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Maior fundo de cripto do mundo é tragado pela crise da FTX

Ações do Grayscale Bitcoin Trust, de US$ 10,5 bilhões, são negociadas com 40% de desconto em relação ao valor de seu patrimônio

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Steve Johnson
Financial Times

O maior fundo de criptomoedas do mundo se envolveu na turbulência que envolve o setor em crise, em mais um sinal de enfraquecimento do entusiasmo por ativos digitais.

O preço das ações do Grayscale Bitcoin Trust (GBTC), de US$ 10,5 bilhões, que detém 3,5% do bitcoin mundial, despencou para um desconto de 39% em relação ao valor de seus ativos subjacentes, à medida que os investidores embarcavam numa corrida cada vez mais desesperada para sair.

A explosão significa que os investidores do fundo sofreram uma perda de 83% desde o pico do bitcoin em novembro de 2021, superando a queda de 74% no valor do próprio bitcoin.

Criptomoedas; crise da FTX afeta maior fundo de cripto do mundo - Dado Ruvic/Reuters

A confiança nos ativos digitais foi prejudicada pela implosão da FTX, cujas consequências estão se espalhando pela indústria de quase US$ 1 trilhão devido às ligações complexas e muitas vezes opacas entre os principais players.

Os temores chegaram mais perto do Grayscale na quarta-feira (16), quando a criptocorretora Genesis Trading, que originou mais de US$ 50 bilhões em empréstimos no ano passado, suspendeu resgates e originações de empréstimos em seu ramo de crédito depois de sofrer contágio financeiro com a falência da Three Arrows Capital, o fundo de hedge cripto de Singapura que pediu concordata em julho.

O Grayscale e a Genesis são subsidiárias do Digital Currency Group, uma empresa de capital de risco com sede em Stamford, Connecticut (EUA).

A Genesis atuou como participante autorizada do GBTC, responsável pela emissão de novas ações, até o mês passado, quando o Grayscale lançou uma corretora interna, a Grayscale Securities.

O Digital Currency Group também é o maior acionista do GBTC, com uma participação de 4,1%, ou 28,2 milhões de ações, de acordo com dados da Refinitiv.

O problema central do GBTC é que ele foi substituído pelo advento de melhores veículos para se manter bitcoins.

Quando foi lançada como oferta de colocação privada em 2013, era uma das poucas desse tipo e, à medida que a indústria de criptomoedas se expandia, aumentou rapidamente seu número de ações para absorver a maré de dinheiro que chegava.

Logo da FTX instalado na fachada Arena FTX, em Miami; crise da corretora causa tempestade no setor - Marco Bello/Reuters

Os ativos líquidos atingiram US$ 39,8 bilhões em outubro de 2021, de acordo com dados da Morningstar, e o GBTC foi sempre negociado a um prêmio em relação ao valor líquido dos ativos.

No entanto, foi prejudicado pelo surgimento dos primeiros fundos negociados em bolsa de bitcoin no Canadá naquele ano. As taxas desses veículos eram geralmente menos da metade dos 2% ao ano cobrados pelo GBTC. Eles também ofereciam maior liquidez e novos investidores não precisavam pagar um prêmio.

À medida que os fluxos se afastaram do GBTC, a demanda e a oferta de suas ações se desequilibraram, levando o preço das ações a um forte desconto em relação ao NAV.

O problema subjacente é que –ao contrário dos ETFs– não há mecanismo de arbitragem para equilibrar a oferta e a demanda.

As ações do GBTC não podem ser resgatadas por bitcoin ou dinheiro, e só podem ser vendidas a outro comprador por meio do mercado de balcão. A Grayscale precisaria de aprovação regulatória para instituir um programa de recompra de ações.

Em vez disso, a Grayscale espera converter o GBTC em um ETF de "spot" bitcoin, mantendo a moeda "física". Até agora, esses planos foram bloqueados pela Comissão de Valores Mobiliários (SEC na sigla em inglês) dos EUA, que se recusou a seguir o exemplo dos reguladores do Canadá e de outros lugares, aprovando ETFs de bitcoin à vista, citando preocupações sobre possíveis fraudes e manipulações nas bolsas não regulamentadas onde ocorrem as negociações.

A Grayscale, que não quis comentar para esta reportagem, está processando a SEC pelo direito de converter o GBTC. No entanto, o desconto cada vez maior sugere que poucos participantes do mercado acreditam que é provável que seja bem-sucedido.

"Se eles conseguissem vencer o processo judicial, todos os investidores seriam compensados. O desconto diminuiria drasticamente porque o processo de criação e resgate [de ações] pode ocorrer livremente", disse Todd Rosenbluth, chefe de pesquisa da VettaFi.

Nate Geraci, presidente da The ETF Store, disse que "a estrutura do GBTC é claramente abaixo do ideal, uma vez que as ações não podem ser resgatadas.

"É muito decepcionante que a SEC continue permitindo que qualquer investidor de varejo acesse esse fundo, mas eles não aprovam um ETF de bitcoin à vista que resolveria o problema do desconto. Este é mais um exemplo da absurda disfunção regulatória em torno de todo o ecossistema criptográfico no momento", acrescentou Geraci.

Alguns investidores mantiveram sua fé. A Ark Investment Management, já o terceiro maior acionista do GBTC, com uma participação de quase 1%, comprou esta semana mais US$ 2,8 milhões em ações.

Em outubro, a executiva-chefe da Ark, Cathie Wood, disse que o GBTC estava sendo negociado a um preço de "liquidação", dada a possibilidade de ser convertido em um ETF em algum momento. A Ark, que também está buscando permissão para lançar um ETF à vista, disse que não comenta a atividade diária de negociação.

O segundo maior acionista, com 2,9%, é a BlockFi, plataforma de negociação e empréstimo de cripto que interrompeu as retiradas de depósitos de clientes devido à sua "exposição significativa" à FTX.

Peter Tchir, chefe de macroestratégia da Academy Securities, levantou a possibilidade de a Grayscale buscar permissão para recomprar uma grande quantidade de ações e, em seguida, liquidar o fundo, potencialmente obtendo lucro mais do que suficiente para compensar a perda de receita de taxas e fazer com que os investidores externos se recuperassem no processo.

No entanto, Geraci acredita que há todas as chances de o desconto aumentar ainda mais, "especialmente se houver mais contágio da FTX, que pesa sobre o espaço criptográfico como um todo".

No entanto, ele sugeriu que o GBTC "é claramente uma opção melhor do que manter bitcoin em uma bolsa como a FTX, pois os investidores podem operar com confiança de que o bitcoin subjacente está realmente lá".

Além disso, Geraci acredita que o desastre da FTX reforçou o caso pela supervisão regulatória das exchanges de criptomoedas, "acelerando teoricamente o cronograma para a aprovação do ETF de bitcoin à vista".

No entanto, Rosenbluth pensou que a SEC veria o fiasco como uma justificativa de sua posição.

"A SEC viu o spot bitcoin como arriscado e está preocupada com fraude e manipulação", disse ele. "Não tenho certeza se eles ficarão surpresos com esses fatos."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves.

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