Argentina e Portugal reabrem fronteiras e brigam por turistas brasileiros

Vizinhos contam com dólar alto e preços baixos, e portugueses apostam em novos destinos para atrair visitantes

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Perito Moreno, no parque Los Glaciares, em El Calafate, Argentina

Perito Moreno, no parque Los Glaciares, em El Calafate, Argentina Ronaldo Schemidt - 30.ago.21/AFP

Fortaleza

A Argentina conta com a alta do dólar, que tira o poder de consumo do brasileiro nos Estados Unidos, e a maior vantagem do real em relação ao peso para se posicionar como primeira opção dos turistas ansiosos pela volta das viagens ao exterior.

Desde o dia 1º de outubro, os argentinos reabriram suas fronteiras para os viajantes de países vizinhos, como o Brasil, que tenham tomado as duas doses de qualquer vacina contra a Covid-19 ou o imunizante de dose única.

Para quem possui o esquema de vacinação completa, após 14 dias desde a última da vacina, não é preciso fazer quarentena, apenas assinar um termo de compromisso. Não há limite de tempo de permanência além do estipulado pelo tipo de visto de entrada no país.

Estande do governo argentino em feira de turismo de Fortaleza da Abav
Estande do governo argentino em feira de turismo de Fortaleza da Abav - Douglas Gavras/Folhapress

A partir de 1º de novembro, os vizinhos também pretendem abrir suas fronteiras para países com os quais não fazem fronteira.

Um problema que o turista brasileiro poderá enfrentar é que o número de voos ainda não se normalizou, o que só deve ocorrer em novembro, segundo projeções do governo.

É um dos motivos que mais preocupam os clientes que aguardam o momento de viajar novamente, diz a agente de turismo de Salvador Daniella Cunha, 42.

"Estou nesse ramo há mais de 20 anos e já posso dizer que vivi o melhor e o pior do setor. O melhor foi entre 2009 e 2012. Mas em 2020, quando o governo ainda dizia que não via motivo para comprar vacina, os clientes sumiram. Ninguém tinha coragem de ir na feira, quanto mais passear em outro país."

Embora o fluxo de clientes na agência ainda não tenha voltado ao que era antes da pandemia, ela diz que muitos consumidores fiéis voltaram a fazer contato nos últimos meses e espera que as férias de verão marquem o início de uma retomada mais robusta.

"Tenho uma cliente que queria passar a lua de mel na Flórida, mas com o dólar a mais de R$ 5, sem chance. Vendi um pacote para Buenos Aires e ela ficou feliz do mesmo jeito."

Quem não tem Disney, caça com Argentina.

Daniella Cunha, 42

Agente de turismo

Os argentinos miram o turista brasileiro ávido por voltar a viajar para fora, mas com um orçamento mais modesto, afirma Ricardo Sosa, secretário executivo do Inprotur (instituto argentino responsável por promover o turismo do país).

"Queremos rapidamente voltar ao patamar de visitantes brasileiros de antes da pandemia e há um potencial infinito para que ele dobre nos próximos anos, com parcerias que queremos fazer com agentes de diferentes regiões", diz.

Em 2019, antes da pandemia, foram 1,4 milhão de brasileiros visitando a Argentina. No sentido oposto, 1,9 milhão de argentinos vieram ao Brasil.

O país conta com esses turistas para ajudar a reerguer o comércio em Buenos Aires e regiões que também sofreram com as medidas de distanciamento impostas pela pandemia.

"A Argentina é o primeiro país estrangeiro que muitos brasileiros visitam na vida e queremos continuar assim. Sabemos que todos estão tentando se reerguer da crise, mas queremos ser o destino que oferece conforto, cultura e aventura a um preço que ficou muito mais barato para as famílias do Brasil", diz Sosa.

Ele conta que uma das estratégias é fazer divulgações de roteiros em sete diferentes capitais brasileiras, com sugestões de passeios além das conhecidas atrações de Buenos Aires, das vinícolas de Mendoza e do gelo da Patagônia.

Ninguém tinha coragem de ir na feira, quanto mais passear em outro país.

Daniella Cunha, 42

Agente de turismo

A ideia é atrair mais brasileiros para visitarem, no norte, as camadas rochosas multicoloridas do Cerro de los Siete Colores, na província de Jujuy, e o Trem das Nuvens, na de Salta.

