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Pandemia tira classe C do mercado financeiro

Dados mostram queda no número de pessoas que se dizem investidoras nessa faixa de renda

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São Paulo

O impacto socioeconômico desigual da pandemia entre as diferenças parcelas da população por faixa de renda, dentre tantas métricas diferentes, pode ser observado também sob a ótica dos investimentos.

Pesquisa da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) em parceria com o Datafolha mostra que caiu em 2020 o percentual de pessoas na classe C que se diziam investidoras. Nas classes A e B, houve aumento ou estabilidade nesse percentual.

No ano passado, 30% dos entrevistados da classe C responderam ter algum tipo de investimento, ante 40%, em 2019. Na A e B, os percentuais passaram de 61% e 53% para 71% e 54%, respectivamente.

A pesquisa entrevistou 3.400 pessoas da população economicamente ativa em todas as regiões do país entre novembro e dezembro do ano passado. A margem de erro é de dois pontos percentuais.

Os dados revelam ainda que a renda média familiar da classe C retrocedeu ao patamar de 2018, para R$ 2.800 em 2020, ante R$ 4.400 em 2019. Enquanto isso, a média na classe A passou de R$ 17 mil para R$ 21,1 mil, e na B, foi de R$ 6.600 para R$ 7.400.


Parcela da população investidora (em %)
2019 2020
Classe A 61 71
Classe B 53 54
Classe C 40 30
Renda média (em R$ mil)
Classe A 17 21,1
Classe B 6,6 7,4
Classe C 4,4

2,8

Fonte: Anbima e Datafolha


Claudia Yoshinaga, coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV EAESP (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas), destaca que as classes mais baixas foram esmagadas nas duas pontas na pandemia, com uma queda de receita por causa da perda de emprego e de renda, combinada com um aumento nas despesas provocado pela inflação em itens básicos da cesta de consumo, como alimentos e energia.

“A pesquisa da Anbima mostra um triste resultado, mas, de alguma maneira, já esperado”, diz a coordenadora. Segundo a especialista, estudo realizado no fim do ano passado pelo Centro de Estudos em Finanças da FGV chegou a conclusões parecidas com as da pesquisa da Anbima, apontando para uma perda de renda, em termos proporcionais, mais pronunciada entre aquelas pessoas de menor poder aquisitivo.

“Já a população das classes mais altas conseguiu até ser mais investidora, porque é uma parcela que, em geral, manteve o emprego, e de alguma maneira começou a gastar menos, economizando com combustível, entretenimento, alimentação”, afirma Claudia.

A pesquisa da Anbima mostra ainda que 55% dos entrevistados não guardaram nenhum dinheiro em 2020 e tampouco contavam com reservas anteriores. Desse grupo, 74% eram da classe C, 24%, da B, e apenas 2%, da A.

Restrições orçamentárias ocasionadas por falta dinheiro, salário baixo e desemprego lideram as justificativas para a ausência de poupança.

“Quem não tinha reserva teve de se endividar, usou o cheque especial, o cartão de crédito, porque foram as únicas formas de conseguir fechar o mês”, afirma Marcia Dessen, planejadora financeira CFP e diretora da Planejar (Associação Brasileira de Planejadores Financeiros) e colunista da Folha.

Claudia, da FGV, diz ainda que, dado o elevado custo que a pessoa incorre na cobrança de juros nessas modalidades, na hora do aperto, é melhor se desfazer de qualquer tipo de investimento antes de recorrer a opções desvantajosas nos bancos. “Dificilmente um investimento no mercado vai render tanto quanto os juros cobrados no cartão de crédito ou no cheque especial”, afirma a coordenadora.

Para quem teve de resgatar algum valor em razão da pandemia, a recomendação da diretora da Planejar é recompor a reserva assim que possível, no ritmo, claro, que o orçamento permitir. “E, para quem ainda não tinha, que o faça também, porque a reserva financeira traz uma tranquilidade muito grande, uma sensação de segurança”, diz Marcia.

A planejadora acrescenta que, embora os números de casos de Covid venham em queda, o cenário ainda é desafiador, com inflação e juros em alta e as eleições em 2022 aumentando a incerteza política.

Nesse ambiente, ao considerar uma reserva que traga algum conforto financeiro, ela diz que o ideal é que a pessoa se concentre em ativos de renda fixa pós-fixados, atrelados ao CDI e com alta liquidez. “São aplicações que têm o menor risco de mercado, em que o investidor sempre tem um pouco mais no fim do mês”, diz.

Entre as principais alternativas com essas características, ela aponta os títulos públicos Tesouro Selic, que acompanham o rendimento da taxa básica de juros e que podem ser negociados pela plataforma online Tesouro Direto, bem como os CDBs indexados ao CDI, e as letras de crédito imobiliário e do agronegócio (LCIs e LCAs) que oferecem a isenção tributária à pessoa física.

Fundos DI de grandes bancos também podem ser uma opção, desde que a taxa de administração não supere a casa de 0,30% ao ano, recomenda a especialista. “Se alguém põe a reserva financeira em ações, ela pode vender a hora que quiser, mas o problema é que o preço pode não ser o mais adequado, como é o caso agora”, diz a diretora da Planejar.

Segundo a especialista, as boas práticas de mercado indicam que o ideal é que a reserva de emergência corresponda a cerca de seis vezes o orçamento mensal. Ou seja, se a renda é de R$ 3.000 por mês, a reserva financeira deveria ser de R$ 18 mil.

A ideia é que, se a pessoa perde o emprego e fica sem renda, seis meses é o tempo médio que ela demoraria para se recolocar.

Se a economia for de 10% da renda por mês para destinar à formação desse colchão, o tempo que a pessoa leva para alcançar o nível adequado de conforto é de aproximadamente cinco anos, assinala Sandra Blanco, estrategista-chefe da Órama.

“Sabemos que, mesmo com muita disciplina e corte de gastos, estamos em um momento difícil e talvez não seja fácil fazer essa economia”, reconhece a estrategista. De toda forma, ela reforça que ter o controle quanto ao orçamento do dia a dia é essencial dentro de um planejamento financeiro, até para que se possa ter em mente o que é preciso fazer para conseguir alguma economia.

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