PEC impulsiona ações de varejistas, mas analistas veem fôlego curto

Recuperação de ações do setor depende da queda dos juros

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São Paulo

O setor de varejo viu suas ações reagirem na Bolsa nos últimos dias com a movimentação em Brasília para a votação da PEC (proposta de emenda à Constituição) que autoriza o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) a empenhar mais de R$ 41 bilhões para ampliar e conceder benefícios a menos de três meses das eleições.

Apesar do ganho que a medida proporcionaria ao comércio, analistas avaliam que o fôlego seria curto e insuficiente para tirar do fundo as ações de consumo. Em vez disso, o setor corre o risco de ser ainda mais penalizado pela manutenção por mais tempo da taxa de juros em patamares elevados.

Consumidora observa geladeiras em loja na cidade de São Paulo
Consumidora observa geladeiras em loja na cidade de São Paulo - Danilo Verpa - 2.dez.2011/Folhapress

Enquanto a PEC avançou na semana passada na Câmara, as ações mais negociadas na Bolsa das varejistas Americanas, Magazine Luiza e Via dispararam, respectivamente, 25%, 20% e 29% até sexta-feira (8), um dia após a votação do texto no plenário ter sido adiada pelo presidente da Casa, Arthur Lira, para esta terça (12).

Nesse intervalo também houve ganho de 6% do Icon B3, índice que acompanha uma ampla relação de empresas ligadas ao consumo. O Ibovespa, referência para o mercado acionário, caminhou apenas 1,35%.

Apesar do efeito positivo, o movimento está longe de indicar recuperação, segundo Lucas Sharau, assessor de investimentos na iHUB.

"A PEC é o motivo que o setor precisava para dar esse respiro, mas o cenário macroeconômico deprecia o segmento com essa alta dos juros, que penaliza principalmente o varejo, que depende mais do crédito para ter uma alavancagem com o aumento do consumo", afirma.

Sharau ressalta que, no intervalo de um ano, as ações da Magazine Luiza afundaram 88%. "A ação caiu de mais de R$ 20 para quase R$ 2. Precisaria subir muito mais para voltar ao que era", diz. Os tombos em um ano de Americanas e Via foram de 75% e 84%, nessa ordem.

Para comparação, o índice do setor de consumo despencou 43% no mesmo intervalo, enquanto o Ibovespa caiu 20%.

É o descompasso entre o aumento de gastos do governo e a necessidade de combater a inflação um dos principais motivos de desconfiança do mercado neste momento, segundo Ramon Coser, sócio da Valor Investimentos.

"Assim como um avião, a economia tem dois motores: um deles é a política monetária, o outro é a política fiscal. Eles precisam estar alinhados. Nesse governo, um está acelerando e o outro está freando", compara.

"Qual é a política monetária neste momento? O Banco Central está subindo juros para segurar a inflação. Ela demora, mas faz efeito. Mas a política fiscal do governo é voltada para aquecer a economia e ele está fazendo isso transferindo renda. Uma impulsiona enquanto a outra freia. Isso não é positivo."

Prejudicial à economia em qualquer circunstância, o desacerto se torna mais preocupante diante da perspectiva de desaceleração da economia mundial nos próximos meses, segundo Nicola Tingas, economista-chefe da Acrefi (associação de empresas de crédito e financeiras).

O efeito temido é o aumento do dólar, devido à combinação de aversão a risco e queda das exportações de commodities, provocando mais inflação e obrigando o Tesouro a pagar juros ainda mais altos ao mesmo tempo em que a União precisaria lidar com uma queda na arrecadação.

"Mas o que tem dado alento neste momento para alguns segmentos da Bolsa, como o varejo, é a possibilidade do carregamento de uma bolha eleitoral que cria um ambiente melhor do que a realidade normal traria", afirma Tingas.

"A grande verdade é que quando acabarem os estímulos, quando tudo acabar, voltam os impostos sobre combustíveis, haverá mais inflação e risco fiscal em um mundo gerando um menor fluxo de dólares para o Brasil."

Menos pessimista, o economista Denis Medina, professor da FAC-SP (Faculdade do Comércio de São Paulo), considera que o efeito "concentrado no segundo semestre" não anula o aspecto positivo da PEC no apoio à recuperação econômica.

"Como esse dinheiro vai para as mãos das pessoas, isso vai cair diretamente no comércio. São mais de R$ 40 bilhões que não eram esperados. Esse é um ponto que precisa ser considerado."

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