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Congresso promulgou PEC ignorando críticas de consultoria

Nota técnica diz que texto cria privilégio desproporcional e afeta isonomia eleitoral

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Brasília

O Congresso promulgou a proposta que turbina benefícios sociais às vésperas das eleições ignorando críticas da Consultoria de Orçamento da Câmara, que vê no texto a criação de privilégios e dispensas de obrigações desproporcionais se considerado o cenário atual. Além disso, os técnicos consideram que a isonomia no processo eleitoral fica comprometida.

A PEC (proposta de emenda à Constituição) que dá aval ao pagamento de novos benefícios à população contém sete medidas. Entre elas, ampliação do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 até o fim do ano, duplicação do Auxílio Gás para cerca de R$ 120 e a criação de um vale de R$ 1.000 para caminhoneiros.

Além disso, o texto prevê um auxílio para taxistas, repasse de recursos para evitar aumento de preços no transporte público, subsídios para o etanol e reforço de verba no programa de aquisição e doação de alimentos. O custo total é estimado em R$ 41,25 bilhões.

Promulgação da PEC dos bilhões, realizada no Senado Federal - Gabriela Biló - 14.jul.2022/Folhapress

A criação de novos programas é vedada pela legislação eleitoral neste ano, mas a PEC buscou contornar essa restrição usando, inclusive, o reconhecimento de um estado de emergência no país em decorrência do maior preço do petróleo.

Para os técnicos, as flutuações de preços de commodities (em especial do petróleo) e da taxa de inflação não são o suficiente para o reconhecimento de um estado de emergência.

Uma situação justificável seria vista, por exemplo, em cenários de eventos climáticos extremos ou uma pandemia que inviabilizasse o funcionamento dos processos produtivos por um período considerável de tempo.

"Crises econômicas por si só seriam um argumento bem mais frágil, visto que recorrentes e muitas vezes reforçadas por ações inadequadas ou intempestivas dos próprios agentes públicos", afirma o texto. A consultoria publicou o documento no dia 12 de julho, um dia antes da aprovação do segundo turno na Câmara. ​

Os técnicos dizem ainda que há diferenças entre o estado de emergência e o de calamidade pública, sendo este mais grave e que já prevê certas flexibilizações nas contas públicas para a liberação de recursos (dispensando, por exemplo, o atingimento de metas fiscais e a adoção de medidas de compensação orçamentária).

A PEC promulgada reconhece o estado de emergência no país, mas criando as mesmas dispensas e privilégios que seriam previstas apenas em um estado de calamidade —o que, para a consultoria, não é razoável. "Abre-se mão de praticamente todo mecanismo de defesa fiscal de forma desproporcional à situação que se vislumbra", diz a nota técnica.

A nota acrescenta que a PEC, ao criar o estado de emergência no final do mandato, com novas despesas, parece inverter o sentido democrático da legislação protetora da isonomia eleitoral.

A nota técnica foi solicitada pela deputada Adriana Ventura (Novo-SP) e contempla subsídios acerca dos aspectos fiscais e orçamentários da PEC.

O documento aponta que a fragilização continuada de princípios fiscais talvez seja o aspecto mais preocupante da aprovação da PEC. Segundo o texto, regras fiscais servem para nortear o comportamento dos agentes políticos e refrear o desequilíbrio orçamentário.

A nota técnica pontua que o novo governo terá dificuldade de reduzir benefícios, mesmo aqueles com vigência apenas até dezembro deste ano, em particular as mudanças no Auxílio Brasil. Apesar de a PEC limitar o pagamento dos benefícios até dezembro, a entrada das novas famílias no programa será sentida também nos próximos exercícios.

"Excluído o pagamento do acréscimo extraordinário de R$ 200,00, cujo pagamento está limitado a 31.12.2022, estima-se que o impacto da entrada das 2,6 milhões de famílias no programa pode atingir o montante de R$ 12,5 bilhões em 2023", disse a nota.

A PEC é uma das apostas de Bolsonaro para tentar melhorar seu desempenho nas pesquisas de intenção de voto. Atualmente, ele aparece em segundo lugar, atrás do ex-presidente Lula.

A PEC teve a tramitação acelerada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), aliado de Bolsonaro. Em vez de seguir o rito regimental de ter a admissibilidade analisada pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) para, só então, ser encaminhado a uma comissão especial para análise do mérito, o texto foi apensado ao da PEC de biocombustíveis, que já tinha passado pela etapa inicial e estava em comissão especial.

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