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Adidas busca o que fazer com US$ 1,3 bi em tênis de Kanye West

Depois de romper com rapper, empresa anunciou redução de dividendos e classificou 2023 como ano de transição

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Melissa Eddy
Berlim | The New York Times

O novo CEO da Adidas tem US$ 1,3 bilhão em tênis da Yeezy com os quais não sabe o que fazer.

Estocados em armazéns de todo o planeta, os tênis são um lembrete da parceria até recentemente frutífera entre a Adidas e Kanye West, rapper agora conhecido como Ye. Desde que o primeiro tênis Yeezy Boost 750 chegou ao mercado, em fevereiro de 2015, a marca Yeezy se tornou uma força determinante na indústria do vestuário esportivo e passou a ser um dos pilares mais lucrativos dos negócios da Adidas.

Isso terminou quando a forte reação adversa a uma sucessão de declarações antissemitas do músico forçou a Adidas a rescindir o contrato com ele, em outubro.

O rapper Ye, ex-Kanye West, faz manifestação em apoio à sua candidatura presidencial em 2020 em North Charleston, Carolina do Sul, EUA - Randall Hill - 19.jul.2020/Reuters

Agora Bjorn Gulden, que assumiu o comando da Adidas em janeiro, está tentando estabilizar a empresa alemã, e a súbita perda de uma linha lucrativa é apenas um de seus problemas. No ano passado, as vendas na China, o maior mercado da companhia, caíram em mais de 35%, porque o país expandiu suas medidas de lockdown para conter a Covid, e a decisão de sair da Rússia depois da invasão da Ucrânia custou 59 milhões de euros (cerca US$ 62 milhões) ao grupo alemão, que além disso também está perdendo mercado para a Nike e outros rivais.

Na quarta-feira, Gulden declarou que 2023 seria um "ano de transição", ao apresentar planos para mudar as prioridades em direção de linhas mais tradicionais de produtos, e cortar custos, a começar por um corte de dividendos dos atuais 3,30 euros por ação para 0,70 centavos de euro.

Ao mesmo tempo, ele disse, a empresa ainda estava tentando decidir o que fazer com o seu estoque restante de tênis e outros artigos esportivos que portam a marca Yeezy.

Gulden disse que ele e sua equipe ainda estavam estudando suas opções, entre as quais a ideia de potencialmente vender o estoque e doar os lucros "para fazer algo de bom". Ele disse que os calçados muito provavelmente não seriam destruídos.

"Precisamos reduzir os estoques e baixar os descontos", disse Gulden. "A Adidas tem todos os ingredientes para ser bem sucedida. Mas precisamos voltar a nos concentrar no nosso núcleo: produto, consumidores, parceiros de varejo e atletas".

A empresa vai continuar a tentar expandir as suas linhas de futebol, corrida, produtos "outdoor" e golfe, disse Gulden, mas ele mantém a esperança de de que as colaborações com influenciadores de mídia social e estrelas da cultura pop, entre as quais Beyoncé e Pharrell Williams, ganhem novo impulso este ano. Elas integram a divisão de estilo de vida da empresa, que nos últimos anos vem sendo fundamental para aumentar a popularidade da Adidas junto a um público mais vasto, especialmente nos Estados Unidos.

Mas o colapso da mais proeminente dessas colaborações pesou, durante a apresentação de resultados da empresa na quarta-feira. No quarto trimestre do ano passado, Ye começou a fazer comentários antissemitas no Twitter que provocaram uma reação imediata, e empresas imediatamente se dissociaram dele.

A Adidas, que foi criticada por não agir com a rapidez suficiente, descreveu os seus comentários e comportamento como "inaceitáveis, odiosos e perigosos, e uma violação dos valores de diversidade e inclusão, respeito mútuo e justiça que a empresa defende".

A ruptura do acordo com Ye deixou a empresa com uma enorme pilha de tênis e peças de roupa, que podem resultar em perda potencial de 1,2 bilhão de euros em vendas e 500 milhões de euros de lucros, este ano.

