Subsídios seguem intocados no governo Bolsonaro apesar de discursos de Guedes

Ministério da Economia reconhece que não foi possível reduzir esses benefícios e culpa pandemia do coronavírus

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Brasília

Contrariando os discursos feitos pelo ministro Paulo Guedes (Economia) após assumir o cargo, o governo federal deve chegar a 2022 com subsídios e desonerações praticamente no mesmo patamar de quando Jair Bolsonaro (sem partido) assumiu a Presidência, em 2019.

O projeto de Orçamento de 2022 estima um total de R$ 371,1 bilhões em gastos tributários, como é chamada a conta de recursos que o governo abre mão para incentivar e beneficiar áreas da economia.

A projeção do Orçamento de 2018 para os benefícios tributários foi de R$ 321,4 bilhões, em valor atualizado pela inflação. Portanto, houve uma alta real dessa conta durante a gestão de Bolsonaro e Guedes.

Ministro Paulo Guedes (Economia) prometia reduzir os gastos do governo com subsídios e desonerações
Ministro Paulo Guedes (Economia) prometia reduzir os gastos do governo com subsídios e desonerações - Pedro Ladeira - 2.set.21/Folhapress

Quando se observa o gasto tributário em relação ao PIB (Produto Interno Bruto), houve um leve recuo no atual governo. A proporção passou de 3,97% do PIB em 2018 para 3,95% em 2022.

O diretor da IFI (Instituição Fiscal Independente, ligada ao Senado) Josué Pellegrini explica que quando não há mudanças relevantes na legislação para limitar esses benefícios, como ocorreu no atual governo, a tendência é que as renúncias tributárias acompanhem o movimento da arrecadação.

Os incentivos são uma parcela da receita tributária que o governo opta por não receber. Por isso, quanto maior for a arrecadação total, maior será o volume de verbas que deixam de entrar nos cofres do Tesouro Nacional por causa das desonerações.

"Não teve nenhuma mudança relevante na legislação no atual governo para que o gasto tributário estivesse caindo. E ele acompanha a receita. Se a receita sobe, ele sobe também", diz Pellegrini.

Em seu discurso de posse, em janeiro de 2019, Guedes defendeu que a classe política assumisse o controle das contas públicas, retirando travas do Orçamento. Ele então sugeriu o corte de subsídios.

"Será que a classe política já é madura o suficiente para assumir o protagonismo, para assumir o comando do Orçamento da União, votar mais saúde e educação? Pode ser até mais do que está hoje, mas corta onde? Diminui os subsídios. Não somos uma fábrica de desigualdades? Não demos R$ 300 bilhões de desonerações fiscais?", disse na ocasião.

Também no início do governo, o ministro chegou a afirmar que aqueles que vão a Brasília em busca de subsídios "quebraram o Brasil".

Guedes costuma dizer que "piratas privados e burocratas corruptos" se apropriaram de recursos públicos nos governos anteriores por meio desses incentivos.

O Ministério da Economia afirmou que é mais razoável usar como base de comparação o percentual do PIB, que caiu na atual gestão. A pasta disse que os gastos tributários tendem a acompanhar o crescimento da atividade, embora tenham crescido em menor intensidade de 2019 a 2022.

"É verdade que se pretende reduzir os gastos tributários, mas isto não foi possível, pois o foco das políticas se deslocou para o enfrentamento da Covid-19. Com o maior controle da pandemia, o corte de subsídios continua na pauta", disse o ministério.

Pellegrini afirma que a discussão sobre corte de subsídios esbarra em áreas politicamente sensíveis.

Além de benefícios a grandes empresas com poder de lobby, há regras que atendem à classe média, como deduções do Imposto de Renda e incentivos a pequenas empresas, ou desonerações com cunho social, como a isenção da cesta básica.

"É tudo politicamente muito complicado de mexer e acaba ficando no discurso, acaba não ocorrendo", disse. "Bolsonaro tem essa resistência a tudo que possa prejudicar a popularidade dele. E quando chega no Congresso, os atores que são beneficiados pelos gastos tributários pressionam."

A equipe de Guedes inseriu na PEC (proposta de emenda à Constituição) Emergencial um dispositivo para reduzir fortemente os gastos tributários do governo. No entanto, o texto foi desidratado pelo Congresso, que incluiu uma série de exceções à regra.

A medida, aprovada pelo Congresso em março, proibiu cortes em metade dos gastos tributários, incluindo isenções da cesta básica e de entidades sem fins lucrativos e benefícios do Simples Nacional e da Zona Franca de Manaus.

O texto determinou que o governo enviasse ao Congresso um plano de redução de gastos tributários, respeitando as exceções. A partir desse comando, o governo apresentou um projeto com um corte considerado modesto.

Para 2022, primeiro ano de vigência, o impacto do projeto seria de aproximadamente R$ 15 bilhões, equivalente a 10% dos gastos tributários após a subtração das exceções.

O valor chegaria a R$ 22 bilhões nos anos seguintes por meio da não renovação de alguns benefícios existentes hoje.

Portanto, mesmo que o texto seja aprovado, o gasto do governo com subsídios e incentivos fiscais poderia cair de R$ 371 bilhões para cerca de R$ 356 bilhões, patamar também mais alto que o observado em 2019.

Para o consultor de Orçamento da Câmara Ricardo Volpe, essa redução prevista no projeto de Guedes para 2022 não tem força, quando se analisa o último ano de governo. Segundo ele, as maiores renúncias, como o Simples, foram poupadas na emenda constitucional.

O corte modesto promovido pelo projeto é alvo de reclamação de integrantes da equipe econômica. Em setembro, o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, afirmou que o impacto do texto é menor do que o imaginado inicialmente.

"É um plano que tem potencial de redução de gasto tributário de até R$ 25 bilhões, ficou menor do que a gente imaginava. A gente imaginava que poderia chegar a R$ 150 bilhões", disse.

O projeto foi apresentado pelo governo há um mês, mas ainda não teve andamento na tramitação na Câmara e também não tem relator definido.

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