Eduardo Guardia, ministro da Fazenda de Temer, morre aos 56 anos

Economista defendeu teto de gastos e foi desafiado pela greve dos caminhoneiros

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São Paulo

O economista Eduardo Refinetti Guardia morreu nesta segunda-feira (11), aos 56 anos. Ele vinha fazendo tratamento contra um câncer.

Ministro da Fazenda no governo Michel Temer (MDB) entre abril e dezembro de 2018, ocupou o posto após Henrique Meirelles deixar o comando da pasta para disputar as eleições presidenciais.

Guardia também foi secretário-executivo da Fazenda de 2016 a 2018, ainda na gestão Temer, e do Tesouro Nacional em 2002, durante a presidência de Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Paulistano, exerceu o cargo de secretário de Fazenda do Estado de São Paulo, entre 2003 e 2006, sob o comando do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB).

O ex-ministro da Fazenda, Eduardo Guardia
O ex-ministro da Fazenda, Eduardo Guardia - Zanone Fraissat - 2.jul.2017/Folhapress

Doutor em economia pela Faculdade de Economia e Administração da USP (Universidade de São Paulo), defendia a disciplina nos gastos públicos para a retomada do crescimento sustentável diante da ausência de reformas econômicas estruturais, que ele também apontava como necessárias.

Deixou como um dos principais legados da equipe econômica da qual participou, na gestão Temer, a aprovação do teto dos gastos, regra que limita as despesas dos órgãos federais. ​

Participou da construção da proposta de reforma da Previdência que, apesar de suspensa por falta de apoio no Congresso em 2018, antecipou o debate sobre pontos que viriam a ser aprovados no ano seguinte pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (PL). A criação da idade mínima para acesso às aposentadorias era uma das bases do projeto.

Era reconhecido no meio político como competente e sério. A fama de negociador duro e avesso aos debates sem respaldo técnico, porém, era apontada como obstáculo para negociar com o Congresso. Ganhou o apelido de "Sr. Não".

Em artigo publicado nesta Folha em dezembro de 2020, chamou a atenção para a necessidade de manutenção do teto de gastos para a continuidade de um ajuste fiscal gradual.

Meses depois, no segundo semestre de 2021, os argumentos do economista viriam a ser reforçados pelas turbulências nos mercados geradas pelo intenso debate político sobre o afrouxamento da âncora fiscal.

Um dos desafios de sua gestão à frente da Fazenda foi a greve dos caminhoneiros. Semanas após ter assumido a pasta com a missão de dar continuidade ao ajuste dos gastos públicos e à agenda de reformas iniciadas por Meirelles, Guardia precisou lidar com a mobilização da categoria, que paralisou o país por duas semanas em maio de 2018.

Os acordos para dissolução da greve, motivada pelos aumentos no preço do combustível, representaram "enorme custo fiscal", disse, em entrevista ao instituto de pesquisas em políticas econômicas Casa das Garças.

O desgaste provocado pela crise ao governo foi um dos principais obstáculos para que o então ministro levasse adiante seu plano de fortalecer o mercado de capitais e atrair investimentos nos poucos meses que restavam até o fim do governo.

Em fevereiro de 2019, o banco BTG Pactual anunciou que o ex-ministro passaria a ser sócio e presidente-executivo de sua gestora de investimentos BTG Pactual Asset Management.

Guardia assumiu o posto em 1º de julho, após cumprir quarentena de seis meses exigida para que gestores federais possam assumir postos com potenciais conflitos de interesse com suas posições no governo.

Mesclou ao longo da carreira experiências nos setores público e privado. Presidiu o conselho do Banco do Brasil. Foi diretor-executivo da BM&F Bovespa (atual B3) e diretor financeiro e de relações com Investidores da gestora GP Investments.

Atuou também como membro dos conselhos de diversas companhias brasileiras, como Vale, DrogaRaia, Cosipa, Cesp, CTEEP e Sabesp.

Ministério da Economia e presidente do BC lamentam morte

O Ministério da Economia divulgou uma nota dizendo ter recebido com pesar e tristeza a notícia. "Durante sua trajetória pública, a atuação de Guardia foi fundamental na construção de soluções importantes para a economia brasileira", afirma a pasta.