Imagem mostra monte de pedras de cores diferentes, o Cerro de los Siete Colores, em Jujuy, na Argentina
Cerro de los Siete Colores, em Jujuy, na Argentina - Agustin Marcarian - 14.ago.21/Reuters


Outro motivo para promover o turismo em outras partes do país é que as províncias que ficam no noroeste argentino concentram algumas das piores taxas de desemprego —em Tucumán e Salta, a desocupação era de 12,4% e 10,4% no segundo trimestre, segundo o instituto Indec, ante 9,6% na média do país.

"Temos cultura, tradição e o câmbio a nosso favor. O brasileiro já era e continua sendo nossa prioridade", afirma Oscar Suarez, coordenador de Promoção Internacional do Inprotur.

Os empresários portugueses também contam com a volta do turista brasileiro. Em 2019, Portugal recebeu 24,6 milhões de turistas, sendo 5,5% do Brasil, segundo o governo do país europeu. Após quase 18 meses, as fronteiras portuguesas foram reabertas em setembro aos brasileiros.

"O Brasil é um importante mercado para Portugal e queremos fazer com que mais pessoas descubram Portugal além de Lisboa e do Porto", diz Pedro Ribeiro, diretor comercial do grupo Dom Pedro Hotels & Golf Collection.

As empresas reconhecem as dificuldades de atrair turistas com o euro acima de R$ 6, mas uma das estratégias é mirar o público brasileiro que pensa em morar em Portugal —pela facilidade do idioma, facilidade de locomoção por outros países europeus e maior segurança—, mas que muitas vezes ainda não conhece o país.

O diretor da empresa lusa de promoção de eventos Everything is New, Álvaro Covões, destaca que parte do trabalho de marketing das empresas é ressaltar as iniciativas culturais do país, que quer se destacar como um centro de exposições de arte e de festivais musicais na Europa.

"Portugal viveu um boom de turistas e de novos moradores brasileiros nos últimos anos, mas ainda somos novidade para muitos viajantes. Queremos aproveitar a retomada do setor para fazer com que os brasileiros se sintam em casa e na Europa ao mesmo tempo", diz.

Eles destacaram que o fluxo de visitantes portugueses ao Brasil também poderia ser maior, caso os brasileiros investissem mais na divulgação turística no país. Em 2019, pouco mais de 176 mil portugueses visitaram cidades brasileiras.

"Há muita curiosidade quanto ao Brasil. E se os brasileiros estão descobrindo Portugal, nós também poderíamos estar redescobrindo o Brasil", diz Covões.

Apesar de o câmbio ser um impeditivo para muitos viajantes brasileiros, os Estados Unidos também anunciaram na última sexta-feira (15) a reabertura do país em 8 de novembro, para turistas vacinados.

Todos os imunizantes aprovados pela OMS (Organização Mundial de Saúde) devem ser aceitos, e o passageiro também precisa apresentar um teste negativo de Covid-19 feito até três dias antes do embarque.

Turistas caminham por montanha ao lado do mar, na Vereda da Ponta de São Lourenço, na Ilha da Madeira
Vereda da Ponta de São Lourenço, na Ilha da Madeira - Francisco Corre - 2014/Min. do Turismo

A Argentina e o consórcio de empresas portuguesas montaram dois dos principais estandes da edição deste ano da Abav Expo & Collab, evento da Abav Nacional (Associação Brasileira de Agências de Viagens), realizado no início de outubro, em Fortaleza.

"Foi o primeiro evento que pôde receber até 3.000 pessoas, simultaneamente, de forma presencial, o que é um recorde para a pandemia", disse a presidente da Abav Nacional, Magda Nassar no primeiro dia da feira, ao destacar a importância do evento, que reuniu expositores de diferentes estados.

"Traçamos uma estratégia de transformar o Ceará num hub aéreo, com parceria com a Gol, Air France e KLM. Antes da pandemia, chegamos a ter 48 voos internacionais por semana no estado", disse o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), na abertura do evento-teste.

"O setor de turismo, pela nossa vocação e nosso potencial, é uma grande estratégia para retomarmos empregos."

Segundo o presidente da Embratur, Carlos Brito, a empresa vai lançar em novembro, em parceria com a Abav e o Ministério do Turismo, uma ação de capacitação voltada para a promoção internacional do Brasil.

"Entendemos que precisamos capacitar o mercado, para que ele venda os nossos destinos."

O repórter viajou a convite da Abav.

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