Descrição de chapéu The New York Times

Grupo vai investir US$ 41 mi para buscar alternativa ao neoliberalismo

Filantropos e acadêmicos dizem que está na hora de um novo conjunto de ideias orientar a economia

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Steve Lohr
The New York Times

O salário da maioria dos americanos está estagnado há décadas. A desigualdade aumentou acentuadamente. A globalização e a tecnologia enriqueceram alguns, mas também provocaram a perda de empregos e o empobrecimento de comunidades.

Esses problemas, segundo muitos economistas, são em parte subprodutos de políticas governamentais e práticas corporativas moldadas por um conjunto de ideias que defendiam o livre mercado, o livre comércio e um papel de não interferência do governo na economia. Seu rótulo mais comum é o "neoliberalismo".

Um grupo de filantropos e acadêmicos diz que está na hora de um novo conjunto de ideias orientar a economia. Para pensar em alternativas, as fundações William and Flora Hewlett e Omidyar Network anunciaram nesta quarta-feira (16) que estão investindo mais de US$ 41 milhões (R$ 212 milhões) em pesquisas econômicas e políticas com esse objetivo.

"O neoliberalismo está morto, mas não criamos um substituto", disse Larry Kramer, presidente da Fundação Hewlett.

Reginaldo Gonçalves da Silva, 41, separa alimentos quer iriam para o lixo no Mercadão Municipal em São Paulo - Danilo Verpa/Folhapress

Os destinatários iniciais das doações para criar programas de pesquisa são a Escola Kennedy da Universidade Harvard, a Universidade Howard, a Universidade Johns Hopkins, além do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e o Instituto Santa Fé.

Segundo Kramer, a Fundação Ford e a Open Society Foundations também se comprometeram a aderir à iniciativa e fazer doações ainda este ano para centros de pesquisa no exterior.

As universidades concordaram não só em fornecer um espaço para os centros de pesquisa, mas em reunir acadêmicos e estudantes de várias disciplinas, comunicar suas descobertas e arrecadar fundos para manter os programas em andamento.

A expectativa é de que outros financiadores e universidades façam o mesmo. "Nosso papel é fornecer fertilizante e água para cultivar algo diferente", disse Kramer. "Achamos que esta é a próxima onda intelectual."

O esforço, com amplo financiamento, se baseia na tese de que as ideias fornecem a estrutura para as políticas e os limites do debate público. A visão de mundo do livre mercado foi promovida com mais empenho nas décadas de 1960 e 1970 por um grupo de economistas da Universidade de Chicago, liderado por Milton Friedman, que ficou conhecida como Escola de Chicago.

Na década de 1980, o governo de Ronald Reagan, nos EUA, e o de Margaret Thatcher, na Grã-Bretanha, abraçaram com entusiasmo o modelo neoliberal. Foi também a mentalidade principal do governo Clinton para acordos de livre comércio e desregulamentação financeira. Isso também valeu para o governo Obama de modo geral, em áreas como comércio, resgate de bancos e fiscalização antitruste.

Não é tanto o caso do governo Biden. Jennifer Harris, que liderou o programa de economia e sociedade na Hewlett, onde começou o trabalho na nova iniciativa, juntou-se à equipe do Conselho Econômico Nacional do governo no ano passado.

Nos últimos anos, muitos economistas proeminentes questionaram a prudência de se deixar tantas realizações humanas ao sabor dos mercados. Os economistas estão pesquisando cada vez mais a desigualdade, e esse é um foco das universidades que recebem as bolsas.

"Reduzir a desigualdade deve ser uma meta do progresso econômico", disse Dani Rodrik, economista da Escola Kennedy em Harvard e líder no projeto de reimaginação da economia. "Temos toda essa nova tecnologia, mas ela não abrange partes extensas da força de trabalho nem partes suficientes do país."

Os beneficiários das doações são entusiastas qualificados do mercado. "Os mercados são ótimos, mas temos que superar essa noção de que 'os mercados são autônomos, então deixe que o mercado resolva'", disse David Autor, economista do trabalho no MIT. "Esse fatalismo é uma decisão."

Autor é um dos líderes do programa do MIT para moldar o futuro do trabalho. "Estamos chamando isso de 'moldagem' porque é intervencionista", disse ele.

O projeto do MIT pesquisará os desafios enfrentados por trabalhadores sem diploma universitário de quatro anos —quase dois terços da força de trabalho dos EUA— e medidas que podem melhorar seus empregos ou levá-los a ocupações mais bem remuneradas.

O grupo do MIT também vai explorar políticas e incentivos para orientar o desenvolvimento tecnológico de forma a aumentar a produtividade dos trabalhadores, em vez de substituí-los.

Cada um dos centros terá uma abordagem diferente. O programa de Howard examinará as desigualdades raciais e econômicas. O centro Johns Hopkins vai explorar a ascensão e disseminação do neoliberalismo e as lições aprendidas. E o Instituto Santa Fé desenvolverá novos modelos econômicos —atualizados com insights e dados da economia comportamental, estudos de inovação e a concorrência nos mercados digitais.

A Hewlett está contribuindo com US$ 35 milhões (R$ 181 milhões) em doações para as quatro universidades, e a Omidyar Network está fazendo uma de US$ 6,5 milhões (R$ 33,6 milhões) para o Santa Fe Institute.

A Fundação Hewlett, criada em 1966 por um cofundador da Hewlett-Packard e sua mulher, é uma das maiores entidades filantrópicas dos Estados Unidos. A Omidyar Network, criada em 2004 por Pierre Omidyar, fundador do eBay, e sua mulher, Pam, inclui uma fundação e um braço de investimento que apoia empreendimentos de impacto social com fins lucrativos.

Ambas as fundações são identificadas como de esquerda porque apoiam o trabalho em áreas como mudança climática, igualdade de gêneros e justiça econômica. Mas Mike Kubzansky, CEO da Omidyar Network, disse que os desafios econômicos de hoje superam as divisões partidárias.

"Acho que há um amplo consenso de que o conjunto tradicional de ideias econômicas já passou do prazo de validade", disse.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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