Mercado já embute 6,5% de inflação nos juros de títulos prefixados

Projeção de alta de preços indica que BC perdeu ancoragem de médio e longo prazo

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São Paulo

Com a nova alta da taxa Selic promovida na semana passada pelo BC (Banco Central), para 13,25% ao ano, os investimentos na classe da renda fixa ganham ainda mais atratividade.

Não é somente o aumento no nível da taxa básica de juros, contudo, que tem contribuído para os rendimentos cada vez mais generosos aos investidores na renda fixa.

A inflação corrente em patamares elevados, e a expectativa do mercado de que ela seguirá pressionada ainda por algum tempo, também pesam a favor das taxas de juros de dois dígitos oferecidos pelos títulos públicos prefixados.

Placa mostra preço de produto em supermercado paulista; disparada da inflação pesa no bolso de consumidores e entra na conta de investidores - Zanone Fraissat/Folhapress

Na plataforma digital Tesouro Direto, em que o governo oferece aos investidores pessoa física a negociação de títulos públicos, os papéis prefixados com vencimento para 2025 ofereciam nesta segunda-feira (20) uma taxa de remuneração nominal de 12,58%. No caso dos títulos para 2029, a remuneração subia para 12,69%, e para 12,81%, entre aqueles com prazo em 2033.

Segundo Felipe Beckel, estrategista-chefe de renda fixa da corretora Necton, está embutida nas taxas dos títulos a inflação que os agentes de mercado projetam para os próximos anos.

Beckel diz que essa inflação implícita, de acordo com o jargão de mercado, está hoje em torno de 6,5% para 2023, chegando a níveis até um pouco mais altos, próximos de 6,7%, para os vértices mais longos, de 2025 em diante.

"A inflação implícita nos títulos mostra claramente que o BC perdeu a ancoragem das expectativas de inflação não somente para este ano e o ano que vem, mas para o médio e longo prazo também", diz o estrategista-chefe de renda fixa da Necton.

"Não me lembro de ter visto nos últimos dez anos a inflação implícita tão elevada a médio e longo prazo no mercado local", acrescenta Beckel, lembrando ainda que, ao longo da semana passada, em dias de aumento do nervosismo dos investidores, as taxas da inflação implícita chegaram a se aproximar de 7,7%.

Sócio fundador e gestor da SF2 Investimentos, Sergio Machado afirma que a inflação alta não apenas no Brasil, mas em diversos outros países, como nos Estados Unidos e em grandes economias da Europa, junto a uma série de incertezas no horizonte, com altas de juros nos mercados desenvolvidos, risco de recessão global, Guerra da Ucrânia e eleições no Brasil, contribuem para que a inflação implícita nos títulos esteja nos patamares atuais.

Isso porque, conforme aumentam as incertezas no radar dos investidores, tende a aumentar também o prêmio exigido pelo mercado na aquisição dos títulos, explica o especialista.

"Estamos tendo neste mês uma escalada das preocupações quanto ao comportamento da inflação futura", diz Machado.

O gestor da SF2 Investimentos afirma que o fato de o BC ter levado a taxa básica de juros para níveis insustentáveis de 2% ao ano em 2020, e, até mais do que isso, tê-la mantido em patamares tão baixos por um período relativamente longo, também tem dado sua contribuição para a desancoragem das expectativas de inflação pelos agentes de mercado.

"O BC baixou demais a taxa de juros, e depois teve que correr atrás da curva, como estão correndo os BCs do mundo inteiro. Isso gera uma instabilidade muito grande", afirma Machado, acrescentando que a eleição no Brasil extremamente polarizada também começou a entrar na conta dos analistas nas últimas semanas, colocando uma pressão adicional em um cenário já bastante turbulento.

Operador da equipe de gestão da MAG Investimentos, Ricardo Jorge lembra ainda que, nos últimos comunicados do BC divulgados ao final das reuniões do Copom (Comitê de Política Monetária), a autoridade indicou que os aumentos promovidos na taxa Selic seriam suficientes para trazer a inflação para baixo de forma mais relevante.

E, ainda que uma série de fatores que fogem ao controle do BC tenha pesado para que a inflação siga pressionada, o fato é que a credibilidade da autoridade monetária acaba sendo prejudicada, implicando no nível elevado da inflação projetada pelo mercado, diz o especialista.

Gestores preveem retornos destacados dos prefixados nos próximos meses

Beckel, da Necton, calcula que uma inflação implícita ao redor de 5% a 5,5% seria um nível mais condizente com o cenário macroeconômico esperado à frente, sob uma perspectiva de médio e longo prazo. E, até por conta dessa distorção vigente no mercado, o estrategista-chefe de renda fixa da Necton avalia que há neste momento uma boa oportunidade para o investidor tirar proveito das taxas polpudas oferecidas pelos títulos prefixados.

Estrategista-chefe da Renascença DTVM, Sergio Goldenstein também avalia que os títulos prefixados tendem a apresentar um desempenho melhor do que os pares durante os próximos meses. "Como a inflação implícita está muito alta, a perspectiva é que daqui para frente as taxas prefixadas tenham um rendimento melhor que as das taxas de juros reais das NTN-Bs", diz o especialista.

O estrategista-chefe da Renascença diz ainda que, em momentos nos quais a inflação corrente está muito alta, como agora, é comum que o mercado de forma geral extrapole a perspectiva de que ela seguirá em patamares bastante elevados por um longo período.

Ele nota que a inflação implícita em torno de 6,5% a 6,7% ao longo dos vértices da curva prefixada de juros está bem acima da meta de inflação do BC, e que a tendência é de alguma acomodação dessas taxas um pouco mais à frente. Goldenstein estima que uma inflação implícita mais próxima de 4,5% seria um nível considerado mais equilibrado sob uma ótica de médio e longo prazo.

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