Quando o contrato foi rescindido, disse Gulden, a Adidas decidiu continuar com a fabricação de produtos Yeezy que estava em curso, para evitar que milhares de pessoas envolvidas perdessem os seus empregos. O futuro desse estoque agora está em questão.

"Se vendermos o estoque, prometo que as pessoas que foram prejudicadas por isso também obterão algo de bom com a venda", disse Gulden.

Ele não acrescentou detalhes, mas disse que doar os proventos faria mais sentido do que apenas doar os sapatos, que têm um valor superior entre colecionadores e outros fãs, no mercado de revenda. Antes do tumulto do ano passado, os tênis Yeezy frequentemente atingiam preços de venda da ordem de centenas de dólares por par.

Organizações judaicas estavam entre as vozes mais fortes que instaram a Adidas e outras empresas a cortar relações com a marca Yeezy, avisando que recusar fazê-lo poderia alimentar ainda mais o ódio contra os judeus, em um momento no qual o antissemitismo está em alta, tanto na Alemanha quanto nos Estados Unidos.

A resposta dessas organizações à ideia de vender o estoque da Yeezy para uma boa causa foi dividida. Holly Huffnagle, diretora de combate ao antissemitismo no American Jewish Committee, disse que um investimento financeiro da Adidas para combater o ódio contra os judeus poderia ser "um bom começo"", mas apelou à empresa para que fizesse um esforço mais abrangente.

Mas Charlotte Knobloch, presidente da Comunidade Judaica de Munique e da Alta Baviera, advertiu que independentemente do que acontecesse com os lucros, devolver os sapatos Yeezy ao mercado enviaria o sinal errado.

"Ao decidir vender a mercadoria de West agora, a Adidas optaria por voltar atrás no tempo e comprometer gravemente os seus próprios valores, independentemente do destino das receitas. Os produtos Yeezy acabariam nas ruas como se nada tivesse acontecido", disse Knobloch.

A empresa havia anunciado anteriormente que era "a única proprietária de todos os direitos de design sobre os produtos existentes", nos termos da parceria, mas Gulden disse na quarta-feira que a possibilidade de mudar o branding do estoque da Yeezy não estava sendo contemplada. Se os produtos forem vendidos em vez de destruídos, Ye ainda teria direito a uma parte dos lucros, nos termos de seu contrato de royalty, mesmo que a Adidas não tenha lucros, disse o executivo.

"Perder o negócio da Yeezy é muito difícil", disse Gulden aos jornalistas na quarta-feira, elogiando a criatividade da colaboração em diversos níveis, entre os quais design, marketing e uso das redes sociais e apps.

"Não há outro negócio como a Yeezy no mercado", ele disse. "Há pessoas que pensam que basta substitui-lo por outra coisa – mas não há como".

A apresentação sobre os resultados da Adidas na quarta-feira foi a primeira de Gulden na empresa, depois de ele ter passado mais de uma dúzia de anos como presidente do conselho da rival Puma, cuja sede fica do outro lado da cidade. As duas empresas têm sede na mesma cidade da Baviera, Herzogenaurach, onde foram fundadas pelos irmãos Dassler, Rudolf e Adi, depois da Segunda Guerra Mundial

A Adidas reportou 6% de alta em suas vendas líquidas em 2022, para 22,5 bilhões de euros, mas o lucro operacional caiu em 66%, para 669 milhões de euros, sob o efeito do abandono da Rússia e da política chinesa de Covid zero, que contribuíram para um aumento nos estoques não vendidos.

As perdas obrigaram a empresa a divulgar quatro alertas de prejuízo ao longo de seis meses, e isso levou as agências de classificação de crédito Moody's e S&P a rebaixarem a classificação de seus papéis de dívida, no mês passado.

Para 2023, a Adidas prevê lucros operacionais subjacentes próximos de zero, considerada a perda de vendas, caso não encontre uma forma de vender o estoque de produtos Yeezy.

Tradução de Paulo Migliacci

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