Entenda a proposta de regulamentação de criptoativos que vai para a Câmara

Texto endurece penas para fraudes e dá isenção fiscal para 'mineração verde'

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São Paulo

Na berlinda em todo o mundo por causa da onda de pânico na semana passada, no Brasil a regulamentação das criptomoedas é tema de um projeto de lei aprovado pelo Senado no final de abril.

A expectativa é que o texto, que precisa passar pela Câmara dos Deputados, seja sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) ainda no primeiro semestre.

Em meio a diversos escândalos envolvendo crimes financeiros com criptomoedas no Brasil, o texto altera o Código Penal, que passa a considerar fraudes do tipo um caso de estelionato.

O projeto versa ainda sobre a obrigação das empresas do setor com a prestação de contas ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e com a proteção de dados dos clientes. Entenda os principais pontos abaixo.

Caixa de bitcoins em Miami, na Flórida - Marco Bello - 6.abr.2022/Reuters

Ativo virtual

O projeto considera ativos virtuais "a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para realização de pagamentos ou com propósito de investimento".

O mais famoso dos criptoativos, o bitcoin, é uma moeda virtual que funciona por meio da blockchain, uma tecnologia que usa milhares de computadores ao redor do mundo para registrar transações. Os registros são praticamente invioláveis, o que garante a veracidade do valor que cada entusiasta tem na sua carteira digital. O processo é o mesmo para todas as grandes criptomoedas que circulam no mercado.

Endurecimento de penas

À medida que o investimento em bitcoins e outros criptoativos cresce, aumenta também o número de ações da Polícia Federal para combater crimes praticados por meio desse tipo de ativo financeiro.

Se a lei for aprovada, fraudes com criptomoedas serão um caso de estelionato com pena de dois a seis anos de prisão e multa. Além disso, crimes de lavagem ou ocultação de bens, com penas de 3 a 10 anos, poderão ser aumentadas em um terço a dois terços se o crime for cometido de forma reiterada, por intermédio de organização criminosa ou por meio da utilização de ativo virtual.

Fraudes recordes

Casos de golpes levam BC a preparar regulação para criptomoedas

  1. Maio de 2020

    Polícia de SP investiga golpe com bitcoins sobre investidores que usaram a FX Trading Corporation. Prejuízo: R$ 1 bilhão.

  2. Março de 2021

    Detentora de cerca de 15 mil bitcoins de mais de 200 mil clientes no mundo, a Atlas Quantum negociava contratos de investimento coletivo sem autorização, segundo a CVM. Os clientes tentam sacar o dinheiro desde 2019. Prejuízo: R$ 4 bilhões.

  3. Julho de 2021

    Grupo de bitcoins criou ‘blockchain paralela’ para simular aplicações em bitcoins com recursos de clientes e se serviram de 'desconhecimento técnico' do Judiciário para apresentar em garantia uma carteira digital falsa e fraudar processo de recuperação judicial. Prejuízo: R$ 1,5 bilhão.

  4. Agosto de 2021

    PF deflagrou operação contra consultoria do chamado “faraó dos bitcoins”. A empresa é suspeita de operacionalizar um sistema de pirâmides financeiras com base na oferta pública de contrato de investimento, sem prévio registro em órgãos regulatórios. Prejuízo: ao menos R$ 20 milhões.

Mineração verde

O projeto prevê isenção tributária para a mineração verde. A isenção atinge a compra, importação ou industrialização de máquinas e softwares de quem utilizar 100% de sua necessidade de energia elétrica de fontes renováveis e neutralizar toda a sua emissão de gases de efeito estufa.

"É a primeira legislação que eu vi que junta o contexto ambiental, a questão tributária e uma moeda virtual", afirma Sabrina Lawder, líder de International Tax da Grant Thornton Brasil.

Embora ache o tema sensível pelo momento econômico que o país enfrenta, a advogada afirma que medidas assim são necessárias "para movimentar a economia".

A isenção não abarca a energia, uma demanda do setor. "É algo que nem se debate, infelizmente, porque a gente sabe que o Brasil tem um custo de energia altíssimo", afirma André Horta, fundador da corretora Bitcointoyou. "O empreendedor vai pensar duas vezes antes de minerar criptomoedas no Brasil. Aqui do lado nós temos o Paraguai, onde a energia é mais barata."

Segurança ao consumidor

As empresas deverão "controlar e manter de forma segregada os recursos aportados pelos clientes", segundo parâmetros a serem estabelecidos pelo órgão regulador que será indicado pelo Poder Executivo.

Isso significa que os recursos financeiros do consumidor devem ficam separados de qualquer patrimônio das gestoras de ativos virtuais —ou seja, caso a operadora vá a falência, a parte do consumidor estará resguardada.

O texto sustenta ainda que as empresas devem respeitar a "segurança da informação e a proteção de dados pessoais", em linhas gerais.

Regulação leve

A lei entrará em vigor 180 dias após a sua aprovação, quando as empresas que atuam com criptomoedas passarão a precisar de autorização de um órgão regulador para atuar. Até lá, elas devem apenas estar cadastradas no Coaf e ter um CNPJ.

O resultado do texto foi visto como adequado por Julien Dutra, diretor de relações governamentais do grupo 2TM, dono da Mercado Bitcoin. Ele atua também em associações do setor, como ABCripto e ABFitnechs.

"Quando se falar de tecnologia, a gente tem que pensar estrategicamente. Não dá para pesar na caneta porque o mercado ainda está se desenvolvendo, então é preciso deixar ele se desenvolver a partir de princípios", afirma ele, que compara o projeto de lei brasileiro com o decreto assinado pelo presidente americano Joe Biden no início de março.

Lá, a regulamentação também é abrangente e tenta atender grandes demandas, como competitividade, inovação e proteção ao consumidor.

"Nós, operadores, nos sentimos até mais confortáveis ao saber que a mensagem sobre segurança para o público do lado de lá do balcão vai estar clara", afirma.

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