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Retorno repentino de Bob Iger à Disney choca um reino descontente

CEO vai encontrar desafios na companhia após gestão tumultuada de Bob Chapek e relatório financeiro desastroso

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Brooks Barnes Benjamin Mullin James B. Stewart
The New York Times

Depois de uma transição marcada por vários contratempos, alguns deles infligidos por ele mesmo, Bob Chapek parecia ter finalmente encontrado o equilíbrio após dois anos como CEO da Disney.

O conselho da empresa estendeu por unanimidade seu contrato até pelo menos julho de 2025. Em agosto, a Disney relatou ganhos trimestrais estelares, incluindo um salto de 50% no lucro, ultrapassando a Netflix pela primeira vez em assinaturas de streaming.

Em uma convenção de fãs da Disney em setembro, Chapek pintou um futuro cor-de-rosa para a empresa, que incluía sucessos de bilheteria como "Avatar: O Caminho da Água" e novos passeios em parques temáticos. "Estou muito, muito otimista", disse o apresentador da CNBC Jim Cramer sobre a empresa, em outubro.

Então, em novembro, veio o desastroso relatório de lucros trimestrais da Disney.

O CEO da Disney, Bob Iger, durante evento em Washington, em 2012 - Chip Somodevilla - 04.jun.12/Getty Images via AFP

Perdas impressionantes em streaming; lucratividade dos parques temáticos abaixo do esperado; desafios agudos na televisão a cabo, inclusive na ESPN. No entanto, Chapek inexplicavelmente ronronou durante uma teleconferência de resultados com analistas e investidores, considerando os resultados positivos e oferecendo observações reluzentes sobre a capacidade da Disney de vender "memórias mágicas que duram a vida inteira".

O relatório e a convocação desencadearam acontecimentos que culminaram no domingo com a demissão de Chapek pelo conselho da Disney e a surpreendente reintegração de seu antecessor, Robert A. Iger, como CEO até dezembro de 2024.

Não apenas alguns antigos líderes da Disney ficaram horrorizados com os resultados trimestrais e a apresentação aparentemente delirante de Chapek: vários deles começaram a falar abertamente em se demitir caso ele permanecesse, conversa que rapidamente chegou ao conselho da Disney.

Christine M. McCarthy, a conceituada diretora financeira da companhia, disse diretamente a pelo menos um membro do conselho que não confiava em Chapek. "Ele perdeu irremediavelmente o espaço", disse o líder de uma unidade da Disney, na segunda-feira (21).

Este artigo foi baseado em entrevistas com mais de uma dúzia de pessoas, incluindo executivos da Disney, banqueiros e investidores que trabalham com a companhia e pessoas próximas a Iger e Chapek, que falaram sob a condição de anonimato por causa da natureza chocante e delicada da mudança de liderança. Um porta-voz da Disney se recusou a comentar, exceto para dizer que Iger não estava disponível para uma entrevista. Chapek não respondeu aos pedidos de comentários.

Com os investidores fugindo da Disney –suas ações caíram 13% no dia seguinte ao relatório de lucros, a maior queda desde os ataques de 11 de setembro– e com Cramer, da CNBC, pedindo abertamente a demissão de Chapek, o conselho da Disney decidiu apertar o botão de pânico.

Susan Arnold, presidente do conselho, ligou para Iger, 71 anos, às 15h de sexta-feira (18) e pediu que ele voltasse.

Bob Chapek, presidente-executivo da Disney, em Massachusetts, EUA - Katherine Taylor - 15.nov.2021/Reuters

Em eventos públicos no ano passado –e em conversas com confidentes ainda neste mês– Iger repetidamente insistiu que não tinha intenção de voltar para a Disney. Ao mesmo tempo, ele vinha criticando Chapek em particular, de acordo com várias pessoas que falaram com ele.

Ele lamentou o que disse ser a aparente falta de empatia e inteligência emocional de Chapek, o que resultou em uma incapacidade de se comunicar ou se relacionar com a comunidade criativa de Hollywood. A Disney parecia estar perdendo sua alma, ele confidenciou a um associado.

Perturbado com a conversa de Iger, que chegou à sede da Disney, o teimoso Chapek respondeu colocando o ex-CEO no gelo –em vez de lhe pedir conselhos. Por exemplo, Iger não recebeu um pedido de ajuda quando a Disney foi criticada interna e externamente nesta primavera por sua abordagem à legislação da Flórida que proíbe discussões em sala de aula sobre orientação sexual e identidade de gênero até a terceira série.

Isso pareceu irritar ainda mais Iger, segundo duas pessoas que conversaram com ele.

