Bolsonaro diz que 'ninguém vai furar o teto', mas que valor do Bolsa Família é injusto

Presidente não explicou como o Auxílio Brasil caberá no Orçamento

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Recife e Russas (CE)

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) confirmou, nesta quarta-feira (20), que o Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família, será de R$ 400. Ele ainda afirmou que o novo programa não vai furar o teto de gastos.

Um dia após o governo federal cancelar o evento para lançar o programa em Brasília, o presidente não explicou como o benefício caberá no Orçamento da União.

"Ontem [terça, 19] nós decidimos que como está chegando ao fim o auxílio emergencial, dar uma majoração para o antigo programa Bolsa Família, agora chamado Auxílio Brasil, de R$ 400. Parte da imprensa criticou isso, dizendo que é um programa assistencialista. Ora, hoje em dia a média do Bolsa Família são [sic] de R$ 192 e a média do auxílio emergencial são [sic] 250. Mas não vamos furar teto, não vamos fazer estripulias", disse Bolsonaro.

O presidente Jair Bolsonaro durante visita do presidente da Colômbia, Iván Duque, no Palácio do Planalto nesta terça (19) - Pedro Ladeira/Folhapress

O recuo no anúncio do Auxílio Brasil na terça-feira ocorreu após reação negativa do mercado financeiro diante da possibilidade de o governo estourar o teto de gastos. O dólar subiu 1,33%, fechando a R$ 5,594, e a Bolsa de Valores sofreu um tombo de 3,28% na terça-feira (19).

Também contribuiu para o recuo a pressão do ministro Paulo Guedes (Economia), inclusive com ameaça de demissões de secretários da pasta. A equipe econômica é contra furar o teto. O Ministério da Economia nega risco de debandada.

"Ninguém vai furar o teto, mas é injusto deixar 17 milhões recebendo apenas o valor do Bolsa Família. Precisamos ajudar essas pessoas", disse Bolsonaro nesta quarta em Russas (CE), a 180 km de Fortaleza, onde participou do lançamento do edital de uma obra relacionada à transposição do rio São Francisco.

O plano que chegou a ser previsto para anúncio definia que o Auxílio Brasil deveria pagar em média R$ 400 por família. O governo planejava alcançar o valor com duas manobras fiscais.

A estratégia para criar o novo programa previa contornar a compensação orçamentária exigida pela LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e também driblar a regra constitucional do teto de gastos, que impede o crescimento real das despesas federais —mecanismo ao qual a equipe econômica se opõe.

A rigor, o programa social tem hoje recursos garantidos para pagar menos de R$ 200, em média, aos beneficiários —aproximadamente o valor atual do Bolsa Família. O Ministério da Economia planejava elevar o montante para R$ 300 usando os recursos da taxação de dividendos, contida no projeto do Imposto de Renda, mas o texto está estacionado no Senado.

A alternativa encontrada foi, em um primeiro passo, elevar os recursos para o programa usando uma parcela temporária de aproximadamente R$ 100 a ser paga até dezembro de 2022. A visão é que, com isso, ficaria dispensada a exigência da LRF de compensar os valores (por meio de mais receitas ou corte de despesas). Isso porque programas que duram menos de dois exercícios não precisam ser compensados.

Além disso, outros R$ 100 seriam pagos por meio de créditos extraordinários fora do Orçamento e, portanto, fora do teto de gastos. Há dúvidas sobre como o governo fará o embasamento legal dessa estratégia.

O pagamento por meio de créditos extraordinários é autorizado pela Constituição apenas em casos de imprevisibilidade e urgência, e o mecanismo está sendo previsto para 2022 com o Orçamento ainda aberto a modificações.

A ala política do governo defende o auxílio a R$ 400 como uma das formas de impulsionar a popularidade de Bolsonaro no ano eleitoral de 2022, quando ele deverá tentar a reeleição.

O Palácio do Planalto espera resolver o imbróglio em torno do Auxílio Brasil de R$ 400 nesta quarta. A solução passará, de acordo com ministros palacianos, pela inclusão de um dispositivo para viabilizar os benefícios temporários na PEC (proposta de emenda à Constituição) dos precatórios, autorizando o pagamento das parcelas fora do teto de gastos.

No evento no interior do Ceará, Bolsonaro voltou a fazer críticas ao isolamento social defendido por governadores e prefeitos no início da pandemia de Covid-19 e a defender o tratamento precoce, comprovadamente ineficaz contra a doença.

As falas de Bolsonaro sobre o Auxílio Brasil ocorreram durante evento que lançou um edital de trecho da transposição do rio São Francisco.

Orçado em R$ 600 milhões, o ramal vai levar água para 54 municípios de Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba, mas só deve ficar pronto daqui quatro anos, se não houver novos atrasos, segundo o governo do Ceará.

O eixo norte deveria ter sido finalizado em 2012, mas somente em junho de 2020 a água do São Francisco chegou ao Ceará. A obra é importante para a área metropolitana de Fortaleza, já que a água vai até o açude Castanhão, principal responsável pelo abastecimento da região.

A transposição é a maior obra hídrica do Brasil. O eixo leste foi inaugurado às pressas em 2017 pelo governo de Michel Temer (MDB), depois de as obras terem começado em 2007 no governo Lula (PT), e o norte ainda precisa ser concluído. O orçamento inicial de toda a obra saltou de R$ 4,5 bilhões para R$ 12 bilhões.

Em Russas, o presidente cumprimentou apoiadores nas ruas até chegar ao local do evento. Sem usar máscara de proteção contra a Covid, Bolsonaro estava acompanhado do ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, do ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), general Augusto Heleno, e de deputados federais e estaduais aliados.

No mesmo evento, Jair Bolsonaro fez críticas à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid e se eximiu de culpas na condução da pandemia no Brasil.

Depois de passar pelo Ceará, o presidente estará nesta quinta-feira (21) em Sertânia, no interior de Pernambuco, para inauguração do ramal do Agreste da transposição. Ele já esteve no local em fevereiro de 2021, para o início dos testes do mesmo ramal, que deve beneficiar cerca de 70 cidades de Pernambuco.

Eventos ligados à transposição têm sido a principal plataforma de visitas de Bolsonaro ao Nordeste acompanhado pelo ministro Rogério Marinho.

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