Caixa anuncia redução de juros no crédito imobiliário, e analistas veem medida populista

Segundo banco, corte será de 0,4 ponto percentual, mas taxa, atrelada à poupança, pode subir se Selic aumentar

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Brasília e São Paulo

A Caixa Econômica Federal anunciou nesta quinta-feira (16) redução na taxa de juros de crédito imobiliário. Segundo o banco, a modalidade atualizada de linha de crédito contará com taxas a partir de 2,95% ao ano, mais a remuneração da poupança, o que representa uma queda de 0,4 ponto percentual em relação às taxas hoje vigentes.

A Caixa informou que as contratações com as novas taxas de juro se iniciam em 18 de outubro.

Inicialmente, estava prevista a participação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na cerimônia da Caixa, mas sua presença foi cancelada. O presidente teve reunião para discutir entraves do Auxílio Brasil com auxiliares.

O anúncio feito por Pedro Guimarães, presidente da Caixa, vai na contramão do recente aumento da Selic —hoje em 5,25%. Justamente por esse motivo, especialistas em crédito consultados sob anonimato consideraram a medida populista porque, caso haja posterior aumento da taxa básica de juros da economia (Selic), essa alta terá de ser repassada para o tomador de crédito.

Isso porque o rendimento da poupança equivale a 70% da Selic mais a TR (taxa referencial, hoje zerada), sempre que a taxa básica de juros estiver em até 8,5% ao ano. Se a Selic subir –a previsão de economistas segundo o último Boletim Focus, do Banco Central, é que termine o ano a 8%–, portanto, a poupança também sobe, impactando a taxa do crédito imobiliário.

Com Selic acima de 8,5%, a poupança rende 0,5% ao mês mais a TR.

Ainda segundo esses especialistas, essa não é a primeira medida tomada pela Caixa com viés de promoção do governo pelo banco.

Braço do Planalto na implementação de políticas sociais, como o pagamento do Bolsa Família, a Caixa se tornou um canal de "boas notícias" desde o início da pandemia e especialmente neste momento, em que o país enfrenta restrições severas de Orçamento para execução de programas, como o Auxílio Brasil, que ajudará Bolsonaro a conquistar votos.

Diante do crescimento da projeção da inflação medida pelo INPC neste ano, de 6,2% para 8,4%, não houve como encaixar o programa social na previsão de despesas do próximo ano.

Bolsonaro tenta viabilizar essa medida por meio de mudanças no pagamento de precatórios (títulos de dívida do governo), mas o clima político no Congresso contra a reeleição de Bolsonaro leva o governo a sucessivas derrotas, especialmente nesse campo.

Parlamentares da oposição e até de partidos favoráveis ao governo consideram que o programa serviria como poderoso "cabo eleitoral" mesmo com as falhas que, para esses congressistas, existem na modelagem do novo programa.

A animosidade contra Bolsonaro aumentou depois das manifestações de cunho golpista —com ataques aos demais poderes— que o presidente promoveu durante a celebração do Dia da Independência do Brasil.

Diante dessa maré revolta no Congresso e no Supremo Tribunal Federal contra sua pretensão política, Bolsonaro delegou a seus ministros a elaboração de pacotes de bondades e vetou, expressamente, notícias ruins.

Pedro Guimarães passou a surfar com maestria nesse contexto. Recentemente, Guimarães ajudou o governo a elaborar uma linha de crédito imobiliário com juros subsidiados para militares. Inicialmente, haverá taxas mais baixas para policiais e oficiais de patente mais baixa (salários de até R$ 7 mil).

Os militares são uma importante base de apoio do governo, especialmente as polícias estaduais.

Durante o evento da redução de juros no crédito habitacional, Guimarães explicou que, apesar da elevação na taxa básica de juros, houve ganhos de produtividade dentro do banco que permitiram oferecer juros mais baixos, até como alternativa comercial para atrair mais negócios (novos contratos de financiamento).

"Isso aqui foi uma primeira calibrada. Por que faz todo o sentido matemático? Exatamente porque o nosso spread bancário aumentou. Quanto maior a taxa de juros Selic, sem mexer nada no resto, maior é o ganho de todo o banco, em especial o que tem captação barata", afirmou.

Spread é a diferença entre os juros pagos pelos bancos ao captar dinheiro no mercado e a taxa efetivamente cobrada quando esse mesmo dinheiro é emprestado aos clientes.

"O que a gente sentiu? Tinha espaço para reduzir as taxas de juros neste segmento ligado à poupança. A gente fez essa primeira redução e o que a gente quer? Entender mais de vocês, fazer análises. Mas na nossa opinião existe espaço para várias outras discussões", complementou.

A Caixa informou que as contratações com as novas taxas de juro se iniciam em 18 de outubro.

Diante da persistência da alta dos preços e das consecutivas revisões nas expectativas do mercado para a inflação, o Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central elevou, na última reunião de 4 de agosto, a taxa básica de juros (Selic) em 1 ponto percentual, a 5,25% ao ano.

No comunicado, o BC indicou que fará nova elevação na mesma magnitude na reunião da próxima semana, 21 e 22 de setembro, para 6,25%.

Inicialmente, estava prevista a participação do Jair Bolsonaro (sem partido) na cerimônia, mas foi cancelada. O presidente teve reunião para discutir entraves do Auxílio Brasil com auxiliares.

Ao anunciar a redução das taxas do crédito imobiliário, Guimarães busca emplacar uma pauta positiva para o governo no momento em que Bolsonaro sofre com baixa popularidade e com dificuldades para tirar o Auxílio Brasil do papel.

Guimarães é um aliado próximo de Bolsonaro.

O Auxílio Brasil foi desenhado para ser um programa social turbinado lançado às vésperas de um ano eleitoral. Mas o Planalto enfrenta espaço fiscal reduzido e ainda tenta encontrar uma forma para realizar os pagamentos.

A estratégia de usar a Caixa Econômica Federal para puxar uma queda de juros nos bancos privados é similar à adotada pelo governo Dilma Rousseff (PT).

Em 2012, ainda em seu primeiro mandato, a presidente teve atendidos seus pedidos de reduções nas taxas para contratação de diversos tipos crédito na Caixa e no Banco do Brasil.

Na época, diante de uma Selic de 9%, os mutuários chegavam a contratar financiamento imobiliário pelo SFH (Sistema Financeiro da Habitação) com juros de até 10% ao ano.

Quem tinha relacionamento com a Caixa — conta-corrente e recebia salário no banco— conseguia o financiamento ao custo anual de 8,9%. O corte derrubou os juros a 7,9%, no mínimo, e 8,4%, no máximo.

Em geral, os bancos privados acabam respondendo aos movimentos feitos pela Caixa no crédito para imóveis. Foi também assim em 2012. Pouco mais de três meses depois do anúncio da Caixa, o Santander puxou, entre os bancos privados, o corte de juros para o crédito imobiliário, reduzindo de 10% para 8,8% a taxa anual.

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