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Gordon E. Moore, cofundador da Intel e inventor da Lei de Moore, morre aos 94

Com desejo de ser professor, mas sem conseguir um emprego na educação, chamou a si mesmo de empreendedor acidental

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Katie Hafner Holcomb B. Noble

Gordon E. Moore, cofundador e ex-presidente da Intel Corp., a fabricante de chips semicondutores da Califórnia que ajudou a dar nome ao Vale do Silício, alcançando o predomínio industrial antes ocupado pelas ferrovias e siderúrgicas americanas em outra era, morreu na sexta-feira (24) em sua casa no Havaí. Ele tinha 94 anos.

Sua morte foi confirmada pela Intel e pela Fundação Gordon e Betty Moore, sem citar a causa.

Gordon Moore, cofundador e ex-presidente da Intel Corp., morre aos 94 anos - AFP

Com um grupo de colegas, Moore podia reivindicar o crédito por levar computadores a centenas de milhões de pessoas e incorporar microprocessadores em tudo, de balanças de banheiro a torradeiras e carrinhos de brinquedo, telefones celulares, automóveis e aviões a jato.

Moore queria ser professor, mas não conseguiu um emprego na educação e mais tarde chamou a si mesmo de empreendedor acidental. Ele ficou bilionário como resultado de um investimento inicial de US$ 500 no incipiente negócio de microchips, que transformou a eletrônica numa das maiores indústrias do mundo.

E foi ele quem viu o futuro, disseram seus colegas. Em 1965, no que ficou conhecido como Lei de Moore, ele previu que o número de transistores que poderiam ser colocados numa pastilha de silício dobraria em intervalos regulares no futuro previsível, aumentando assim exponencialmente o poder de processamento de dados dos computadores.

Ele acrescentou dois corolários depois: a evolução da tecnologia tornaria os computadores cada vez mais caros para serem desenvolvidos, mas os consumidores pagariam cada vez menos por eles, porque seriam vendidos em grandes quantidades. A Lei de Moore se manteve válida durante décadas.

Por meio de uma combinação do brilhantismo, a liderança, o carisma e os contatos de Moore, assim como os de seu sócio e cofundador da Intel, Robert Noyce, formou-se um grupo amplamente considerado por muitos como dos mais ousados e criativos da era da alta tecnologia.

Foi esse grupo que defendeu o uso de lascas de silício com a espessura de uma unha –uma substância arenosa tratada quimicamente e altamente polida, um dos recursos naturais mais comuns da Terra– por causa do que se revelou a incrível capacidade do silício de abrigar circuitos eletrônicos cada vez menores e que funcionavam em velocidades cada vez maiores.

Com seus microprocessadores de silício –os cérebros de um computador–, a Intel permitiu que os fabricantes americanos em meados da década de 1980 recuperassem a liderança no vasto campo de processamento de dados por computadores de seus concorrentes japoneses. Nos anos 1990, a Intel havia colocado seus microprocessadores em 80% dos computadores fabricados em todo o mundo, tornando-se a empresa de semicondutores mais bem-sucedida da história.

Muito disso aconteceu sob a supervisão de Moore. Ele foi CEO de 1975 a 1987, quando Andrew Grove o sucedeu, e permaneceu como presidente até 1997.

À medida que sua riqueza cresceu, Moore se tornou uma figura importante na filantropia. Em 2001, ele e sua mulher criaram a Fundação Gordon e Betty Moore, com uma doação de 175 milhões de ações da Intel. Em 2001, eles doaram US$ 600 milhões para o Instituto de Tecnologia da Califórnia, na época a maior doação individual para uma instituição de ensino superior. Os ativos da fundação atualmente ultrapassam US$ 8 bilhões, e ela doou mais de US$ 5 bilhões desde sua criação.

Nas entrevistas, Moore era humilde sobre suas realizações, particularmente os avanços técnicos que a Lei de Moore possibilitou.

"O que pude ver foi que os dispositivos semicondutores eram a forma como a eletrônica se tornaria barata. Essa era a mensagem que eu tentava transmitir", disse ele ao jornalista Michael Malone em 2000. "Acabou sendo uma previsão incrivelmente precisa, muito mais do que eu jamais imaginei."

Moore não apenas previu que a eletrônica se tornaria muito mais barata com o tempo, à medida que a indústria mudasse de alguns transistores e tubos para microchips de silício, como ao longo dos anos sua previsão se mostrou tão confiável que as empresas de tecnologia basearam sua estratégia de produto na suposição de que a Lei de Moore manteria sua validade.

