Descrição de chapéu transição de governo

Áreas do novo governo disputam espaço aberto no Orçamento pela PEC da Transição

Hoje reservados ao Auxílio Brasil, R$ 105 bilhões poderão ser redistribuídos em 2023

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Brasília

Em busca de recomposição de recursos para 2023, as áreas-chave do governo eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disputam o espaço que será aberto no Orçamento uma vez que a PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição seja aprovada.

Dos R$ 105 bilhões hoje reservados ao Auxílio Brasil e que poderão ser redistribuídos em 2023, ao menos R$ 75 bilhões são pleiteados para evitar um apagão dos setores mais afetados por cortes neste ano, como Saúde e Educação. Outros R$ 10 bilhões já estão nos planos do novo governo.

Os grupos de trabalho da transição mapearam o cenário a partir de estimativas feitas por integrantes do atual governo Jair Bolsonaro (PL) de forma a atender às mínimas necessidades de cada área.

Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no CCBB, sede do governo de transição - Pedro Ladeira/Folhapress

O texto da PEC da Transição protocolado no Senado na segunda-feira (28) prevê a exclusão do Auxílio Brasil –que será rebatizado de Bolsa Família– do teto de gastos, regra fiscal que limita o crescimento das despesas. O PT estima R$ 175 bilhões para manter o benefício de R$ 600 e pagar um adicional de R$ 150 por criança até seis anos.

A proposta ainda prevê um dispositivo que permite investimentos em caso de receitas extraordinárias, até o limite de R$ 23 bilhões. Na prática, o extrateto subiria a R$ 198 bilhões, embora o valor não esteja explícito na proposta.

Coordenador dos grupos técnicos da transição de governo, Aloizio Mercadante (PT) diz ver um "total colapso orçamentário" e um desmonte das políticas públicas.

Segundo o relator-geral do Orçamento de 2023, senador Marcelo Castro (MDB-PI), a prioridade de recomposição de recursos é para a área social.

"Teríamos espaço orçamentário de R$ 105 bilhões para serem preenchidos com Farmácia Popular, saúde indígena, merenda escolar, investimento, que são [temas] muito caros ao novo governo", disse.

A equipe de transição tem afirmado que o cenário é de caos na saúde. Caso a PEC seja aprovada no Congresso, a área quer um reforço de R$ 22,7 bilhões. O valor serviria para investimentos em medicamentos, vacinas e garantir o funcionamento do SUS (Sistema Único de Saúde).

O governo Bolsonaro enviou a proposta de Orçamento para 2023 com uma previsão de corte de 42% nas verbas discricionárias do Ministério da Saúde, usadas na compra de materiais, equipamentos e para investimentos.

A reserva para o programa Farmácia Popular –que distribui medicamentos básicos gratuitamente ou com desconto de até 90% por meio de farmácias privadas conveniadas– caiu 59%, de R$ 2,48 bilhões neste ano para R$ 1 bilhão em 2023.

Em reunião na semana passada, Lula sinalizou que não vai faltar verba para a área. "Nosso trabalho será encontrar esses recursos e investir no SUS, em especial no resgate do Programa Nacional de Imunização para retomar a confiança da população nas vacinas", disse.

Na área de Educação, a equipe de trabalho definiu uma recomposição de R$ 12 bilhões no orçamento do MEC. Do total, há planos para destinar R$ 1,5 bilhão para o PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar). O dinheiro federal para merenda varia hoje de R$ 0,32 a R$ 1,07 por dia por aluno.

"Há necessidades urgentes em todas etapas educacionais e ações, como a educação infantil, merenda, plano de recuperação de aprendizagem, universidades e institutos", disse o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG).

Com relação a universidades e institutos, a ideia é que os recursos de investimentos sejam recompostos à realidade de 2014. Na proposta orçamentária para 2023 encaminhada pelo governo Bolsonaro ao Congresso, a verba para o ensino superior com essa finalidade soma R$ 232 milhões. Há oito anos, o valor foi de R$ 1,6 bilhão (corrigido pela inflação).

O grupo de trabalho fala em "retrocessos orçamentários" sobre a situação no MEC. "Com o orçamento atual, não será possível implementar as propostas do plano de governo e várias ações em curso correm sério risco de serem descontinuadas", diz relatório preliminar.

Na área de Desenvolvimento Social, estima-se que sejam necessários R$ 2 bilhões para manutenção do Auxílio Gás. A equipe ainda mira R$ 500 milhões para o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos) e R$ 2,6 bilhões para o Suas (Sistema Único de Assistência Social)

Já o grupo da Justiça e Segurança Pública pretende pedir ao menos de R$ 400 a R$ 500 milhões acima do previsto no Orçamento para 2023 para evitar a interrupção de serviços. O valor seria principalmente para complementar o orçamento da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Fupen (Fundo Penitenciário Nacional).

O grupo afirma que faltam recursos para pagar diárias de agentes da PF e da PRF. Eles pedem ainda um reforço de R$ 200 milhões no Orçamento deste ano. A falta de verba atinge de emissão de passaportes a operações de segurança e controle de fronteiras.

