FMI afirma que é preciso ser 'muito, muito vigilante' com a inflação

Aumento da vacinação pode contribuir para reduzir pressão sobre preços no mundo, diz instituição

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Washington

O FMI (Fundo Monetário Internacional) avalia que a economia global está entrando em uma fase de risco inflacionário. Nesta terça-feira (12), a instituição pediu aos bancos centrais que sejam "muito, muito vigilantes" e tomem medidas imediatas para apertar a política monetária caso as pressões sobre os preços persistam.

A instituição realiza nesta semana sua reunião anual, que inclui vários eventos com representantes estrangeiros em Washington (EUA) ao longo desta semana. O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, viajaram para participar do encontro.

Gita Gopinath, economista-chefe do FMI, disse que, pelo nível de recuperação econômica, é muito cedo para "dizer qualquer coisa sobre estagflação", situação em que preços sobem e os países não crescem, mesmo que os governos apliquem estímulos fiscais e monetários.

Trabalhador da área de saúde segura dose da vacina da Sinovac em um distrito de saúde em Jacarta, na Indonésia; a Sinovac é parceira, no Brasil, do Butantã na produção da Coronavac - Willy Kurniawan-14.jan.21/Reuters

“Sempre soubemos que, saindo dessa contração profunda, o descompasso entre oferta e demanda representaria problemas”, disse ela ao Financial Times.

“A esperança era que se equilibrasse por volta desta época do ano. Mas fomos atingidos por choques adicionais, incluindo alguns choques relacionados ao clima, que certamente fazem esse desequilíbrio persistir por mais tempo ”, disse Gopinath.

A previsão central do FMI é que a inflação aumentará acentuadamente no final do ano, se mantenha moderada em meados de 2022 e, em seguida, volte aos níveis pré-pandêmicos.

O estudo ressalta que a inflação deve seguir forte em alguns países emergentes por reflexo da alta do preço dos alimentos, do petróleo e da perda de valor das moedas locais frente ao dólar e ao euro, o que encarece importações. E que os preços de comida têm subido em países de renda mais baixa, aumentando a fome e as dificuldades para os mais pobres.

No Brasil, o IPCA, índice oficial de inflação do país, atingiu 1,16% em setembro e acumula alta de 10,25% em 12 meses. O indicador anualizado é quase o dobro do teto da meta de inflação perseguida pelo Banco Central, de 5,25%.

O fundo passou a estimar alta de 7,9% do IPCA para este ano no Brasil, contra 4,5% em sua última projeção para a inflação, feita em abril. Para 2022, a previsão é de 4%. Antes, esperava 3,5%.

Mesmo com o ajuste, o cenário do FMI para a inflação este ano ainda é menor do que a taxa de 8,59% prevista pelo mercado no último relatório Focus do BC. Para 2022, o resultado esperado pelo fundo também é mais baixo, dado que os analistas no Focus calculam uma alta do IPCA de 4,17%.

No entanto, o cenário segue incerto, já que a crise sanitária ainda não foi controlada, e o fundo defende que a saída para a crise atual é aumentar a vacinação.

"Desdobramentos recentes deixaram muito claro que a pandemia não vai terminar em uma parte até acabar em todas as partes", defende o fundo, no relatório World Economic Outlook (panorama da economia mundial), divulgado nesta terça (12). O FMI recomenda que os países mais ricos ajudem os pobres a terem acesso a mais vacinas, por meio de doações, financiamentos e transferências de tecnologia.

Para o FMI, a inflação global pode piorar se surgirem novas variantes antes de que a vacinação avance nas áreas mais pobres do planeta. Nos países desenvolvidos, cerca de 58% da população está com o ciclo vacinal completo. Em nações emergentes, esse índice está em 36%. E em países pobres, menos de 5%. No Brasil, essa taxa é de 46,5%.

A instituição projeta que a economia global deve crescer 5,9% em 2021 e 4,9% em 2022. A previsão atual para este ano é 0,1% menor do que a feita em julho. A redução nas expectativas ocorreu por conta dos problemas nas cadeias de suprimento globais e pela piora da pandemia em países mais pobres. O fundo avalia que a recuperação global perdeu impulso no segundo trimestre de 2021.

