprovado, será um retrocesso eleitoral muito grande”, diz Trajano, em entrevista à Folha. “Tem várias outras questões que precisam ser mais bem discutidas com a sociedade, como o teto dos gastos. Se o caminho tomado pelo Congresso for ruim, isso pode ter um efeito nefasto para a economia. Podemos perder uma bela oportunidade de termos uma recuperação muito sólida, que o Brasil tem todas as condições de ter”.

Trajano foi um dos signatários de um manifesto contra as investidas autoritárias do presidente Jair Bolsonaro, assinado por empresários, intelectuais e representantes da sociedade civil na semana passada.

Homem branco sorri em uma tela, tendo no horizonte as luzes da cidade
Frederico Trajano, 45, formado em administração de empresas pela FGV, é presidente do Magazine Luiza - Marlene Bergamo/Folhapress

No início de março deste ano, o sr. disse que não havia boas perspectivas para os próximos meses na economia e na política no Brasil. A sua opinião continua a mesma?

Naquele momento, estava me referindo principalmente à vacinação. A gente estava com uma indefinição em relação ao programa de vacinação e com a possibilidade de haver novos lockdowns, o que aconteceu de fato. A minha previsão se materializou. A gente já tinha fechado lojas em fevereiro e março, depois de uma segunda onda [de Covid-19] muito forte. Mas o quando o Brasil está para cair, chegar ao fundo do poço, consegue sair. Até com a ajuda da iniciativa privada, como o Unidos Pela Vacina, com a mobilização de algumas autoridades políticas, a gente conseguiu acelerar o cronograma de vacinação e estamos em uma situação muito mais confortável. São mais de 100 milhões com a primeira dose, mais de 20% com a imunização completa. Conseguimos sair daquela situação desesperadora, mas a situação atual ainda exige cuidados.

Por quê?

Tem a variante Delta e ela está atingindo países em que mais de 50% da população está com a segunda dose da vacina, onde a transmissão apresenta alta significativa. Temos que acelerar ainda mais a vacinação e cobrar das autoridades que isso aconteça rápido –não só a primeira, como a segunda dose.

Foi gasto muito tempo com questões eleitorais. Mas tem outras questões muito importantes em curso: reforma tributária, uma minirreforma política, o distritão e a volta das coligações partidárias. Eu continuo achando que o momento exige cuidado, atenção e, muito mais do que isso, proatividade, não só dos empresários, mas de todos os cidadãos, em relação a exigir das autoridades decisões acertadas, que façam a gente se recuperar deste momento de pandemia o mais rápido possível.

O sr. está otimista ou cauteloso?

Estou moderadamente otimista. O meu otimismo advém da aceleração da vacinação. E o moderado porque tem coisas importantes sendo discutidas, que precisam de uma atuação mais forte da sociedade civil, para que o caminho dessas mudanças regulatórias seja positivo.

O sr. se refere principalmente à reforma tributária?

Não só. Tem a discussão sobre o distritão e a volta das coligações. É quase uma minirreforma política que está sendo passada, com pouca atenção da grande mídia, dos empresários. Dependendo do que passar, será um retrocesso eleitoral muito grande. Tem várias outras questões que precisam ser melhor discutidas com a sociedade, como a do teto dos gastos. São vários assuntos importantes e pertinentes. Se o caminho do Congresso for ruim, isso pode ter um efeito nefasto para a economia. Podemos perder uma bela oportunidade de termos uma recuperação muito sólida, que o Brasil tem todas as condições de ter.

O Magazine Luiza registrou no segundo trimestre deste ano um lucro líquido de R$ 95,5 milhões, revertendo o prejuízo do mesmo período do ano passado, a fase mais aguda da pandemia para o comércio. Mas a fatia do comércio eletrônico no faturamento caiu de 78,5% para 71,6%. O ecommerce está desacelerando?

