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Número de famílias que recebem Auxílio Brasil supera emprego formal em metade das cidades

Mesmo com melhora do mercado de trabalho, queda na renda mantém famílias dependentes

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São José do Rio Preto e São Paulo

O número de famílias beneficiárias do Auxílio Brasil supera o de empregados com carteira assinada em metade dos municípios do país.

Levantamento realizado pela Folha com dados do Ministério da Cidadania e da Secretaria Especial do Trabalho mostra que, de 5.426 cidades analisadas, 2.728 encontram-se nesta situação (50,3%). Os dados se referem ao mês de junho.

Pessoas fazem fila para receber parcela do Auxílio Brasil em São Paulo - Rivaldo Gomes -17.nov.2021/Folhapress

O programa é uma das apostas do governo Jair Bolsonaro (PL) para melhorar a popularidade. O presidente, candidato à reeleição neste ano, está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

De acordo com especialistas, apesar de a taxa de desocupação ter recuado no primeiro semestre, a queda na renda média do trabalhador e a falta de oportunidades de emprego formal contribuem para manter muitas famílias dependentes da ajuda do governo.

Entre os municípios de maior porte, um exemplo é Nova Iguaçu (RJ), na Baixada Fluminense. A cidade de 825 mil habitantes fechou o primeiro semestre com 83,2 mil contratados em regime CLT e 114,4 mil famílias beneficiadas pelo Auxílio Brasil, segundo os balanços oficiais dos órgãos federais.

Outro exemplo é Belford Roxo (RJ), cidade de 515 mil habitantes também na Baixada Fluminense. A proporção no município era de três famílias atendidas pelo programa de transferência de renda (67,6 mil) para cada habitante formalmente empregado (21,2 mil).

O fenômeno, porém, é muito mais frequente nas cidades pequenas, uma vez que apenas 65 grandes municípios do país concentram metade dos empregos formais, enquanto abrigam, juntos, um terço da população nacional.

Entre as 326 cidades com 100 mil habitantes ou mais, apenas 48 possuem menos celetistas que famílias beneficiadas (14,7%).

A análise mostra que 94% dos municípios da região Nordeste possuem mais beneficiários do que empregados. No Norte, são 82,3%.

Esses percentuais são bem inferiores nas regiões Sul (12,9%), Centro-Oeste (28,7%) e Sudeste (30,9%).

Paralelamente, o levantamento reforça que a situação é mais comum entre as cidades com menor IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal).

O número de empregados é inferior ao de famílias beneficiadas em 99,7% das cidades com o índice considerado baixo —menos de 0,550 na escala, que vai de 0 a 1.

É o caso de Breves, no Pará. Com um IDHM de 0,503, a cidade conta com uma população de 104 mil habitantes, mas tem registros de apenas 2.793 trabalhadores formais. O número de famílias atendidas pelo Auxílio Brasil era de 20.570.

No outro extremo, entre as cidades com o índice considerado muito alto —acima de 0,8—, não há nenhuma em que o número de trabalhadores formais seja menor que o de famílias beneficiadas.

O levantamento desconsiderou 144 cidades (2,6%) devido à ausência ou inconsistências evidentes nos dados do Novo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados). No geral, são cidades pequenas, com baixo IDHM e todas localizadas no Norte ou Nordeste, isto é, com perfil semelhante àquelas com mais auxílios que postos formais.

"Esses números não surpreendem, pois estão diretamente associados à estrutura econômica dos municípios brasileiros", avalia Débora Freire, professora do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

A economista explica que a maioria dos municípios de pequeno porte é altamente dependente do setor público, tanto na geração de postos de trabalho quanto na transferência de recursos, seja por meio de programas sociais ou de repasses da União e dos estados para a composição de suas receitas.

Segundo o economista e professor do Insper Sergio Firpo, como essas cidades têm grandes dificuldades de gerar emprego, ficam à margem do crescimento econômico. Sem geração de renda, os moradores seguem mais dependentes do benefício do que em locais com economia mais ativa.

"Os municípios mais pobres no Brasil são aqueles em que há muita gente fora da força de trabalho, ou na informalidade, e pouca gente no setor formal. Não é surpreendente que o número de beneficiários seja maior do que o de trabalhadores formais".

Para Freire, programas de transferência de renda como o Bolsa Família e o Auxílio Brasil são fundamentais para estimular a economia dessas localidades, mas insuficientes para, sozinhos, alterar significativamente este cenário.

"Essas políticas têm a capacidade de fomentar principalmente o comércio e uma série de serviços, e por isso são tão importantes. Mas, até que isso se traduza em maior formalidade e se reflita no mercado de trabalho, não é algo rápido."

Daniel Duque, economista e pesquisador do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), ressalta que o fenômeno não acontece apenas na zona rural.

"Apesar de a informalidade ser um problema maior em regiões rurais e menos densas, nas grandes cidades das regiões metropolitanas há uma carência muito grande de emprego de qualidade dentro da formalidade."

Ele afirma que as pessoas com baixo nível de rendimento procuram trabalho na metrópole, onde há mais oportunidades, mas não conseguem arcar com os custos da moradia nessas regiões. "Esses trabalhadores, muito provavelmente, vão precisar acessar um programa social para complementar a renda".

Beneficiários superam trabalhadores CLT em 12 estados

No agregado por estado, o total de benefícios supera o de empregados em 12 unidades federativas, todas elas das regiões Norte (Acre, Amazonas, Amapá e Pará) e Nordeste (Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Sergipe). São os mesmos estados em relação ao comparativo publicado pela Folha em abril com dados relativos a fevereiro.

Em cinco deles, a concessão de benefícios superou a melhoria das vagas formais desde então. Amazonas, Piauí, Pernambuco, Sergipe e Bahia tiveram mais famílias cadastradas no programa do que novos postos de trabalho criados no período. Em Alagoas, houve retração no número de empregos. Nos outros seis, o total de famílias atendidas pelo Auxílio cresceu, mas em menor proporção que o de contratados.

Em oito estados, a quantidade de famílias dependentes do benefício diminuiu (Roraima, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, Espírito Santo e São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul).

De acordo com os dados do Ministério da Cidadania, o Auxílio teve um tíquete médio de R$ 405,48 em junho, considerando os benefícios extraordinários acumulados.

Em agosto, as famílias passam a receber a parcela mínima de R$ 600. O acréscimo de R$ 200, previsto para durar até dezembro, já chegará defasado aos bolsos dos beneficiados, devido ao aumento da inflação.

Segundo a pasta, houve 2,2 milhões de novas inscrições no Auxílio Brasil. Com isso, o benefício contemplará 20,2 milhões de famílias.

De acordo com a Secretaria do Trabalho, o Brasil fechou o o mês de junho com 42 milhões de postos formais ocupados, o equivalente a 28% da população em idade economicamente ativa —dos 15 aos 65 anos.

A taxa de desocupação medida pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) no segundo trimestre foi de 9,3% —a menor para o período desde 2015—, o equivalente a 10,1 milhões de pessoas.

Por outro lado, o trabalho informal era a realidade de 39,3 milhões de brasileiros —recorde da série histórica—, com uma taxa de informalidade de 40% dos ocupados.

Também no segundo trimestre, o rendimento habitual do trabalho foi estimado em R$ 2.652. Uma queda de 5,1% na comparação com o mesmo período do ano passado (R$ 2.794).

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