Debandada na Receita Federal chega ao Carf e órgão de combate à sonegação

Já entregaram cargos de chefia 635 servidores em protesto contra reajuste salarial unicamente para policiais federais

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Brasília

A adesão ao movimento de auditores da Receita Federal de entrega de cargos de chefia após o Congresso prever no Orçamento de 2022 reajuste salarial para policiais federais cresceu nesta quinta-feira (23).

A mobilização da categoria chegou ao Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais). O órgão é responsável por julgar disputas tributárias entre a União e contribuintes.

Segundo o Sindifisco (sindicato da categoria), 44 auditores deixaram os cargos de conselheiros. Com a medida, eles irão voltar para funções na Receita. Ao todo, 635 auditores já abriram mão de cargos comissionados.

Também houve 17 exonerações na Copei (Coordenação-Geral de Pesquisa e Investigação da Receita), órgão de combate à sonegação, à lavagem de dinheiro e aos crimes financeiros.

Presidente Jair Bolsonaro participa de evento no Planalto com policiais rodoviários federais; categoria pode ser beneficiada com aumento em 2022
Presidente Jair Bolsonaro participa de evento no Planalto com policiais rodoviários federais; categoria pode ser beneficiada com aumento em 2022 - Pedro Ladeira - 14.dez.21/Folhapress

Procurado, o Ministério da Economia afirmou que não irá comentar. A Receita, por sua vez, não se manifestou até a publicação desta reportagem.

O movimento é uma resposta à aprovação do Orçamento por deputados e senadores na terça (21) com um pedido feito pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), de contemplar com aumento de salário os policiais, sua base política, em ano eleitoral.

A Receita tem 7.950 auditores, 6.071 analistas e 2.938 funções comissionadas. Com a debandada, os servidores deixam os postos, mas seguem na carreira, uma vez que são concursados.

Nesta quinta, o Sindifisco afirmou que a entrega dos cargos de conselheiros do Cart têm potencial para já começar a afetar o julgamento de recursos no órgão.

"A entrega de cargos envolve o compromisso de que ninguém irá ocupar o cargo que o outro entregou", afirmou o sindicato, em nota.

A entidade realizou uma assembleia nesta quinta-feira e aprovou indicativo de paralisação das atividades.

Os auditores aprovaram cinco indicativos de maneira quase unânime - com o voto favorável de 97% dos 4.287 participantes.

Kleber Cabral, presidente do Sindifisco, afirma que a paralisação vai abranger todas as atividades, exceto a área aduaneira. "[Nas aduanas] na verdade é um aumento do rigor que acaba causando uma maior demora nas importações e exportações e é direcionado apenas à parte de carga. Então não afeta nada a vida do passageiro, do viajante para o exterior ou vindo do exterior", afirma.

Os indicativos aprovados preveem a chamada "meta zero" para todos os setores da Receita Federal e do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) - o que significa deixar as fiscalizações sem resultado - a entrega ostensiva de todos os cargos em comissão e de funções de chefia, a paralisação de todos os projetos nacionais e regionais do Plano Operacional do órgão, o não-preenchimento dos relatórios de atividades e o início da chamada operação padrão nas aduanas (com exceção de medicamentos e cargas vivas e perecíveis).

Nesta quarta-feira (22), a entidade afirmou que os auditores demissionários atuam em pelo menos cinco regiões fiscais do país.

Essas áreas englobam São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Alagoas e Paraíba.

O Sindifisco afirmou que a entrega dos cargos em comissão deverá afetar mais diretamente os trabalhos nas aduanas, uma vez que liberações de produtos exigem a assinatura de superiores.

Apenas a 8ª Região, do estado de São Paulo, por exemplo, é responsável por 40% da arrecadação do país, além de concentrar os maiores aeroportos e o Porto de Santos, principal porta de entrada para produtos importados.

"A receita para [com a entrega dos cargos de chefia], ela fica acéfala, entra em espiral de caos administrativo", afirmou o presidente do Sindifisco Nacional, Kleber Cabral.

Os auditores fiscais iniciaram mobilização na noite de terça, quando o Congresso aprovou um total de R$ 4,9 bilhões para fundo eleitoral e também R$ 1,7 bilhão para o reajuste para policiais federais.

O aumento aos policiais foi um pedido do próprio presidente Bolsonaro. Apenas PF, PRF (Polícia Rodoviária Federal) e Depen (Departamento Penitenciário Nacional), além de agentes comunitários de saúde, obtiveram previsão de reajuste dentro do funcionalismo.

Os auditores reclamam que havia um acordo com a Economia para honrar o pagamento de bônus de produtividade, instituído em 2016, mas que nunca entrou em prática.

A insatisfação dos servidores da Receita não é isolada. Após a debandada no órgão, funcionários públicos de outras áreas começaram a reclamar da benesse aos policiais.

Também nesta quarta, a associação dos funcionários do Ipea divulgou uma nota se queixando da falta de reajuste salarial, mesmo após enviarem ofícios à Economia com pedido de reposição de perda inflacionária. O documento foi publicado após reunião com o presidente do órgão, Carlos Von Doellinger.

"Diante dos encaminhamentos da reunião e sem mesa de negociação para a questão salarial, a postura do governo tem mostrado que será necessário um engajamento mais amplo do conjunto de servidores civis federais para reverter esse quadro", disse a entidade, na nota.

A ANMP (Associação Nacional de Médicos Peritos) chamou de humilhação e "uma das maiores atrocidades" do governo federal contra a carreira a ausência de recomposição salarial em 2022, diante do aumento da inflação. Não há ameaça de paralisação, porém, em nota, faltam em "medidas mais gravosas".

Já na terça, a insatisfação com o aumento dos policiais havia alcançado servidores do BC.

Fábio Faiad, presidente do Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central), disse que a medida traria uma assimetria injusta porque os salários iniciais de policial federal seriam maiores que os valores de final de carreira dos servidores do BC.

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