Inflação assombra trabalhadores na volta ao escritório

Transporte diário, almoço fora e cafezinho custam muito mais agora que antes da pandemia

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Emma Goldberg
Nova York | The New York Times

Enquanto a empresa de software de segurança KnowBe4 avaliava se deveria exigir um retorno ao escritório, os executivos sabiam que haveria uma série de preocupações dos funcionários. Menos flexibilidade. Mais tempo no trânsito.

Então, nos últimos meses, surgiu um novo conjunto de preocupações com essa volta: o aumento do custo da gasolina e dos alimentos, especialmente perto da sede da empresa em Clearwater, na Flórida, uma das áreas dos Estados Unidos mais afetadas pela inflação.

Os trabalhadores trocavam dicas no sistema interno de mensagens sobre onde encontrar gasolina mais barata. A empresa tentou facilitar a transição oferecendo lanches grátis (picles, Nutella). Mas alguns funcionários, em parte desanimados pelas despesas da volta ao escritório, incluindo babás para cães e creches, disseram a seus gerentes que preferiam continuar trabalhando em casa. Em janeiro, a KnowBe4 informou seus cerca de 1.500 funcionários que a maioria poderia permanecer remota indefinidamente.

The offices of the security software company KnowBe4 in Clearwater, Fla., April 19, 2022. The cost of a daily work routine Ñ travel, coffee, food Ñ is far pricier than it was when offices shut down two years ago. In January, KnowBe4 informed its roughly 1,500 employees that most could stay remote indefinitely. (Todd Anderson/The New York Times)
Escritórios da KnowBe4, em Clearwater, na Florida. A companhia está deixando vários funcionários permanecerem no trabalho remoto indefinidamente - Todd Anderson - 19.abr.2022/NYT

"Se os empregadores disserem 'Ei, sim, você precisa vir ao escritório, gastar esse dinheiro em gasolina, comer no escritório', as pessoas vão dizer: 'Isso é muito caro'", disse Erika Lance, chefe de recursos humanos da empresa.

Os planos dos empregadores de retorno ao escritório, já sobrecarregados por preocupações com a disseminação do coronavírus e as exigências de uma força de trabalho empoderada, agora estão colidindo com as pressões da inflação. O custo de uma rotina diária —transporte, café, alimentação— é muito maior do que quando os escritórios fecharam, dois anos atrás. Os preços ao consumidor estavam 8,5% mais altos no mês passado do que um ano atrás —a taxa de inflação mais rápida em 12 meses desde 1981. Embora a ocupação de escritórios tenha atingido seu nível mais alto desde março de 2020, acima de 40%, alguns trabalhadores experimentaram o choque do retorno ao escritório.

"É uma tempestade perfeita", disse Becky Frankiewicz, presidente americana da ManpowerGroup, agência global de recrutamento com mais de 4.500 escritórios. "Estamos prontos para voltar ao trabalho, mas você pode se dar esse luxo?"

Os preços médios da gasolina nos Estados Unidos atingiram US$ 4,33 o galão (3,78 litros) no mês passado, em comparação com cerca de US$ 2,60 em 2019, segundo a AAA. A salada Sweetgreen que agora custa US$ 11,95 podia custar US$ 11,20 no ano passado. Um sanduíche Potbelly, hoje por US$ 7,65, já custou US$ 7,20. Um latte gelado no Dunkin' pode custar US$ 3,99, contra os antigos US$ 3,70. E com o mercado de trabalho ainda apertado os empregadores estão recebendo ligações de trabalhadores pedindo mais flexibilidade ou aumentos.

A escassez de talentos aumentou os salários, mas não o suficiente para acompanhar a inflação; os salários cresceram 5,6% no ano passado. Alguns empregadores disseram que planejavam dar aumentos, reconhecendo que seus funcionários poderiam ser facilmente roubados por outras firmas. A OrderMyGear, por exemplo, plataforma de comércio eletrônico com sede em Dallas, outra cidade fortemente atingida pela inflação, recentemente triplicou o orçamento que havia alocado para aumentos de remuneração em anos anteriores. Outras empresas disseram que ainda não ajustaram os salários porque esperam para ver se a inflação esfriou.

Mas para as empresas que pedem que seus funcionários abram mão da flexibilidade do trabalho remoto a pressão para aumentar os salários aumentou.

"O trabalho remoto começou como uma medida de segurança", disse Frankiewicz. "Agora é uma medida de contenção de custos."

Ela observou que alguns trabalhadores que sua empresa havia contratado agora procuram tempos de deslocamento curtos para administrar os custos, e algumas empresas estão oferecendo cartões de combustível, vales-transporte ou opções de carona. O ManpowerGroup recebeu cinco vezes mais comentários de funcionários dizendo que os custos crescentes estão afetando onde e se eles trabalhariam como no mesmo período do ano passado.

"Era: 'Eu não quero fazer o trajeto'", continuou Frankiewicz. "Agora é: 'Eu não posso pagar o transporte'."

The offices of the security software company KnowBe4 in Clearwater, Fla., April 19, 2022. The cost of a daily work routine Ñ travel, coffee, food Ñ is far pricier than it was when offices shut down two years ago. In January, KnowBe4 informed its roughly 1,500 employees that most could stay remote indefinitely. (Todd Anderson/The New York Times)
Erika Lance, chefe de recursos humanos da KnowBe4, diz que os funcionários sentiram o impacto da inflação - Todd Anderson - 19.abr.2022/NYT

As empresas estão tentando evitar as forças conflitantes da inflação e as despesas de retorno ao escritório com tentativas de tornar o transporte e a alimentação mais acessíveis. O Departamento de Estatísticas do Trabalho observou em seu recente Índice de Preços ao Consumidor que o preço da alimentação nos locais de trabalho havia caído mesmo com o aumento geral dos preços das refeições, provavelmente um sinal de "amplos programas de almoço grátis" nas empresas.

Veja a OrderMyGear, em Dallas, que recentemente disse a seus 165 funcionários que até junho muitos deveriam começar a trabalhar no escritório, pelo menos em meio período. Jaclyn Unruh, chefe de gabinete, lembrou aos funcionários que a empresa oferecia passes gratuitos para o transporte público, que cerca de 10% deles utilizam, além de estacionamento gratuito e refeições duas ou três vezes por semana.

Chris Harris, 53, que gerencia uma equipe numa empresa de publicidade em Portland, no Oregon que incentivou, mas não exigiu, o retorno ao local de trabalho, garante aos membros de sua equipe que ela entende a angústia deles com as despesas de uma rotina de escritório. Recentemente, ela saiu para almoçar e pagou US$ 12,50 por uma rosca salgada. Ela fez uma careta ao se lembrar dos almoços pré-Covid, quando podia gastar US$ 5 em uma cafeteria com desconto que fechou durante a pandemia.

Em uma recente função de trabalho, Harris se viu recebendo reclamações de um colega sobre o custo diário da volta ao escritório: "Ele dizia: 'Puxa, entre estacionamento, gasolina e almoço, estou pagando US$ 70 para ir trabalhar'", lembrou ela. "A coisa piora quando você esteve economizando isso durante dois anos."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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