Descrição de chapéu Auxílio Brasil

Mulheres administram cada real com sobe e desce nos valores de benefícios sociais

Domésticas, cuidadoras e donas de casa priorizam alimentação e dívidas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Famílias cadastradas em programas de transferência de renda, como o Auxílio Brasil, têm lidado com incertezas quanto ao valor exato que cairá na conta no mês seguinte.

As oscilações durante a pandemia foram sentidas sobretudo por mulheres chefes de família. Aquelas que recebiam benefício mensal de R$ 200 pelo Bolsa Família, por exemplo, passaram a contar com R$ 1.200 com o auxílio emergencial durante quatro meses no ano passado, mas o valor caiu para a média de R$ 375 neste ano.

O auxílio emergencial foi pago até outubro.

Em novembro deste ano, as mães responsáveis pelo sustento do lar voltaram a contar apenas com o valor que recebiam no Bolsa Família, programa substituído pelo Auxílio Brasil. Com o anúncio do pagamento no valor mínimo de R$ 400, elas aguardavam para receber o benefício com o novo piso antes de dezembro terminar.

O sobe e desce de valores trouxe oportunidades e também constrangimento. Com mais dinheiro no bolso foi possível acertar dívidas, melhorar a alimentação da família e até comprar móveis básicos, como camas para os filhos, mas sem a certeza do quanto cairá na conta, predomina a insegurança e a ansiedade.

Joelma Costa Dias, 48, com o filho, Paulo Bryan,13, do Jardim Ângela (zona sul), recebeu, em 2020, quatro parcelas de R$ 1.200 do auxílio emergencial. Porém, no mês passado, o valor do Auxílio Brasil foi de R$ 60. - Rubens Cavallari/Folhapress

"No mês passado tomei um susto quando fui sacar o benefício. Tinha apenas R$ 60 disponível. Na fila do banco conversei com mulheres que seguravam contas de luz e de água nas mãos. Elas voltaram para casa sem poder pagar, pois receberam praticamente o mesmo que eu. É constrangedor não ter como honrar seus compromissos ", afirma Joelma Costa Dias, 48 anos.

A moradora do Jardim Ângela (zona sul de São Paulo) recebia R$ 135 de Bolsa Família antes do auxílio emergencial. Durante quatro meses em 2020 contou com R$ 1.200, depois R$ 375 até outubro e, em novembro, R$ 60.

"Devo receber os R$ 400 no final deste mês, mas é triste pensar que o governo dá algo com data para acabar e com interesses."

Joelma diz que fazia faxina, mas com a pandemia não conseguiu mais trabalho. "As pessoas ficaram com medo de abrir suas casas por causa do vírus."

Atualmente, vive com o benefício social, doações de alimentos e faz bicos como cabeleireira. No período em que recebeu R$ 1.200, conta que foi possível fazer o tratamento odontológico básico para ela e para o filho, Paulo Bryan, 13.

"Sentíamos muita dor de dente, mas não conseguíamos ser atendidos no posto de saúde."

A beneficiária também comprou produtos para trabalhar como cabeleireira, além de uma calça (R$ 80) e um tênis (R$ 144) para o filho, e pagou contas de água, de luz e gás. "Comprei frutas, leite em pó, coisas que o meu filho gosta, mas nem sempre tenho como comprar."

Ela reclama do valor dos itens no supermercado. "O governo dá um valor maior, mas na prática não conseguimos comprar quase nada."

Segundo o Ministério da Cidadania, o benefício médio pago às 14,5 milhões de famílias em todo país passou de R$ 186,68, em outubro, para R$ 224,41 em novembro.

Fátima Garcia Leal, 44, e o filho Pedro, 7. Mulheres receberam R$ 1.200 de benefício. Agora, voltam a receber média de R$ 200 a R$ 400. - Zanone Fraissat/Folhapress

Desempregada há dois anos, Fátima Garcia Leal, 44, tem três filhos de 7, 12 e 18 anos, e diz que também fazia faxinas nas casas e cuidava de idosos, mas não conseguiu mais nada desde o início da pandemia.

A moradora de São Mateus (zona leste de São Paulo) recebia R$ 200 de Bolsa Família antes do auxílio emergencial. Fátima diz ter se surpreendido com o valor que entrou na conta referente ao benefício do mês passado: R$ 195.

"Nos meses em que recebemos os R$ 1.200 consegui comprar carne, fazer feira, pois as frutas e as verduras estão muito caras, nem sempre consigo comprar", relata.

A dona de casa afirma que também pagou contas atrasadas de consumo. "Nem faço mais bolo para economizar o gás. Moro em uma casa cedida pela minha mãe, pois não tenho condições de pagar aluguel."

No último dia 10, data em que o governo começou a pagar o Auxílio Brasil de dezembro, a prioridade de Fátima foi verificar se os R$ 400 do Auxílio Brasil já estavam disponíveis. "O dinheiro caiu hoje, graças a Deus. Estava precisando."

Mãe de três filhos de 5, 7 e 10 anos, a dona de casa Debora Eloi, 30, do Jardim Vila Carrão (também na zona leste), conta que era cuidadora de idosos, mas, desde março, está sem trabalho. Ela mora em uma casa no quintal dos pais e afirma que a única renda da família é o benefício.

