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PIB inflação

Menos PIB e mais inflação em tempos de guerra

Responsabilidade fiscal pode ajudar a compensar efeitos negativos advindos do conflito na Ucrânia

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Alexandre Manoel e Mirella Hirakawa

Economista-chefe e economista sênior da AZ Quest

Fevereiro deste ano foi marcado pela invasão da Ucrânia pela Rússia e imposição de sanções financeiras e comerciais sobre a economia russa. Importante destacar também que países historicamente alinhados à Rússia, a exemplo da China, também não têm apoiado explicitamente a invasão, mostrando-se propensos à solução diplomática para que esse conflito seja finalizado. Essa postura intensifica o isolamento russo e o seu respectivo isolamento comercial e financeiro da economia global.

Do ponto de vista econômico, entendemos que esse desligamento representa um choque de oferta negativo, ao desacelerar a produção e acelerar a inflação mundial, até então prevista para começar a diminuir em abril, a partir da normalização dos efeitos da Covid-19 sobre as cadeias produtivas mundiais. Como esperamos que esse choque se reflita em termos de atividade econômica e inflação no Brasil?

Rua comercial em São Paulo - Nelson Almeida - 4.mar.2022/AFP

Em termos de direção, naturalmente, esperamos que o PIB (Produto Interno Bruto) cresça menos que o esperado. Estimativas elaboradas pelo BCE (Banco Central Europeu) apontam para um possível impacto de queda na zona do euro de até 1,0%. A economia brasileira não é dependente da Rússia, com apenas 0,6% de exportação e 2,6% de importação total vindas do país governado por Vladimir Putin. Mas estamos falando de um novo capítulo da globalização, com impactos relevantes no suprimento de fertilizantes, commodities alimentícias e energéticas, que podem acentuar a desaceleração econômica já esperada, em decorrência das altas taxas reais de juros, sobretudo.

Recentemente, o IBGE divulgou que, em 2021, a taxa de crescimento do PIB cresceu 4,6% frente a 2020. A decomposição desse crescimento reflete principalmente a retomada dos serviços, que apresentou recuperação de 4,7% em 2021, mas também da indústria, que cresceu 4,5% frente a 2021. Surpreendeu negativamente a agropecuária, decaindo 0,2% frente a 2020, em virtude do fraco desempenho de algumas culturas de lavoura (cana de açúcar, milho e café) e da pecuária (bovinos e leite), impactadas pelas condições climáticas adversas.

Pelo lado da demanda, chama a atenção o peso de investimento de 19,2% do PIB, acima da taxa observada em 2020 (16,6% do PIB) e, também, da taxa média observada no período 2016-2019 (15,2% do PIB). Apesar de bons números de crescimento e da clareza quanto ao impacto negativo da guerra sobre a atividade econômica no Brasil, existe grande incerteza sobre o crescimento brasileiro.

De fato, a recente dispersão das projeções da taxa de crescimento da atividade econômica ao longo da pandemia ilustra o desafio corrente, antes mesmo do conflito geopolítico. Assim, em se tratando de outro choque negativo de oferta, subsequente ao vivenciado na Covid-19, atribuímos risco baixista para a nossa projeção de crescimento de 0,5% ao ano em 2022. Os preços ainda pressionados reforçam a nossa estimativa de um novo pico de inflação de 12 meses em abril, atingindo 10,85%. A partir daí, esperamos desinflação, chegando a 6% ao ano em dezembro, podendo chegar a 6,5%, se o patamar de preços corrente for um choque persistente.

Essa inflação torna-se ainda mais desafiadora para o Banco Central do Brasil, se o governo ou o Congresso Nacional responder a um provável prolongamento da guerra com mais desequilíbrio fiscal, com medidas de impacto desinflacionário temporário (fora do teto dos gastos públicos) e, portanto, com efeitos na desancoragem das expectativas de inflação dos anos com maior peso no horizonte relevante da política monetária.

A responsabilidade fiscal é fundamental para a continuação da recente valorização do real. Esta poderá ajudar a compensar os efeitos negativos advindos da guerra no leste europeu. Não será com mais desequilíbrio fiscal que o poder de compra dos mais pobres será recuperado.

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