Mercado já projeta dólar testando a barreira dos R$ 6

Incertezas política e fiscal, além de mudança no cenário global, podem pressionar câmbio brasileiro com força

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Após furar por um breve período a marca dos R$ 5,00 em meados de junho, a cotação do dólar engatou em uma trajetória de alta nos últimos meses que levou a moeda americana de volta à faixa dos R$ 5,60.

Frente às incertezas para a evolução do cenário econômico e político do país em 2022, agravadas nesta terça-feira (19) por declarações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) defendendo um valor de R$ 400 para o Auxílio Brasil, o novo Bolsa Família, o mercado tem revisado suas estimativas para o câmbio no fim do ano. E já há até quem não descarte o dólar próximo de R$ 6.

A moeda americana fechou em queda de 0,58% nesta quarta-feira (20), a R$ 5,5620.

“A depender da evolução do cenário externo, e antevendo uma eleição polarizada no Brasil, com o risco de medidas populistas serem adotadas pela atual administração visando obter dividendos políticos, é bem possível que o dólar venha a testar os patamares de R$ 6”, afirma Luciano Rostagno, estrategista-chefe para América Latina do Banco Mizuho.

Projeções de analistas de mercado compiladas pela Bloomberg estimam uma probabilidade de 72,4% de o dólar estar oscilando em uma banda entre R$ 5,18 e R$ 6,06 já no fim deste ano.

Dólar tem se valorizado frente ao real com aumento das incertezas políticas no radar dos investidores
Dólar tem se valorizado frente ao real com aumento das incertezas políticas no radar dos investidores - Rick Wilking - 11.mar.2009/Reuters

Segundo cálculos apontados por Rostagno, nos períodos de maior estresse do mercado durante o governo da ex-presidente Dilma Rousseff, em meados de 2015, o real ficou com uma depreciação de 16% em relação a uma cesta de moedas de países emergentes.

Hoje, diz o especialista, a moeda brasileira está aproximadamente 9% subvalorizada nessa mesma base de comparação.

“Se as preocupações fiscais atingirem os níveis de quando Dilma estava no poder, com a percepção do mercado de deterioração das contas públicas e sem sinais de correção de rumos, há o risco de o real voltar a ficar subvalorizado com taxas próximas do que vimos nesse passado recente”, afirma.

Em abril, o BTG Pactual alertou que, em um cenário de maior gasto público e forte alta do risco-país, a cotação do dólar poderia terminar o ano em R$ 6,40.

A atual mediana das projeções dos economistas consultados pelo Banco Central para o relatório Focus está em R$ 5,25 para dezembro, contra R$ 5,20 quatro semanas atrás e R$ 5,10 em agosto.


No início do mês, o Bradesco revisou de R$ 5,00 para R$ 5,15 sua projeção para o dólar no final do ano, e de R$ 5,50 para R$ 5,60, em dezembro de 2022.

"Ainda que a normalização monetária no Brasil venha contendo os fluxos de saída de dólares, a queda dos termos de troca decorrente da desaceleração da China tende a levar o câmbio para um nível mais depreciado", apontou o Bradesco, em relatório, que diz ainda que a acomodação da economia mundial e o início da retirada dos estímulos monetários nos países desenvolvidos também sugerem um real mais fraco.

Gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo acrescenta que, a um ambiente doméstico já bastante desafiador por si só, se soma um cenário internacional menos benigno do que se previa até pouco tempo atrás, que também contribui para um dólar mais pressionado.

Galhardo assinala que o aumento de juros sinalizado pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) para o ano que vem, além de reduzir a liquidez no mercado global, irá provocar um aumento da atratividade das aplicações no mercado americano.

“Conforme os Estados Unidos começarem a subir os juros, haverá um repatriamento de recursos para o mercado americano. São movimentos que vão trazer problemas não só para o Brasil, como para o mundo inteiro”, afirma o gerente de câmbio da Treviso.

Ele reconhece, contudo, que em um ambiente de menor apetite por risco por parte dos investidores, os emergentes tendem a estar entre os mais vulneráveis nas sessões de maior volatilidade.

“Não vejo muito refresco para o dólar no curto prazo, a não ser que o BC (Banco Central) se torne mais agressivo no ritmo de aperto da política monetária”, afirma Galhardo, acrescentando que o BC realizou os leilões extraordinários de venda de dólar nos últimos dias para “tirar um pouco da pressão especulativa”.

Segundo o especialista, em meio à deterioração do quadro fiscal, tem ganhado corpo no mercado as apostas de que a autoridade monetária terá de aumentar o ritmo de alta da taxa Selic para 1,25 ponto percentual na próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) na semana que vem.

“Nossa projeção era de alta de 1,25 ponto na última reunião e erramos no prognóstico. Acreditamos que o BC prefira em vez de subir de maneira mais forte a taxa no curto prazo, fazer um ajuste mais prolongado no tempo”, afirma o economista-chefe da Necton, André Perfeito, que prevê a taxa Selic em 8,25% no final do ano, chegando a 9,5% em 2022.

O economista-chefe revisou nesta quarta de R$ 5,40 para R$ 5,55 a projeção para o dólar no fim do ano, na esteira das sinalizações mais recentes do governo quanto aos rumos para a política fiscal.

“Somos atualmente Top 1 em projeção de câmbio no relatório Focus porque demos um peso maior aos ruídos políticos que aos fundamentos tradicionais do câmbio, como os termos de troca. Acreditamos que estes aspectos são os mais relevantes por ora e, após as turbulências do dia de ontem [terça, 19], está suficientemente claro que o governo deve de fato romper o teto de gastos e esta é uma nova informação que deve ser incorporada às percepções do mercado”, afirma Perfeito.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.