Para retomar as obras paradas da área de Habitação, o valor apurado inicialmente pelo grupo de trabalho de Cidades é de R$ 2,6 bilhões, sendo cerca de R$ 1 bilhão para dar continuidade às obras da faixa 1 do Minha Casa, Minha Vida –programa habitacional voltado para a população de baixa renda.

A verba do FAR (Fundo de Arrendamento Residencial) caiu dos atuais R$ 665 milhões para R$ 34 milhões no projeto de Orçamento de 2023.

"Nos preocupa a quantidade de obra parada e a falta de recursos orçamentários na PLOA [projeto de Lei Orçamentária] de 2023", afirmou o deputado eleito Guilherme Boulos (PSOL-SP).

Em documento entregue a Lula, comitê formado por funcionários e ex-dirigentes da Caixa Econômica Federal destacou que a disputa de recursos no espaço orçamentário que se abre com a PEC tem muitos destinos, "indicando a necessidade de o grupo de transição ficar atento para a alocação de recursos na LOA-2023 para a contratação das 500 mil unidades indicadas no plano de governo para 2023."

O valor necessário para dar início a novos projetos ainda não foi calculado. "Quando falarmos que queremos retomar o Minha Casa, Minha Vida aprovando projetos novos, vamos ter de sentar para avaliar", disse o ex-deputado Geraldo Magela, membro do grupo de trabalho.

Na área de Desenvolvimento Regional, a equipe diagnosticou que há um déficit de R$ 2 bilhões para o próximo ano. Na LOA entregue ao Congresso, a pasta teria R$ 3 bilhões.

"Ao todo, o MDR precisa de mais de R$ 5 bilhões para tocar as ações que necessita para 2023", afirmou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). O cálculo tem como base a sinalização feita pelo atual ministro da pasta, Daniel Ferreira, e ainda será discutido.

O grupo de trabalho do Meio Ambiente também diz não ter calculado ainda o valor pelo qual precisará lutar para implementar as mudanças pretendidas no setor.

Apesar da indefinição, há uma articulação para que potenciais parlamentares da futura bancada do governo Lula no Congresso apresentem emendas à proposta de Orçamento enviada por Bolsonaro.

Em levantamento feito pela Folha, o valor chega a quase R$ 1,6 bilhão. O montante é visto por integrantes da transição como plausível até o momento.

"É importante que no debate da PEC da Transição e Orçamento de 2023 sejam consideradas as condições financeiras essenciais para estancar o processo de degradação ambiental em curso no país", afirmou o deputado Nilto Tatto (PT-SP), escalado para articular as demandas relacionadas às verbas ambientais.

Em 2021, o governo Bolsonaro propôs o menor orçamento do século para a pasta (R$ 1,7 bilhão).

Segundo diagnóstico da equipe da transição, quatro principais frentes precisam ser reestruturadas: fiscalização ambiental, controle de queimadas, redução do desmatamento e recomposição do quadro de servidores do órgão.

Na área de Ciência e Tecnologia, por sua vez, há uma demanda de R$ 4,2 bilhões para o FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e R$ 400 milhões para outras ações.

Uma parcela dos recursos do FNDCT é destinada para institutos de pesquisas, outra compõe um crédito voltado para empresas que desejam realizar pesquisas.

A transição também estima cerca de R$ 21 bilhões para investimentos em diferentes segmentos, o que inclui parte da verba para Habitação.

As demandas feitas pelas áreas do novo governo concorrem com algumas despesas tidas como prioritárias, como o aumento real (superior à inflação) do salário mínimo –promessa de campanha de Lula. A medida precisaria de R$ 6,8 bilhões do Orçamento de 2023.

No próximo ano, será também preciso ainda alocar R$ 3 bilhões referentes à Lei Aldir Blanc 2. Em novembro, o STF (Supremo Tribunal Federal) suspendeu os efeitos de uma medida provisória que permitia o adiamento dos pagamentos para o setor cultural.


RECURSOS ESTIMADOS PELOS GRUPOS DE TRABALHO DA TRANSIÇÃO

  • Saúde: R$ 22,7 bilhões
  • Educação: R$ 12 bilhões, sendo R$ 1,5 bilhão para merenda
  • Desenvolvimento Social: R$ 2 bilhões para Auxílio Gás, R$ 500 milhões para PAA (Programa de Aquisição de Alimentos) e R$ 2,6 bilhões para Suas (Sistema Único de Assistência Social)
  • Justiça e Segurança Pública: R$ 500 milhões
  • Cidades: R$ 2,6 bilhões, sendo R$ 1 bilhão para faixa 1 do Minha Casa, Minha Vida
  • Desenvolvimento Regional: R$ 5 bilhões
  • Meio Ambiente: R$ 1,6 bilhão
  • Ciência e Tecnologia: R$ 4,2 bilhões para FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e R$ 400 milhões para outras ações.
  • Investimentos: R$ 21 bilhões, incluindo parte da verba para a Habitação
  • Outras despesas: R$ 6,8 bilhões para aumento real do salário mínimo e R$ 3 bilhões para Lei Aldir Blanc 2
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