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Relatório afrouxa controle sobre investimentos em criptomoedas

Exigências mais brandas contrariam BC, que tenta fechar portas para fraudes

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Brasília

O projeto de lei que pretende impor regras ao mercado de criptoativos corre o risco de ser esvaziado caso a versão apresentada pelo relator, deputado Expedito Netto (PSD-RO), seja aprovada pela Câmara nos próximos dias.

O parlamentar retirou dois pilares do projeto defendidos pelo Banco Central e que tinham sido aprovados pelo Senado na tentativa de barrar o uso das criptos para lavagem de dinheiro e fraudes, principalmente por meio de moedas como o bitcoin e o ethereum.

A Folha teve acesso à minuta do projeto de lei corrigido pela Subchefia de Análise Governamental, da Casa Civil, e ao relatório do deputado apresentado na terça-feira (21) às lideranças.

Ambas as versões são similares. O parlamentar, no entanto, não respondeu aos questionamentos da reportagem.

Representação das criptomoedas tether, citcoin e ethereum em frente a gráfico de negociações - AFP

Como ainda não foi apresentada na Câmara para que seja distribuída antes da votação, a minuta do projeto de lei ainda pode sofrer alterações.

A primeira modificação se refere à flexibilização da exigência de separação entre os ativos da corretora e as aplicações dos clientes. Esse tipo de regra é comum no mercado financeiro, e tem como objetivo garantir que, em casos de falência da empresa, seja possível transferir os recursos aplicados pelos clientes a outra corretora similar ou devolvê-lo para o investidor.

Para algumas empresas de criptomoedas, no entanto, a regra aprovada pelo Senado tratava os ativos digitais como recurso financeiro, o que elas avaliavam como incorreto porque, nessa plataforma de negociação, o ativo não fica na corretora. Ela só serve de plataforma de compra e venda. Os títulos (códigos protegidos) ficam com os negociadores.

Já outras empresas, como a brasileira Mercado Bitcoin, se posicionaram a favor desta cláusula. A gigante Binance, maior corretora do mundo e que concentra mais da metade do mercado brasileiro, pediu mudanças na regra, considerada ampla demais.

Para ela, não seria possível considerar os ativos digitais como recursos a serem segregados, já que não ficam no caixa da empresa. Seria diferente da operação de uma corretora tradicional, que efetivamente lida com o dinheiro dos clientes. Mesmo assim, não se opôs, segundo relatos de parlamentares.

Ao final, o relator do projeto de lei optou por descartar a obrigação de segregar os ativos digitais. Apesar disso, segundo empresas consultadas sob anonimato, o texto final ainda pode trazer surpresas.

Além disso, o deputado decidiu desobrigar as empresas a informarem todo tipo de transação acima de R$ 10 mil ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), exigência feita no Senado para que esse setor opere com as mesmas regras do mercado financeiro tradicional.

Nesse caso, as empresas continuariam com a obrigação definida pela Receita Federal de informar apenas operações superiores a R$ 35 mil.

Ambas as medidas eram as mais aguardadas pelo BC, segundo pessoas que participam das discussões.

Além disso, o deputado acatou pedido de gigantes do setor para que, uma vez aprovada, a nova lei só entre em vigor após seis meses. A versão aprovada pelo Senado previa aplicação imediata.

Empresas de menor porte afirmam que esse prazo dará mais tempo ainda para que companhias, algumas envolvidas em investigações policiais, continuem operando sem regras.

No Banco Central houve revés de expectativas. A ideia era ter uma legislação rigorosa para criminalizar a prática de golpes e fraudes envolvendo criptoativos.

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Sede do Banco Central do Brasil, em Brasília - Sergio Lima/Folhapress

O BC começou a ouvir as empresas, como as gigantes estrangeiras Binance, Coinbase, Bitso, e a brasileira Mercado Bitcoin, há alguns meses já contando que as diretrizes da lei —previamente negociadas com as duas Casas— fossem mantidas.

Juntos, os recursos movimentados no país por essas corretoras de criptos já representam mais de "meia Bolsa", cerca de R$ 300 bilhões, segundo dados do BC de dezembro do ano passado.

Nesse período, as operações de renda variável feitas na B3 (ações, fundos, BDRs e ETFs) totalizaram cerca de R$ 600 bilhões, segundo dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) reunidos pelo BC.

A quantia movimentada pelas aplicações digitais já representa 27% dos recursos hoje depositados na caderneta de poupança.

O crescimento exponencial desse mercado nos últimos três anos, sem qualquer tipo de regulação e controle, disparou o temor do BC e da Receita para evasão de divisas e lavagem de dinheiro.

Em julho de 2021, por exemplo, a Polícia Federal deflagrou a Operação Daemon, que mirou Cláudio José de Oliveira. Ele teria desviado R$ 1,5 bilhão de 7.000 clientes, segundo dados do Coaf e da PF.

Um mês depois, a operação Kryptos avançou sobre o esquema de fraude com pirâmide financeira capitaneado pelo empresário Glaidson Acácio dos Santos, conhecido como "faraó do bitcoin" e que acumulou mais de 67 mil clientes em quase cinco anos de operação.

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