PEC dos precatórios muda correção de dívida e reduz valor que credor tem a receber

Governo diz ter entregado ao Congresso proposta que corrigirá todas as dívidas judiciais pela taxa Selic, hoje em 5,25% ao ano, além de parcelamento de até 10 anos

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Brasília

A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) elaborada pelo governo para parcelar o pagamento de precatórios —dívidas do governo reconhecidas pela Justiça— também promove uma alteração no índice de correção para o pagamento desses débitos.

A mudança torna a atualização de valores menos vantajosa para os credores do governo. Parcela relevante desses créditos diz respeito a ações envolvendo revisão de salários de servidores públicos e aposentadorias.

Se aprovada, a medida fará com que todos os precatórios passem a ser corrigidos pela Selic (taxa básica de juros), independente de sua natureza. Hoje, a Selic está em 5,25% ao ano.

Atualmente, a correção dos valores depende do tipo de precatório, podendo ser indexado pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), acrescido de juros, o que pode levar a taxa a patamares superiores a 10% ao ano.

O texto foi enviado ao Congresso Nacional nesta segunda-feira (9) pelo presidente Jair Bolsonaro, informou a assessoria de imprensa do Palácio do Planalto.

A aprovação da PEC é tratada pelo governo como condição para que o Bolsa Família, rebatizado de Auxílio Brasil, seja turbinado.

O plano do governo era reservar uma verba maior para o novo programa social no Orçamento de 2022. No entanto, a área econômica foi alertada sobre o forte crescimento das despesas com precatórios no próximo ano. Isso acabou tomando o espaço no Orçamento que seria usado para a área social.

Com o parcelamento dos precatórios e a correção menor desses débitos, o governo pretende abrir R$ 41,5 bilhões no teto de gastos em 2022. A regra fiscal impede que as despesas do governo cresçam acima da inflação.

Em 2019, o STF (Supremo Tribunal Federal) confirmou decisão que estabeleceu a aplicação do IPCA-E (Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial) como fator de correção monetária em processos nos quais cidadãos têm créditos a receber da Fazenda Pública.

O índice de correção monetária desses débitos, mesmo no período da dívida anterior à expedição do precatório, passou a ser o IPCA-E, e não mais a taxa referencial (TR), que hoje está zerada. A decisão gerou impacto bilionário para o governo.

Nota técnica da IFI (Instituição Fiscal Independente, ligada ao Senado) divulgada na última semana mostrou que entre 2009 e 2021 a diferença entre os indexadores TR e IPCA-E é de aproximadamente 75 pontos percentuais.

Atualmente, os débitos de natureza não tributária, como os referentes a salários e aposentadorias, são corrigidos pelo IPCA-E acrescido de juros correspondentes à remuneração da caderneta de poupança.

O IPCA em 12 meses ultrapassou 8%, enquanto a correção da poupança está em 3,675% ao ano. Isso representa um custo anual de quase 12% aos precatórios do governo.

A mudança de indexador para a Selic reduziria o custo às contas públicas mesmo em um cenário de alta das taxas de juros. A estimativa mais recente dos agentes do mercado é que a Selic encerre 2021 em 7,25% ao ano.

Em nota, o Planalto confirmou que a PEC estabelece o parcelamento dos precatórios de valor superior a R$ 66 milhões, sendo 15% à vista e o restante pago em nove parcelas anuais.

Essa medida atingirá de imediato os 47 maiores precatórios do governo federal, o que deve gerar uma economia de R$ 22,6 bilhões no próximo ano.

Outros precatórios poderão ser parcelados se a soma total desses débitos for superior a 2,6% da receita corrente líquida da União.

Nesse caso, o critério será pelo parcelamento daqueles de maior valor. Pela estimativa do Ministério da Economia, todos os precatórios acima de R$ 455 mil serão parcelados em 2022.

Para as chamadas RPVs (requisições de pequeno valor), de até R$ 66 mil (60 salários mínimos), não haverá possibilidade de parcelamentos. Segue valendo a regra atual, com prazo de dois meses para quitação.

A versão completa da proposta não havia sido apresentada pelo governo até a noite desta segunda.

Para o ano que vem, o Judiciário informou que o governo federal precisará pagar R$ 89 bilhões em decisões judiciais. O valor representa forte aumento em relação aos R$ 54 bilhões previstos para este ano.

A nota também confirmou a criação de um fundo que receberá recursos da privatização de estatais e venda de outros ativos, além de verbas de concessões e partilha de petróleo.

Segundo o Planalto, os recursos que ingressarem no fundo poderão ser usados para o pagamento de precatórios ou da dívida pública federal. O órgão não menciona proposta ventilada na última semana, que também autorizava o uso de 20% dessa verba para repasse direto a beneficiários de programas sociais.

Embora ressalte que são medidas distintas e independentes, o ministro da Cidadania, João Roma, afirmou nesta segunda-feira que a eventual não aprovação da PEC dos precatórios pode inviabilizar parte do novo programa social do governo.

“Essa PEC dos Precatórios não é uma PEC que foi feita para viabilizar o programa social. Uma vez ela não tomando cabo, pode sim ter por consequência inviabilizar avanços no programa social assim como inviabilizar uma série de coisas do estado brasileiro”, afirmou durante entrevista no Planalto.


O que muda para os credores titulares de precatórios?

Atualmente, a correção dos valores depende do tipo de precatório, podendo ser indexado pelo IPCA acrescido de juros, o que pode levar a taxa a patamares superiores a 10% ao ano.
Se aprovada, a medida fará com que todos os precatórios passem a ser corrigidos pela Selic, hoje em 5,25% ao ano.

Como será o adiamento dos precatórios?

Débitos judiciais de até R$ 66 mil (60 salários mínimos) continuam sendo pagos imediatamente.
Haverá uma regra permanente para os superprecatórios (acima de R$ 66 milhões), que serão parcelados em até 10 anos.

Além disso, haverá uma norma transitória até 2029. Os precatórios serão organizados em ordem crescente, e os maiores, que fizerem com que a soma ultrapassasse 2,6% da receita líquida anual, também serão parcelados. Essa regra atingirá precatórios acima de R$ 455 mil em 2022.

Qual o objetivo?

Abrir espaço no teto de gastos para turbinar o Bolsa Família em 2022 e viabilizar outras despesas (o teto de gastos impede o crescimento real das despesas do governo a cada ano).

O projeto resolve o problema da restrição fiscal?

Não, apenas joga a despesa para anos seguintes.

Qual o valor total de precatórios previsto para 2022?

Serão R$ 69,2 bi de precatórios e mais R$ 19,8 bi de requisições de pequeno valor, totalizando R$ 89,1 bi.​

Se a proposta do governo for aprovada, qual o valor postergado?

Caso a ideia vá adiante, a estimativa é que R$ 41,5 bi serão alvo do parcelamento (o equivalente a 46% do total previsto).

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