"Vivemos com doações e o apoio dos pais", diz.

Debora conta que o valor do Bolsa Família, antes do auxílio emergencial, era de R$ 241. Recebeu R$ 1.200 por quatro meses e, depois, R$ 372. Os R$ 1.200 fizeram muita diferença para ela.

"Consegui fazer despensa para durar 15 dias, coisa que não é possível normalmente. Comprei bolacha, chocolate e outros doces para as crianças e, importante, separei o relógio de água e de luz. Assim, poderei pagar as contas separadas dos meus pais."

Com a redução do benefício, ela sentiu o impacto no bolso. "Dá para pagar a água e a luz, sobram R$ 50, R$ 60 para comprar feijão, arroz. Entro no supermercado e vou direto na prateleira, nem olho para o lado. Os preços das coisas aumentaram demais."

São Paulo é o segundo estado em número de beneficiários do antigo Bolsa Família, atual Auxílio Brasil –mais de 1,6 milhão de famílias, segundo o Ministério da Cidadania. O primeiro estado é a Bahia, com mais de 1,8 milhão de famílias cadastradas.

Sueli Cristina da Silva Lima, 46, mora na Vila Ester (zona leste de São Paulo). Ela é dona de casa e tem cinco filhos de 8, 10, 15, 21 e 23 anos. A venda de produtos de beleza em catálogos é uma saída para obter renda extra.

Antes do auxílio emergencial recebia do Bolsa Família R$ 160, recebeu os R$ 1.200 e, agora, R$ 212. "Vivemos equilibrando as contas."

Com o dinheiro extra comprou um tanquinho e duas camas de solteiro para os filhos menores, e afirma que comeram um pouco melhor. "Batata para fritar, iogurte, uma sobremesa diferente. Como a família é grande, não dá para fazer isso todo dia."

Ela afirma que ainda conseguiu guardar R$ 2.000. "É o que estou usando para comprar algumas coisas e pagar as contas de luz e de água."

Sueli espera que os R$ 400 de Auxílio Brasil continuem sendo pagos em 2022.

Nordeste é a região com o maior número de beneficiários

Com 7,1 milhões de famílias contempladas no programa de transferência de renda, o Nordeste concentra quase a metade dos beneficiários.

Moradora de Vitória de Santo Antão, em Pernambuco (estado que ocupa o terceiro lugar em quantidade de beneficiários do Auxílio Brasil, ou 1,182 milhão de pessoas), Adriana Oliveira, 40, é mãe de dois filhos de 13 e 23 anos. Ela relata que recebia R$ 200. Depois o benefício passou para R$ 1.200, logo R$ 375 e, em novembro, R$ 208.

"Pago aluguel de R$ 350. Quando recebi os R$ 1.200 consegui parcelar em quatro vezes a entrada de R$ 2.000 de um terreno para construir minha casa, além de comprar duas camas de solteiro para os meus filhos", afirma.

Adriana se divide entre os cuidados da mãe idosa, a venda de produtos de beleza por catálogos e os estudos para concluir o ensino médio. Ela diz que conta com o benefício para ajudar no pagamento de despesas de água e de luz. "Esperava que o valor maior fosse pago até o fim da pandemia."

Érika de Araújo, 37, com os filhos Isabela, 6, e Pedro, 3, em um assentamento no Jardim Angela (zona sul de SP) - Rubens Cavallari/Folhapress

Mãe de oito filhos diz que não recebe o benefício

Érika Fabiana Gomes de Araújo, 37, do Jardim Ângela (zona sul de São Paulo), é mãe de oito filhos de 1, 3, 6, 10,11,13, 15 e 21 anos e relata que, há pelo menos três anos, não recebe o Bolsa Família.

"Atualizei o cadastro, mas só dizem que está em análise. Recebi auxílio emergencial de R$ 600 e o de R$ 250 até outubro. Vivemos de doações. Quando sabemos que estão doando cestas básicas, saímos correndo."

Sobre a queixa de Érika Fabiana Santana Gomes de Araújo, o Ministério da Cidadania informa que ela foi beneficiária do Bolsa Família entre outubro de 2014 e julho de 2017, mas cruzamentos de dados com bases oficiais do governo federal apontaram que sua família possuía renda mensal per capita superior ao valor estabelecido pela legislação.

Em agosto de 2019, ela teve a inscrição no Cadastro Único cancelada por inconsistência de informações e, posteriormente, falta de atualização.

Ainda em 2019, diz a nota, Érika fez um novo cadastro e, em 2020, tornou-se elegível ao auxílio emergencial. Ela recebeu cinco parcelas de R$ 600 cada uma. Após a extensão do benefício, recebeu mais quatro parcelas no valor de R$ 300 cada. Em 2021, teve direito a mais sete parcelas, no valor de R$ 250 cada.

Caso a família se enquadre nos critérios de elegibilidade do Auxílio Brasil, novo programa social permanente do governo federal, entrará automaticamente na folha de pagamento, desde que mantenha seu cadastro atualizado.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.