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Ásia

Chinesa Evergrande não deve causar crise financeira global; entenda o porquê

Desde o início do ano, ações da empresa com mais de U$ 300 bilhões em dívidas caíram mais de 80%

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Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

Não é todo dia que uma incorporadora imobiliária causa risco no sistema financeiro de um país, mas esse é o caso da Evergrande, empresa chinesa com mais de U$ 300 bilhões (R$ 1,6 trilhão) em dívidas. Desde o início do ano, suas ações caíram mais de 80%, e a empresa está tentando queimar estoques para pagar os juros dos títulos que estão vencendo.

O tamanho da sua dívida e o estrago que pode causar no balanço dos mais de 100 bancos que emprestaram dinheiro para a empresa preocupam, mas não devem causar uma crise financeira. São duas as razões para isso: o sistema financeiro chinês não é integrado ao resto do mundo e as autoridades chinesas têm bala na agulha para garantir a liquidez do sistema, não importa o tamanho do buraco.

Ainda assim, há riscos. Crises financeiras não acontecem pelo tamanho do endividamento, mas sim pela qualidade das dívidas, públicas e privadas, e alavancagem das instituições financeiras.

Escritório da Evergrande em Hong Kong - Bobby Yip - 26.mar.2018/Reuters/File Photo

Um exemplo é a crise de 2008, causada em grande parte pelos bancos americanos que criaram produtos financeiros (como credit default swaps), no qual empacotaram dívidas imobiliárias boas com ruins, mas conseguindo que o conjunto fosse classificado como de baixíssimo risco.

Como há muita incerteza sobre a qualidade das dívidas das incorporadoras imobiliárias chinesas, isso poderia ser o estopim para uma crise financeira local. Em parte, o colapso da Evergrande é resultado das mudanças regulatórias na China e do agressivo modelo de negócio da empresa.

As novas regras, introduzidas há mais de um ano, incluem limites no endividamento e alavancagem de empresas imobiliárias. A empresa, como muitas do setor, usava seu tamanho para se endividar, comprar terrenos e continuar crescendo.

Hoje, a Evergrande é tão grande que sua falência poderia levar a um pânico generalizado, desde que o PBOC, banco central chinês, deixe isso acontecer, o que é pouco provável. As autoridades chinesas têm instrumentos para resgatar o sistema financeiro; afinal, é função dos bancos centrais serem emprestadores de última instância.

Contudo, há exemplos mundiais de má gestão de crises sistêmicas. O banco central japonês agiu a conta-gotas no início da década de 1990, e até hoje a economia japonesa paga por isso. No dia 15 de setembro de 2008, o Federal Reserve, banco central americano, anunciou que deixaria o Lehman Brothers ir à falência, erro monumental pelo qual pagamos até hoje.

Se uma crise na China acontecer, o que esperar no Brasil?

Crises financeiras se espalham por meio de sistemas financeiros e comércio exterior. A moeda chinesa, o yuan, não é conversível e há controle de capitais no país. Por mais que a Evergrande também tenha dívida em moeda estrangeira, a maior parte é em moeda local. Mais ainda, desde que o yuan sofreu um ataque especulativo por empresas estatais chinesas, em 2015 e 2016, o processo de integração financeira com o resto do mundo parou.

Uma crise financeira ficaria contida na China. Mas só do lado financeiro. Uma recessão lá levaria o mundo junto, pela queda na demanda mundial. O caso da Evergrande não deve causar uma crise financeira. Mas mesmo que o risco de uma recessão global seja baixo, convenhamos, o mundo não precisa de mais notícias ruins.

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