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Por que ser mediano em vez de excelente também é útil no trabalho

Funcionários medianos fazem o trabalho diário e permitem que um pequeno grupo cresça e vá além

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Kate Morgan
BBC News Brasil

Na nossa cultura concentrada na carreira, existe uma narrativa conhecida sobre o "superstar" do escritório. São os funcionários que se destacam pela melhor reputação e as melhores ideias; essas pessoas sempre são as primeiras da lista para aumentos salariais, promoções ou prêmios de funcionário do mês.

Nesta era do excepcional, é fácil olhar para cima e além como o único caminho para o sucesso. Se você ainda não for o funcionário com melhor desempenho do escritório, a sabedoria convencional diz que você deve lutar para chegar lá. Mas, apesar de gostarmos de pensar que somos bons no trabalho, a ampla maioria não é de trabalhadores excelentes.

Mas ser apenas competente —ou "mediano"— no trabalho não é algo ruim. Nem todo trabalhador quer ser o melhor. E, na verdade, o trabalhador mediano é essencial —talvez mais que o superstar.

Pessoas andando na rua
Por que ser mediano em vez de excelente também é útil no trabalho - Getty Images

Os funcionários medianos são frequentemente difamados ou até incompreendidos, segundo Paul White, psicólogo especialista na cultura do ambiente de trabalho em Kansas, nos Estados Unidos. "Pense em qualquer curva e a maioria das pessoas está em algum lugar no meio", diz ele. "A maior parte dos trabalhadores é mediana e isso é bom."

White compara com um time de futebol americano.

"Você precisa ter o melhor lançador, o melhor corredor e o melhor recebedor. Mas, se você não tiver um grupo sólido de pilares e bloqueadores, as estrelas do time não conseguem ter bom desempenho", segundo ele. "Você precisa que todos joguem para que o time seja vencedor. A importância do trabalhador intermediário não é suficientemente valorizada."

'É perfeitamente aceitável ser perfeitamente adequado'

A definição mais simples de "mediano", segundo Danielle Crough, psicóloga organizacional da Universidade de Nebraska, em Omaha, Estados Unidos, é um trabalhador que atende às expectativas —nem mais, nem menos.

E, embora algumas pessoas possam se destacar no meio do pacote e acabar apresentando melhor desempenho, muitos trabalhadores medianos, segundo Paul White, não querem estar no topo da pirâmide.

"A realidade é que muitas pessoas não querem ser estrelas", afirma ele. "Eles têm família, filhos e outras coisas acontecendo na vida. Eles não querem mais responsabilidade no trabalho. Nem tudo é sobre excelência no trabalho. Alguns subirão, alguns irão descer e outros ficarão no meio."

Mas ser intermediário, segundo Crough, não quer dizer que a carreira do funcionário se estagnou, nem que as suas habilidades pararam no tempo. "Na verdade, pode ser um indicativo de que eles atingiram seu ponto ideal", afirma ela.

E, embora a cultura profissional glorifique os superfuncionários, White explica que é perfeitamente aceitável ser perfeitamente adequado. O papel do trabalhador mediano é essencial para manter a empresa funcionando. Os funcionários medianos têm valor imenso para os empregadores, pois essas pessoas que fazem o trabalho diário possibilitam que um pequeno grupo de trabalhadores cresça e vá além.

"Os trabalhadores medianos comparecem, seguem as instruções e tentam avançar. E um funcionário como esse é precioso: eu construiria uma equipe permanente com essas pessoas", afirma ela.

Mulher trabalhando em computador
Você não é um funcionário de destaque —ou não quer ser? Não há nenhum problema nisso e os empregadores precisam recompensar os trabalhadores medianos - Getty Images

​Falta de reconhecimento

Mesmo que o trabalhador deseje apenas cumprir com as atribuições de um emprego, os empregadores nem sempre recompensam a permanência nesse chamado ponto ideal.

Em uma cultura de excepcionalidade, fazer o que é esperado não é considerado uma conquista. E isso é um grande problema, pois a falta de reconhecimento pode rapidamente levar alguém a sentir-se desvalorizado —até fazer com que os trabalhadores deixem os seus empregos.