O FMI estima que o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil crescerá 5,2% em 2021, mas apenas 1,5% em 2022. A projeção atual para o país em 2021 ficou 0,1 ponto percentual abaixo da do relatório de julho, e a de 2022, 0,4 ponto menor.

"O Brasil teve uma leve redução [na projeção] por causa dos efeitos que esperamos pelo aumento das taxas de política monetária, dados os altos níveis de inflação, e também pela revisão para baixo [do crescimento] dos EUA. Os EUA são um dos principais parceiros comerciais brasileiros, e a combinação desses fatores nos levou a fazer a redução", disse Gopinath.

Petya Brooks, vice-diretora do Departamento de Pesquisas do fundo, reforçou que a queda na projeção para o Brasil, em relação à de julho, foi "muito modesta" e que a alta no preço das commodities e a retomada nos setores de indústria e serviços serão importantes para a retomada no longo prazo.

Nos EUA, o FMI estima que economia deve crescer 6% este ano e 5,2% no próximo. A China deve ter alta de 8% em 2021 e 5,6% em 2022. A instituição avalia que, na média, os países desenvolvidos recuperarão o PIB que tinham pré-pandemia até 2022, enquanto muitos países emergentes e pobres podem chegar a 2024 ainda tentando recuperar o que perderam na crise atual.

Novos surtos de Covid também podem dificultar a retomada econômica dos países e gerar efeitos na economia global por romperem ciclos de produção e logística. A alta da doença em países da Ásia neste ano, por exemplo, fez com que fábricas locais tivessem de ser fechadas por vários dias, levando à falta de componentes eletrônicos para a montagem de outros produtos, como carros, gerando um efeito cascata capaz de impactar a inflação em lugares muito distantes de onde houve alta de casos e mortes.

O fundo recomenda que os gastos com saúde sigam sendo priorizados, mesmo em situações de orçamento apertado, e que os bancos centrais estejam preparados para agir rapidamente nos casos de altas súbitas de preço, mesmo que isso comprometa a recuperação de empregos.

"A alternativa de esperar pela retomada robusta do mercado de trabalho traz o risco de que a inflação cresça de um modo no qual ela se auto-alimenta, minando a credibilidade das políticas e criando mais incertezas", alerta o fundo, que pede aos gestores que fiquem atentos a sinais, como alta do preço de casas para comprar e alugar.

O FMI alerta que caso a Covid siga tendo impacto prolongado, o PIB global pode encolher em até US$ 5,3 trilhões nos próximos cinco anos, mas que isso pode ser evitado com o avanço da imunização.

O relatório também aponta que as mudanças climáticas podem afetar a economia, e cita como casos a seca no Brasil e os incêndios florestais nos EUA, entre outros. O fundo defende uma regulação mais detalhada do mercado de venda de créditos de carbono e US$ 100 bilhões em recursos para ajudar países pobres a adotar mudanças ambientais.

O fundo também divulgou nesta terça o Global Financial Stability Report (relatório de estabilidade financeira global), que aponta melhora nas condições econômicas nos países desenvolvidos, nas perspectivas de crédito, nos ganhos corporativos e apoio dos investidores a questões ambientais.

Por outro lado, o documento aponta riscos como a queda nas previsões de crescimento econômico, na recuperação desigual no setor corporativo, na potencial queda no preço das casas nos próximos três anos, em baixa na rentabilidade do setor de seguro de vida e no rápido crescimento de ativos cripto, como moedas virtuais.

O órgão faz cinco recomendações aos gestores públicos, incluindo que os bancos centrais forneçam orientações claras sobre as políticas adotadas e que ajam de forma decidida para conter expectativas de inflação. O FMI também defende que as políticas fiscais devem ser mais direcionadas para atingir alvos específicos e adaptadas a cada país e que mercados emergentes aproveitem os recursos extras disponíveis para implantar reformas estruturais.

Com Financial Times

Com Reuters

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.