Descrição de chapéu The New York Times

Fundador da FTX, que derreteu, usava bermudas, valia US$ 25 bi aos 30 anos e foi chamado de cavaleiro do mercado

Sam Bankman-Fried foi considerado por muitos uma aposta segura, que domaria terra das criptomoedas

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Roger Lowenstein
The New York Times

Com a inflação ainda em alta, é difícil defender o valor dos bancos centrais. Mas os jovens gênios das criptomoedas conseguiram.

Dizia-se que o grande benefício da criptografia era a descentralização. Isso foi acompanhado por todo tipo de fanfarronice sobre o poder libertador do dinheiro desvinculado do estado central.

Um proeminente defensor do dinheiro descentralizado, Sam Bankman-Fried, ficou famoso por usar bermudas e dizia-se que valia US$ 25 bilhões (R$ 132 bilhões) aos 30 anos. Bankman-Fried, fundador da bolsa conhecida como FTX, foi considerado por muitos uma aposta segura, que domaria a terra selvagem das criptomoedas, como o grande cavaleiro dessa indústria.

Essa caracterização ganhou força no verão passado, depois que Bankman-Fried tentou socorrer duas pequenas empresas de criptomoedas falidas, Voyager Digital e BlockFi, atraindo reportagens elogiosas que o compararam a J.P. Morgan Sênior.

Sam Bankman-Fried chief executive of FTX, a crypto derivatives exchange that offers products unavailable to traders in the U.S., at the offices in Hong Kong, May, 26, 2021. For all of the obvious ways in which Bankman-Fried is no Pierpont Morgan, a model of discretion whose namesake firm continues to be solvent to this day, on one point they have something in common: Their careers demonstrate a need for central banks.
Sam Bankman-Fried é um investidor fundador da FTX, uma corretora de criptomoedas - Lam Yik Fei/The New York Times

A analogia com Morgan foi repetida na semana passada, mesmo depois que os clientes da FTX sacaram US$ 6 bilhões (R$ 31 bilhões) em fundos no equivalente a um pânico bancário, forçando a FTX a congelar as operações e reter bilhões em ativos potencialmente perdidos dos clientes restantes.

Por todas as maneiras óbvias como Bankman-Fried não é Pierpont Morgan –este, um modelo de discrição cuja empresa homônima continua solvente até hoje–, em um ponto eles têm algo em comum: suas carreiras demonstram a necessidade de bancos centrais.

Morgan ganhou sua reputação como salvador privado em 1907, quando uma corrida bancária atingiu os trusts (associações semelhantes a bancos) na cidade de Nova York e depois se espalhou para os bancos tradicionais. Morgan reuniu os principais financistas da cidade para emprestar fundos de emergência e aliviar o pânico.

Seu heroísmo retardou o sangramento –mas alguns bancos faliram, muitos suspenderam os saques e dezenas recorreram à distribuição de certificados caseiros em vez de dinheiro. Enquanto cada banco acumulava reservas para se salvar, o mercado de ações despencou 40% e o país sofreu uma grave recessão.

A inadequação de Morgan deixou claro que os Estados Unidos, já uma potência industrial, não podiam depender da benevolência de um único financista. Exatamente por isso, Neson Aldrich, um poderoso senador com laços estreitos com Morgan, liderou uma missão à Europa em 1908 para estudar o funcionamento dos bancos centrais da Inglaterra, França e Alemanha.

Dois anos depois, um grupo de banqueiros, incluindo um sócio sênior de Morgan, presidente de seu rival National City Bank, e o cruzado do banco central Paul Warburg, se reuniu no clube exclusivo de Morgan na Ilha de Jekyll, na costa da Geórgia. Em um encontro secreto, eles traçaram o esboço do que os americanos evitavam desde os tempos de Andrew Jackson –um banco central. O Federal Reserve nasceu três anos depois, em 1913.

Na semana passada, James Mackintosh, do The Wall Street Journal, opinou: "A falha fundamental das finanças centralizadas é que elas precisam de bancos centrais para acabar com as corridas caóticas aos bancos…" É como dizer que o problema de possuir uma casa é que a pessoa pode precisar do corpo de bombeiros.

Qualquer instrumento monetário é uma forma de crédito, e o crédito sempre envolverá risco. Bankman-Fried descobriu isso. Seu suposto salvador, uma exchange de criptomoedas conhecida como Binance, desistiu 24 horas depois de ter concordado provisoriamente com um resgate.

Na sexta-feira (11), a FTX entrou com um pedido de falência. No entanto, se o acordo de resgate tivesse sido concluído, a Binance estaria pendurada por, supostamente, até US$ 8 bilhões (R$ 42 bilhões) em reclamações contra a FTX. Quem teria vindo em socorro da Binance?

O ponto de um fundo de reserva central, que é o que Paul Warburg e Nelson Aldrich tinham em mente em 1913, é que os recursos da nação reunidos são incomensuravelmente maiores do que os de qualquer magnata isolado. Eles oferecem, em tempos de necessidade, um oceano de liquidez para resolver as inevitáveis flutuações do crédito individual, regional e de setores específicos. Alguém em sã consciência desejaria confiar a nação às criptomoedas –e trocar o Fed imperfeito por coisas como FTX e Binance?

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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