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Ásia

Prioridade do governo chinês é diminuir poder dos monopólios, não é salvar a Evergrande

Crise da incorporadora expõe os riscos da elevada concentração da economia brasileira na exportação de commodities para país asiático

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Karin Vazquez

Pesquisadora do Center for Brics Studies da Fudan University, na China, e professora associada e reitora-assistente da O.P. Jindal Global University, na Índia

No ano passado, a China erradicou a pobreza extrema e se comprometeu a zerar as emissões líquidas de CO2 até 2060. Este ano, o 14º plano quinquenal estabeleceu novas metas para aprofundar o desenvolvimento de alta qualidade no país. À medida que o governo chinês se prepara para o Congresso Nacional do Partido de 2022, ele dá sinais que mantém seu compromisso. A resposta ao caso Evergrande será fundamental para confirmar essa tendência.

A Evergrande, a segunda maior incorporadora da China, enfrenta uma crise que faz jus ao seu nome. Na última semana, agências de risco rebaixaram sua avaliação e recomendaram a venda das ações da empresa que acumula dívidas de US$ 300 bilhões, cerca de 2% do PIB chinês.

Fundada em 1996, a empresa cresceu com o boom imobiliário da China, responsável pela rápida urbanização de grandes áreas do país e o atrelamento de cerca de 75% da riqueza das famílias ao setor de habitação. Isso colocou a Evergrande no centro de uma economia alavancada pelo mercado imobiliário.

As conexões do fundador Xu Jiayin com o governo chinês teriam dado confiança aos credores para que continuassem emprestando à Evergrande na medida em que a empresa crescia e se expandia para novos negócios. Com o desaquecimento do mercado imobiliário chinês, contudo, a Evergrande acabou com mais dívidas do que podia pagar.

Bandeira chinesa em frente à unidade da Evergrande em Xangai, na China - Aly Song/Reuteres

As novas políticas do governo chinês para combater o endividamento excessivo de incorporadoras teriam sido a gota d’água para que a Evergrande começasse a vender alguns de seus negócios na tentativa de pagar a sua dívida. A possibilidade de calote, contudo, gerou preocupação no mercado financeiro e a venda de US$ 11 milhões de um dos principais acionistas da empresa em um único dia.

A turbulência atingiu as bolsas internacionais. Na segunda-feira (20), o S&P 500, índice do mercado de ações que reúne as 500 maiores empresas do mundo listadas e domiciliadas nas principais Bolsas de Valores dos Estados Unidos, caiu 1,7% em seu pior dia desde maio deste ano.

No Brasil, o setor de commodities, principalmente minério de ferro, sentiu o maior impacto. As ações da Vale (VALE3) caíram 5,4%. PetroRio (PRIO3) chegou a recuar 8,77% e a Companhia Siderúrgica Nacional (CSNA3) caiu 5,13%, expondo os riscos da elevada concentração da economia brasileira na exportação de commodities para a China.

Diferente da crise financeira de 2008, quando o governo dos EUA apoiou as empresas Fannie Mae e Freddie Mac com resgates que somaram US$ 188 bilhões, o governo chinês não deverá vir ao socorro da Evergrande. A intervenção do governo, se houver, será no sentido de salvar a face de uma nação. Não de uma empresa. Essa lógica é marcadamente distinta no Ocidente, e, talvez por isso, muitas vezes difícil de compreender.

No caso da Evergrande, não intervir pode custar o colapso da empresa, prejuízos a milhões proprietários, fornecedores e investidores domésticos, e, de certa maneira, a legitimidade do partido comunista chinês. A alternativa seria obrigar a empresa a vender ativos e fechar acordo com credores. Em agosto, o governo chinês orientou a Evergrande a reestruturar a sua dívida e instruiu bancos públicos a reduzir empréstimos à gigante da incorporação imobiliária.

Com ou sem intervenção, a prioridade do governo chinês é diminuir o poder dos monopólios e alcançar uma sociedade mais igualitária antes mesmo de retomar o crescimento no pós-pandemia. Isso já se faz sentir com o controle e regulação sobre as big techs e, deverá dar a tom, também, para o mercado imobiliário.

Essa prioridade está na nova estratégia de igualdade social, anunciada por Xi Jinping em agosto deste ano. Ela também está em linha com o compromisso do governo chinês de construir um país próspero, democrático, culturalmente avançado e harmonioso até 2049, quando a República Popular da China irá comemorar seu 100º aniversário.

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