Nos últimos anos de Iger como CEO da Disney, ele se tornou, como os líderes de longa data tendem a fazer, mais consciente de seu legado. Ele levou a Disney a registrar resultados financeiros e planejou as aquisições da Pixar, Marvel, Lucasfilm e da maior parte da 21st Century Fox pela Disney, alterando substancialmente o cenário do entretenimento. Também introduziu com sucesso o serviço de streaming Disney+.

Mas quanto mais Chapek fracassava, mais a reputação de Iger também sofria. Iger escolheu Chapek a dedo para o trabalho, acreditando que o estilo de negócios direto e não sentimental de Chapek ajudaria a Disney a continuar se transformando numa superpotência de streaming.

De acordo com três pessoas inteiradas sobre o assunto, Chapek foi informado em particular de que era o herdeiro aparente já em 2018, muito antes da previsão inicial, então Iger teve tempo suficiente para treiná-lo. A peça final do legado de Iger –uma transferência de poder suave e bem-sucedida– foi negada.

Wall Street aplaudiu o retorno de Iger. A Disney ganhou US$ 12 bilhões em valor durante a noite, com as ações subindo 10% na manhã de segunda. Os executivos da companhia, embora chocados com a virada dos acontecimentos, ficaram emocionados ao vê-lo. ("Papai está de volta!", escreveu um executivo sênior da empresa no domingo.) O Hollywood Reporter, publicação de notícias setoriais, publicou a manchete "Bob Iger retorna como herói esperando salvar uma Disney maltratada".

Mas ele não é uma solução de longo prazo. Ao anunciar o retorno de Iger, a empresa disse em comunicado que o fez com a missão de desenvolver "um sucessor para liderar a empresa ao final de seu mandato".

Iger, que fechou seu acordo com a Disney no domingo, tem um pacote de remuneração que inclui um salário-base de US$ 1 milhão, incentivos de ações calculados em US$ 25 milhões anuais e um bônus anual estimado em US$ 1 milhão.

Nenhuma das grandes empresas de mídia conseguiu descobrir como navegar além do colapso da televisão a cabo. Os serviços de streaming já foram vistos como a solução, e ainda podem ser, mas houve uma mudança drástica nos últimos seis meses. O jogo não é mais sobre aumentar o número de assinaturas globais a qualquer custo; os investidores agora querem ver lucros à moda antiga.

Mas a Disney tem um problema que seus concorrentes não têm, e envolve a maior mudança de Chapek durante seu tempo como CEO.

Em 2020, Chapek reestruturou a Disney para dar prioridade aos serviços de streaming da empresa (Disney+, Hulu e ESPN+). Ele tirou a responsabilidade por lucros e perdas dos executivos que dirigem os estúdios de cinema e televisão da Disney e a deu a um protegido, Kareem Daniel, que foi nomeado presidente de uma nova divisão, a Disney Media and Entertainment Distribution.

A perda desse território –junto com o controle sobre quando e como os filmes e programas seriam lançados– perturbou antigos executivos da companhia, incluindo Alan Bergman, presidente da Disney Studios Content.

Para tornar a situação mais delicada, Daniel tinha pouca experiência na vasta área que lhe foi confiada para supervisionar. Chapek repetidamente insistiu que sua reorganização profundamente impopular era, na verdade, o oposto, com "100% de adesão" dos gerentes da Disney.

A divisão de Daniel é notavelmente aquela que contribuiu com US$ 1,5 bilhão em perdas de "pico" de streaming no último trimestre, acima dos US$ 630 milhões do ano anterior, surpreendendo os investidores.

Iger demitiu Daniel na segunda-feira. Em uma nota aos funcionários, Iger disse que uma nova estrutura da empresa está a caminho, que "coloca mais tomada de decisão nas mãos de nossas equipes criativas e racionaliza os custos".

Iger enfrenta outros desafios

Um frenesi competitivo surgiu em torno dos direitos de transmissão de esportes, com Apple, Amazon e outras aumentando os preços, o que prejudicou os resultados da ESPN. As apostas esportivas são vistas por alguns investidores como o novo streaming –uma correção mestre de rápido crescimento–, mas abraçar totalmente esse negócio pode manchar a marca familiar da Disney.

Os filmes de animação, o coração da Disney, começaram a ter dificuldades, com a explosão de "Lightyear" da Pixar em junho e "Strange World" devendo decepcionar nas bilheterias do Dia de Ação de Graças.

A deterioração da economia dos Estados Unidos pode prejudicar o comparecimento e os gastos em parques temáticos, onde os fãs já estão chateados com os aumentos de preços quase constantes.

Iger pode muito bem colocar a Disney de volta no caminho certo, resolvendo seu problema de legado no processo. Ou ele pode desejar ter ouvido suas próprias palavras, ditas durante uma entrevista em um podcast neste ano, quando perguntado se consideraria retornar à Disney.

"Fui CEO por muito tempo", disse ele. "Você não pode voltar para casa. Estou fora."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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