A maneira mais certa de comparar os dados de 2021 é com o segundo trimestre de 2019. Em 2020, havia dois terços do varejo físico fechado. Todo mundo que tinha que comprar alguma coisa, comprava no ecommerce. No curto prazo, vamos ter uma desaceleração se comparado a 2020. Mas no longo prazo, você tem uma oportunidade gigantesca, porque só um décimo do varejo é online hoje. Você tem um mercado varejista de R$ 1,2 trilhão, em que só 10% é online.

Tem algumas categorias, como supermercado, que só 1% está online. Quando se compara as taxas de penetração do ecommerce do Brasil com países mais desenvolvidos, com mais maturidade digital, a gente ainda está com um terço ou um quarto da participação deles.

Grande parte do crescimento das empresas de varejo brasileiras vai continuar vindo do ecommerce. Do ponto de vista de lojas físicas, dos mais de 7,2 milhões de varejistas, só 100 mil vendem online. Temos uma oportunidade enorme de ajudar essas empresas a se digitalizar.

Nesta quarta-feira (11), Americanas anunciou a compra da varejista de alimentos Natural da Terra, depois de ter sondado a varejista de moda Marisa. São segmentos em que o Magalu elegeu como prioridades para aquisição, ao lado de cosméticos e delivery de comida, certo?

São estes e esportes. Nós temos a missão de digitalizar o varejo brasileiro, ser o seu sistema operacional. Um ecossistema digital completo e multicanal. Temos ambições de crescer em todas as categorias que têm baixa penetração online no Brasil. Fizemos movimentos como a compra da KaBum!, que está no nicho de games, compramos lá atrás a Nesthoes, de esporte e moda, Época Cosméticos, que hoje é líder em comércio eletrônico de beleza. Temos trabalhado em todas as categorias, inclusive a de mercado [varejo alimentar]. No começo deste ano, compramos a Vip Commerce, uma plataforma que ajuda mercados pequenos e médios a se digitalizar. Temos uma estratégia de ser "one stop shop" [uma só parada] para consumidores e para sellers. Queremos ser a loja de tudo no online e ter uma série de funcionalidades e sistemas para empresas que queiram vender online.

A aquisição do KaBum! no mês passado foi a maior da história do Magalu, R$ 1 bilhão. Agora, com os R$ 10 bilhões em caixa após o "follow-on" [oferta subsequente de ações] no mês passado, tem mais compras no radar?

A gente está entrando em praticamente todos os segmentos do varejo brasileiro. Compramos várias empresas para complementar o nosso portfólio de produtos: várias de tecnologia pura, que ajudam em busca e recomendação, algoritmos, empresas de sistemas, outras que fazem logística, pagamentos, full delivery... temos vários segmentos. Queremos ser um ecossistema digital completo e multicanal. Esta é a nossa estratégia. Queremos ajudar a digitalizar o varejo brasileiro. Temos uma ambição grande, para ajudar a aumentar a taxa de penetração no Brasil. Queremos ser um dos protagonistas deste processo.

O sr. gosta de games?

Eu gosto, mas não sou bom. Meu filho de 12 anos, com certeza, é melhor do que eu (risos).

O sr. já disse que na infância, em Franca (SP), passava as férias na loja, ajudando a vender –assim como a sua mãe. Esta tradição de família se mantém?

A minha filha mais velha, de 14 anos, já trabalhou na loja, tiramos foto em dezembro de 2019. Não mandei no ano passado por conta da Covid-19. Mas mandarei este ano, com certeza, para loja ou CD (centro de distribuição). Barriga no balcão. É importante dentro do contexto de dar valor ao trabalho, ter contato com cliente, com as pessoas que trabalham na linha de frente. Entender a complexidade operacional por trás das decisões estratégicas, dos sistemas tecnológicos avançados. É preciso ter uma visão completa e global da operação. Por mais que tenha a parte high tech no varejo, tem a high touch, a do calor humano, da presença e proximidade com as pessoas. Isso nenhuma tecnologia vai mudar. Por isso queremos ser o ecossistema digital multicanal com calor humano.

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