Descrição de chapéu The New York Times

Ben & Jerry's protesta contra ocupação de Israel em território palestino e perde investidores

Por ser contra boicotes, estado de Nova Jersey retirará investimentos de US$ 182 milhões da Unilever, dona da marca

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Patrick McGeehan
The New York Times

Nova Jersey se tornou o mais recente governo estadual dos Estados Unidos a anunciar planos para retirar seu investimento na empresa que controla a marca de sorvetes Ben & Jerry’s, por conta de sua decisão de suspender a venda de produtos nos territórios ocupados por Israel.

A Divisão de Investimento do governo estadual enviou esta semana uma carta à Unilever, cuja sede nos Estados Unidos fica em Nova Jersey, explicando que uma lei estadual aprovada em 2016 proibia o investimento de dinheiro dos fundos de pensão estaduais em empresas que participassem de boicotes.

No começo da semana, Nova Jersey tinha US$ 182 milhões investidos na Unilever, em ações, títulos e outros instrumentos, anunciou um porta-voz do Tesouro estadual.

Embalagens do sorvete Ben & Jerry's - Kevin Dietsch/AFP

A decisão veio em resposta ao anúncio pela Ben & Jerry’s, na metade de julho, de que suspenderia a venda de seus produtos nos territórios palestinos ocupados. “Acreditamos que seja incompatível com nossos valores que nossos produtos estejam presentes dentro de uma zona de ocupação reconhecida internacionalmente como ilegal”, a companhia anunciou em seu site.

A decisão da Ben & Jerry’s resultou em críticas intensas em Israel, e o embaixador do país nos Estados Unidos, Gilad Erdan, chegou a acusar a companhia de ser antissemita. Os fundadores da Ben & Jerry’s, Ben Cohen e Jerry Greenfield, escreveram em um artigo para o The New York Times que “como simpatizantes judaicos do Estado de Israel, rejeitamos fundamentalmente a ideia de que questionar as políticas do Estado de Israel seja antissemita”.

Os fundadores da empresa disseram antecipar que a reação seria “rápida e forte” e foi exatamente isso que aconteceu.

O primeiro-ministro israelense, Naftali Bennett, prometeu que “agiria agressivamente” contra a decisão, e Erdan instou os governadores de estados americanos a punir a empresa, invocando leis de combate a boicotes como a que Nova Jersey decidiu aplicar esta semana. Na semana passada, o estado do Arizona anunciou que retiraria os US$ 143 milhões (R$ 752 milhões) de fundos públicos que tem investidos na Unilever.

O novo premiê israelense, Naftali Bennett, participa da primeira reunião de gabinete, em Jerusalém - Jini/via Xinhua

O diretor da divisão de investimento de Nova Jersey, Shoaib Khan, disse que o departamento havia determinado depois de uma revisão que as ações da Ben & Jerry’s constituíam “um boicote a Israel ou a companhias que operam em Israel ou em territórios controlados por Israel”.

O estado então encaminhou sua carta à Unilever, uma empresa britânica cuja sede nos Estados Unidos fica em Englewood Cliffs, Nova Jersey, para notificá-la sobre a decisão.

Diversos outros governos estaduais, entre os quais os de Nova York e Illinois, advertiram a Unilever de que estão considerando retirar seus investimentos na empresa. No final de julho, Thomas DiNapoli, o controlador das finanças estaduais de Nova York, enviou uma carta ao presidente-executivo da Unilever,

Alan Jope, afirmando estar “preocupado e incomodado” com as notícias sobre a atitude da Ben &Jerry’s, e deu à empresa um prazo de 90 dias para convencê-lo a não retirar o investimento.

Entre as organizações que estão estimulando DiNapoli a agir está o National Legal and Policy Center, de Washington, uma organização conservadora sem fins lucrativos que promove a boa governança, e é conhecida por expor violações éticas cometidas em geral por alvos de tendências políticas progressistas.

A organização também fez uma queixa ao serviço da receita federal dos EUA sobre o uso de verbas pela Ben and Jerry’s Foundation.

“Estamos tomando essa atitude porque alguém precisa responsabilizar o conselho independente da Ben & Jerry’s por seu uso antissemita da plataforma e dos recursos da companhia”, disse Tom Anderson, um dos diretores do centro.

Jope tentou aliviar as tensões quanto à questão. No final de julho, ele enviou uma carta à Conference of Presidents of Major American Jewish Organizations, que congrega líderes de organizações judaicas importantes, para expressar a oposição da empresa a “qualquer forma de discriminação ou intolerância”.

Uma bandeira israelense em uma fábrica da Ben & Jerry's em Be'er Tuvia, Israel - Emmanuel Dunand - 21.jul.21/AFP

Jope também tratou do relacionamento complexo entre a Unilever e a Ben & Jerry’s. Depois que a Unilever adquiriu a companhia, em 2000, esta reteve um conselho independente. O conselho tem o direito de “tomar decisões de acordo com a missão social da empresa”, escreveu Jope.

A Ben & Jerry’s, criada por Cohen e Greenfielfd em Vermont na década de 1970, sempre promoveu uma visão de mundo progressista, exemplificada por camisetas com estampas coloridas e sorvetes chamado Peace Pops. Os fundadores já não integram o conselho de quatro membros, mas a presidente do conselho, Anuradha Mittal, diz que seu papel é o de garantir que a Ben & Jerry’s estabeleça exemplos para outras empresas.

Tom Kean, senador estadual republicano de Nova Jersey, disse que a decisão demonstra o sucesso da lei que ele propôs em 2016, em companhia da senadora estadual democrata Loretta Weinberg. A medida proíbe investimento público em companhias que se envolvam em boicotes, sanções ou retirada de investimentos contra Israel.

“Nossa lei envia uma mensagem clara de que Nova Jersey não vai tolerar o antissemitismo, e não vamos apoiar financeiramente empresas que tomem Israel por alvo”, disse Kean.

Essa não foi a primeira vez que a lei foi empregada com sucesso. Em 2019, o governo de Nova Jersey anunciou que estaria proibido de investir no Airbnb porque a empresa se recusava a oferecer para locação imóveis localizados em assentamentos israelenses nos territórios ocupados. Depois de medidas semelhantes adotadas por outros estados, o Airbnb revisou suas normas.

Os líderes da Jewish Federations of New Jersey divulgaram um comunicado em que elogiam a decisão de retirar investimentos da Unilever: “Congratulamos o estado de Nova Jersey por sua decisão, que representa uma reprimenda àqueles que pretendem discriminar o Estado de Israel –aliado dos Estados Unidos e parceiro econômico vibrante de nosso estado”.

Mas Selaedin Maksut, diretor executivo do Council on American-Islamic Relations em Nova Jersey, definiu a decisão como “vergonhosa”. Ele aplaudiu a Ben & Jerry’s e disse que as acusações de antissemitismo eram uma cortina de fumaça parta desviar a atenção quanto às ações de Israel nos territórios ocupados.

“Incomoda-me profundamente que o estado de Nova Jersey tenha decidido punir ativamente residentes e empresas que boicotem países estrangeiros que participam de crimes de guerra”, ele afirmou. “Boicotes e críticas a Israel não são antissemitismo, mas sim resistência a um governo de extrema direita opressivo e institucionalmente racista. Espero que Nova Jersey reconsidere sua decisão, para não se ver apanhado do lado errado da história”.

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci

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