"O ex-ministro sempre se notabilizou pelo trabalho incansável, a gentileza no trato e o permanente espírito público, inspirando todas as equipes que liderou", diz a nota.

De acordo com a pasta, o ministro Paulo Guedes (Economia) relembrou a capacidade de diálogo de Guardia, "que contribuiu de forma relevante para a troca de informações institucionais no período de transição de governo".

"Neste momento de dor, o ministro Guedes e os servidores do Ministério da Economia manifestam respeito e solidariedade aos familiares e amigos", afirma a pasta.

Em nota, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, diz lamentar "profundamente" a morte do economista.

"Com 56 anos, Guardia acumulou vasta experiência nos setores público e privado, onde pode desempenhar suas funções com excelência e espírito de equipe", afirma.

Campos Neto diz também que, durante a transição entre os governos Temer e Bolsonaro, Guardia "sempre agiu com um viés construtivo, dando uma contribuição decisiva para o bom desempenho da máquina governamental num período de mudanças."

"O presidente do Banco Central estende suas condolências aos familiares, amigos e aos colegas feitos durante sua brilhante trajetória profissional", finaliza.

O grupo BTG Pactual divulgou nota na tarde desta segunda-feira lamentando a morte de Guardia, que desde de julho de 2019 ocupava o cargo de CEO da BTG Pactual Asset Management.

"Foi um exemplo ímpar de homem público, unanimemente admirado por sua integridade, dedicação e competência", diz a nota.

"Foi, também, um exemplo na vida privada e empresarial. Amigo leal e solidário, sócio dinâmico e comprometido com nosso propósito, seguro nas suas posições, mas sempre construtivo e respeitoso com as opiniões alheias", afirma o texto, que também o descreveu como um brasileiro que "ajudou na construção de uma sociedade mais justa e de um Brasil com mais oportunidades para as futuras gerações".

A equipe do BTG ainda manifestou "profunda tristeza" e solidariedade aos "amigos e familiares, em especial a sua esposa, sua mãe e suas irmãs".

O presidente da Febraban (federação dos bancos), Isaac Sidney, afirmou em nota que "o Brasil perde precocemente um dos seus principais economistas, ainda com muitas contribuições a dar a nossa sociedade".

Para Sidney, Guardia deixa como legado "a defesa da disciplina nos gastos públicos como fator fundamental para o crescimento sustentável".

Também em nota, a B3 afirmou que "se despede de um líder que instilou os melhores valores, que foi exemplo e nos ajudou a construir a empresa que somos".

"Nosso país se despede de um homem público que trabalhou e acreditou sempre, em diferentes momentos de sua vida, que nosso papel como cidadãos é tomar as decisões que fazem o Brasil melhor. Eduardo Guardia fará falta."

A Anbima (Associação Brasileira das Entidades do Mercado Financeiro e de Capitais) afirmou, em nota, que o economista "contribuiu de maneira significativa para o desenvolvimento do mercado de capitais, sempre reiterou a importância da Anbima e do nosso setor para o desenvolvimento da economia brasileira".

"Ao longo dos últimos três anos, em que ocupou o cargo de CEO da BTG Asset, tivemos a honra de conviver e testemunhar o companheirismo e profissionalismo dele. O empenho e a dedicação de Guardia são motivos de admiração e nos inspiram a continuar lutando pelo fortalecimento dos nossos mercados", complementou.

Nomes do mercado financeiro também lamentaram a morte do economista. Reinaldo Le Grazie, CEO da Panamby Capital e ex-diretor do BC, classificou Guardia como um "amigo sério e divertido, que só responde aos 'zapps' à noite, mas sempre à disposição para discutir os assuntos difíceis". Para Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria, o economista "deixa uma lacuna difícil de ser preenchida".

"O Eduardo Guardia foi pessoa fundamental em vários momentos da vida econômica brasileira, um grande cara e um amigo maravilhoso", escreveu Luiz Fernando Figueiredo, CEO da Mauá Capital e ex-diretor do BC.

"Uma perda gigantesca à família, aos colegas de trabalho e demais economistas que tinham nele uma fonte de conhecimento inestimável", disse André Perfeito, economista-chefe da Necton.

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