Empresária síria cria startup para capacitar e empregar outros refugiados

Open Taste combina restaurante com formação para o trabalho

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São Paulo

No Brasil desde 2015, a empresária Síria Joanna Ibrahim, 34, se prepara para reinaugurar sua empresa neste mês após desafios enfrentados na pandemia.

Chamada Open Taste, sua startup quer ser ao mesmo tempo um restaurante e uma plataforma de educação e treinamento para outros refugiados que buscam uma oportunidade no Brasil.

A casa reabre no próximo dia 20 no bairro de Pinheiros, em São Paulo. O negócio terá exclusivamente refugiados como funcionários e irá oferecer capacitações online e presencial para que outras pessoas na mesma situação consigam se inserir no mercado de trabalho. Também oferecerá estágio para quem precisa de uma primeira oportunidade no Brasil, diz Joanna.

Ela afirma ser frequente que refugiados com formação e experiência no exterior tenham dificuldade para voltar ao mercado de trabalho ao chegar ao Brasil, por causa da falta de experiência profissional no país, falta de revalidação de diploma e dificuldade com o idioma.

Esse será mais um recomeço na vida da refugiada síria, que, depois de estudar administração nos Estados Unidos, voltou para seu país natal em 2010. Deixou a cidade de Damasco cinco anos depois, por causa da guerra.

Joanna Ibrahim é uma refugiada Síria fundadora de uma startup que une gastronomia e trabalho de refugiados - Zanone Fraissat - 2.ago.2021/Folhapress

Ao chegar ao Brasil naquele ano, sem falar nenhuma palavra de português, morou em residências ligadas a ONGs em cidades como Vila Velha (ES) e Prudentópolis (PR). Com a chegada da avó e da tia ao país, se mudou junto delas para Juiz de Fora (MG).

Tentando se manter vendendo comida feita pela família, Joanna se deparou com um desafio que a fez começar a pensar em um negócio ligado à tecnologia. Na cidade onde moravam, era impossível encontrar os ingredientes que a avó queria para manter as receitas originais de sua terra nos produtos que elas vendiam.

Enquanto fazia análise de viabilidade e financeiras para um negócio que distribuísse temperos encontrados em São Paulo para o resto do país, Joanna retomou contato com Paulo Humaitá, um amigo que fez nos seus primeiros dias após chegar ao Brasil.

Ele e Joanna se conheceram quando Paulo visitou a ONG que recebia os refugiados em Vila Velha após se sensibilizar a respeito dos desafios do grupo em curso ao qual assistiu em uma igreja.

Ao saber, anos mais tarde, do interesse dela por tecnologia, Paulo a convidou para ser uma das fundadoras de seu novo negócio, a aceleradora de startups BlueFields.

Daí em diante, além de vir para São Paulo e começar a ajudar empreendedores selecionados pela aceleradora a desenvolver suas startups, Joanna foi trabalhando novas ideias próprias, sempre colocando a questão da renda para refugiados em destaque.

Joanna iniciou uma plataforma online para conectar serviços de refugiados e clientes brasileiros. Porém, pesquisando o mercado, percebeu que seria difícil conseguir recorrência: os clientes usariam uma vez para ajudar, mas dificilmente se tornariam fiéis.

Ela optou então por concentrar seus negócios na gastronomia, sob a marca Open Taste. Passou a alugar uma cozinha para que refugiados se revezassem no trabalho.

Criou um perfil para incluir em aplicativos de delivery e passou a vender por intermédio deles, em semanas alternadas, pratos de países como Bolívia, Síria, Palestina, Iraque, Venezuela, Colômbia e Congo.

Segundo Joanna, houve uma boa procura pelos clientes, mas não o suficiente para manter o projeto economicamente viável. Era preciso pagar aluguel e dividir o valor restante com os cozinheiros, e o negócio funcionava com prejuízo, diz.

A casa Open Taste reabre no próximo dia 20 no bairro de Pinheiros, em São Paulo - Zanone Fraissat - 2.ago.2021/Folhapress

Em 2019, a empresa que ela formou, a Open Taste, passou a ter restaurante físico, ganhou novos investidores e um novo sócio, Jonathan Thomaz, 30, consultor especializado em restaurantes.

A pandemia trouxe novos desafios. Foi preciso voltar a funcionar só no delivery e passar a trabalhar com chefs contratados, em vez de manter o revezamento, para dar mais previsibilidade ao cardápio. As vendas chegaram a cair 50% em meio à segunda onda da Covid-19, diz Joanna.

Após ela ter chegado perto de desistir, a reforma e o recomeço vem com a ajuda de um investimento do irmão, que mora nos Estados Unidos.

Com um domínio fluente do português, ao qual ela incorpora gírias com naturalidade, Joanna diz que, apesar do acolhimento que teve, ainda há xenofobia no Brasil.

"Muitos anúncios que fizemos no Facebook foram respondidos com coisas como 'Volta para seu país'. Mas isso tem um lado bom, faz mais pessoas verem a empresa", afirma.

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