"A maioria das organizações e empresas tem alguma forma de programa de reconhecimento dos funcionários", afirma White. O problema, segundo ele, é que elas tendem a homenagear um grupo de funcionários muito pequeno.

"Uma das coisas que sabemos é que esses programas de desempenho e reconhecimento tendem a atingir apenas os 10% ou 15% superiores de qualquer grupo, que são as estrelas", segundo White. Isso deixa de fora "um grande grupo intermediário —50% ou 60%", estima ele, cujas contribuições passam sem nenhum reconhecimento, porque eles não são excepcionais.

"O problema real é que quase 80% das pessoas que se demitem voluntariamente mencionam falta de reconhecimento como um fator importante", segundo White. Esse número é a conclusão de um estudo do Instituto OC Tanner, que também demonstrou que 65% dos norte-americanos afirmam que não foram reconhecidos no trabalho no ano anterior à pesquisa.

Para Crough, essa falta de reconhecimento do funcionário mediano parece ser uma das causas da atual Grande Renúncia —a tendência que levou um número recorde de trabalhadores norte-americanos a deixar seus empregos durante a pandemia de covid-19.

"As pessoas não estão se sentindo valorizadas", afirma Crough. "As empresas que dizem 'olá, estamos prestando atenção, nós valorizamos você, apreciamos o que você está fazendo' são as que não estão perdendo seus funcionários. Mas, quando o seu patrão não cumprimenta você desde 2016 e um recrutador de outra empresa liga e diz 'achamos que você é ótimo e queremos você aqui', você vai se animar."

O novo significado de sucesso

Reconhecer a contribuição dos trabalhadores medianos não é bom apenas para esses próprios funcionários —é também fundamental para os empregadores. Fazer com que os funcionários medianos continuem incentivados a bordo sustenta literalmente a atividade das empresas, pois esses trabalhadores mantêm as operações do dia a dia funcionando.

"Nesta economia (em referência ao mercado de trabalho dos EUA), você não consegue encontrar substitutos", acrescenta White. "Por isso, manter a sua equipe é fundamental para a empresa continuar a funcionar de forma eficiente." E, para isso, as empresas precisarão mudar a forma de reconhecimento dessas pessoas e a medida para definir o que é um "bom trabalho".

Os funcionários que atendem às expectativas sem excedê-las não estão apenas fazendo o mínimo, segundo Crough. Eles estão fazendo exatamente o que se espera que elas façam e isso merece reconhecimento.

"Fazer o que se espera que você faça é muito especial", prossegue ela. "O trabalhador que é consistente e sempre comparece é muito valioso e precisamos dar a ele ainda mais crédito atualmente."

Para Crough, o desempenho médio deve também ser celebrado. Prêmios e honrarias não são apenas para os que excedem as expectativas.

"Devemos criar prêmios para atributos como desempenho constante", afirma ela. "Seria útil ter maior reconhecimento desses atributos. É como a criança na escola que ganha o prêmio de comparecimento: precisamos de uma versão desse prêmio para o ambiente de trabalho."

Além de reconhecimentos adicionais como prêmios, Crough afirma que também é importante garantir que esses trabalhadores que fornecem desempenho consistente, mesmo que inalterado, sejam reconhecidos de outras formas.

"Não vincule aumentos salariais a promoções", aconselha ela. "Continuar a aumentar salários e conceder bônus a pessoas em trabalhos intermediários é uma boa medida."

"Também falo muito aos líderes para agradecer, sem esquecer aquelas coisas que parecem ser básicas. Precisamos ser conscientes e fazer com que as pessoas saibam que recebem atenção como seres humanos e que seus esforços são reconhecidos", prossegue Crough.

Reconhecer o trabalhador mediano, para White, é uma das melhores saídas para uma empresa enfrentar a Grande Renúncia sem perder membros fundamentais da sua equipe. "As companhias e os líderes que compreendem o valor dos seus trabalhadores no dia-a-dia e dedica atenção a eles estão entre os mais bem-sucedidos", afirma ele, "não apenas do ponto de vista da rentabilidade, mas também do ponto de vista da manutenção das pessoas e de uma cultura positiva."

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