O ministro Paulo Guedes (Economia) chega à reta final do mandato de Jair Bolsonaro (PL) com mais poder. Após uma sucessão de derrotas e vitórias na tentativa de executar uma agenda liberal, ele tem ampliado sua influência no governo se equilibrando entre o que prega sua cartilha e o esforço para atender às vontades do chefe.
A escolha de dois membros de sua equipe para o comando de um tema estratégico em 2022 como o dos combustíveis resume o cenário. Adolfo Sachsida foi para o Ministério de Minas e Energia e Caio Mario Paes de Andrade foi indicado para o comando da Petrobras.
Nomes de confiança da equipe do ministro, ambos compunham o time de primeira linha de Guedes —Paes de Andrade é o atual secretário especial de Desburocratização da pasta, enquanto Sachsida desempenhou os cargos de secretário de Política Econômica e de assessor especial.
A posição de Guedes hoje –comandando um ministério e com influência direta em outro– é vista por integrantes do governo ouvidos pela Folha como uma demonstração de confiança do presidente. Em meio a uma disputa eleitoral histórica, o país passa por um momento desafiador para controlar a inflação, gerar emprego e garantir crescimento.
A volta de Guedes à condição de "superministro" contrasta com episódios anteriores. O ministro beijou a lona várias vezes desde que assumiu o posto com a promessa de fazer uma revolução na política econômica.
O economista da Escola de Chicago obteve diferentes conquistas, mas as perdas soaram mais estridentes em diversos momentos, com sua saída sendo aventada em várias ocasiões –inclusive por ele próprio.
Entre essas derrotas, está o enterro de um imposto nos moldes da antiga CPMF (ideia defendida até hoje pelo ministro), o "cartão vermelho" com que Bolsonaro o ameaçou indiretamente caso surgissem ideias como a do congelamento de aposentadorias, uma debandada em sua equipe diante das contradições do governo com o discurso liberal e a perda de influência sobre a Petrobras em 2021.
O acúmulo desses episódios fez o ministro deixar parte de suas convicções de lado para continuar ao lado do presidente.
Em outubro do ano passado, ele chegou a aceitar mudanças nas regras fiscais para encaixar no Orçamento um pagamento mensal de R$ 400 do Auxílio Brasil –uma exigência de Bolsonaro diante da proximidade das eleições.
Para executar o plano, o chefe da Economia colocou em prática uma megaoperação que demandou uma emenda à Constituição para driblar o teto de gastos –regra defendida por sua parte até então. A medida gerou revolta em sua equipe, que sofreu uma debandada.
"[É] perfeitamente compreensível. Espero que os mercados compreendam isso ao invés de ter uma posição um pouco mais infantil de que ‘o símbolo é o teto’, ‘o teto ou a morte’, disse o ministro em novembro para justificar a iniciativa.
Neste ano, novos flertes com medidas inusuais diante da proximidade eleitoral. Embora defenda a liberdade de preço da Petrobras, o Ministério da Economia reservadamente entende que o momento atual é de exceção e que medidas podem ser adotadas para conter a volatilidade nas bombas.
A visão é compartilhada por diferentes integrantes da equipe econômica e catapultou dois assessores de Guedes ao comando das decisões sobre combustíveis. Sachsida, por exemplo, foi escolhido por Bolsonaro após apresentar sugestões de mudanças sobre os preços diretamente ao presidente –com aval do ministro.
Há várias medidas em estudo, conforme mostrou a Folha, como uma proposta para estabelecer faixas para o preço internacional do petróleo –sendo que, caso o preço do barril varie dentro dos valores delimitados, a empresa não poderia fazer reajustes. Outra sugestão é criar um intervalo mínimo de 100 dias para os reajustes.
Seja qual for a opção escolhida, o governo dá indicações frequentes nos bastidores de que quer evitar os reajustes da Petrobras em um momento delicado da corrida eleitoral –em que Bolsonaro sofre desgaste pela inflação enquanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) amplia a liderança nas pesquisas.
Na visão de integrantes do governo seria, inclusive, mais vantajoso para os acionistas da Petrobras se a empresa segurasse os preços agora e arcasse com algum prejuízo do que permitir a volta de Lula. Dentro desse entendimento, uma nova gestão petista acabaria com a empresa a partir de 2023.
Na última semana, assessores da Economia brincaram que fariam um "War" da Esplanada, em referência ao jogo de tabuleiro no qual os jogadores precisam avançar sobre territórios. A ideia é mostrar como Guedes conseguiu progredir, sendo sua pasta comparada inclusive a uma escola de formação de ministros.
O ministro tem sido vitorioso, até agora, em segurar a pressão de setores do governo e do Legislativo por ideias mais drásticas –como a criação de subsídios para conter a alta do preço do diesel e da gasolina.
A pressão continua entre ministros da área política, com queixas de que as decisões a respeito do tema estão agora muito concentradas na mesa de Guedes. Paes de Andrade, oriundo da equipe de Guedes, chegou a ser refutado por nomes como Arthur Lira (PP-AL) –que havia defendido alguém com mais experiência no setor da primeira vez que ele havia sido cotado para o cargo.
Mas tem falado mais alto a percepção no governo, e principalmente de Bolsonaro, de que a economia será fator determinante na disputa presidencial. Isso tem levado o presidente a ouvir mais a área econômica e a circunscrever assuntos à pasta de Guedes.
Na ala política, o fortalecimento do ministro tem sido interpretado como um reequilíbrio de forças, dado o aumento crescente da influência do centrão nas decisões do governo desde que Bolsonaro se associou ao agrupamento de legendas em 2020.
Nesse sentido, o movimento para desidratar o centrão tem sido impulsionado por militares que orbitam o gabinete de Jair Bolsonaro. Eles passaram a considerar mais os posicionamentos de Guedes e sua equipe em detrimento das demandas da ala política.
Segundo assessores do Planalto, Guedes também tem deixado de olhar para trás –já que fracassou em suas promessas ousadas de privatização, abertura econômica e reformas estruturais– e passou a focar planos para um eventual segundo mandato de Bolsonaro.
Esses assessores citam, por exemplo, a ideia do ministro de criar um fundo com recursos das privatizações para atuar na redução da desigualdade. O ministro vê nisso, inclusive, um argumento matador contra as acusações do PT de que ele quer entregar recursos públicos para a iniciativa privada –agora, seria para combater a pobreza (em vez de ficar nas mãos de partidos).
Após diversos ministros adversários saírem do governo para buscar trajetórias solo em candidaturas regionais, Guedes chega ao final do mandato de Jair Bolsonaro com a chance de controlar mais do que nunca a área econômica.
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