"Qualquer empresa que faça um planejamento plurianual racional deve assumir essa taxa de mudança, ou será esmagada", disse Harry Saal, antigo empresário do Vale do Silício.

"Esse é o legado dele", disse Arthur Rock, um dos primeiros investidores na Intel e amigo de Moore. "Não é a Intel. Não é a Fundação Moore. É aquela frase: Lei de Moore."

Gordon Earl Moore nasceu em 3 de janeiro de 1929, em San Francisco, na Califórnia. Ele cresceu em Pescadero, pequena cidade costeira ao sul de San Francisco, onde seu pai, Walter H. Moore, era vice-delegado e a família de sua mãe, Florence Almira Williamson, dona do armazém geral.

Moore se matriculou no Colégio Estadual de San Jose (hoje Universidade Estadual de San Jose), onde conheceu Betty Whitaker, uma estudante de jornalismo. Eles se casaram em 1950. Naquele ano, ele concluiu seus estudos na Universidade da Califórnia em Berkeley, graduando-se em química. Em 1954, recebeu o doutorado, também em química, pela Caltech.

Um dos primeiros empregos a que se candidatou foi como gerente na Dow Chemical. "Eles me enviaram a um psicólogo para ver como isso se encaixaria", escreveu Moore em 1994. "O psicólogo disse que eu estava bem tecnicamente, mas nunca seria um gerente."

Então Moore assumiu um cargo no Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins, em Maryland. Ao buscar um caminho de volta à Califórnia, ele foi entrevistado no Laboratório Lawrence Livermore. Recebeu uma proposta de emprego, mas decidiu que "não queria atuar com bombas nucleares, então recusei", escreveu ele.

Em vez disso, em 1956, Moore juntou-se a William Shockley, o inventor do transistor, para trabalhar numa divisão da Costa Oeste dos Laboratórios Bell, uma nova unidade cujo objetivo era fabricar um transistor de silício barato.

Mas a empresa, Shockley Semiconductor, naufragou sob Shockley, que não tinha experiência em administração. Em 1957, Moore e Noyce se juntaram a um grupo de desertores que ficaram conhecidos como "os oito traidores". Com cada um investindo US$ 500, juntamente com US$ 1,3 milhão do pioneiro da aviação Sherman Fairchild, os oito partiram para formar a Fairchild Semiconductor Corp., que se tornou pioneira na fabricação de circuitos integrados.

Instigados pelo empreendedorismo, Moore e Noyce decidiram em 1968 formar sua própria empresa, com foco na memória dos semicondutores. Eles escreveram o que Moore descreveu como um plano de negócios "muito geral".

"Dizia que iríamos trabalhar com silício… e fazer produtos interessantes", disse ele numa entrevista em 1994.

Apesar de sua vaga proposta, eles não tiveram problemas para encontrar apoio financeiro.

Com capital de US$ 2,5 milhões, Moore e Noyce chamaram sua startup de Integrated Electronics Corp., que mais tarde abreviaram para Intel. O terceiro funcionário era Grove, um jovem imigrante húngaro que havia trabalhado para Moore na Fairchild.

Depois de alguma indecisão sobre qual tecnologia focar, os três decidiram por uma nova versão da tecnologia MOS –semicondutor de óxido metálico– chamada MOS de porta de silício. Para melhorar a velocidade e a densidade de um transistor, eles usaram silício em vez de alumínio.

"Felizmente, muito por sorte, chegamos a uma tecnologia que tinha o grau certo de dificuldade para uma startup de sucesso", escreveu Moore em 1994. "Foi assim que a Intel começou."

No início dos anos 1970, o "computador em um chip" da série 4000 da Intel iniciou a revolução nos computadores pessoais, embora a Intel tenha perdido a oportunidade de fabricar um PC, o que Moore culpou em parte à sua própria miopia.

"Muito antes da Apple, um de nossos engenheiros me trouxe a sugestão de que a Intel deveria construir um computador para uso doméstico", escreveu ele. "E eu perguntei: 'Para que diabos alguém iria querer um computador em casa?’"

Mesmo assim, ele viu o futuro. Em 1963, ainda na Fairchild como diretor de pesquisa e desenvolvimento, Moore contribuiu com um capítulo de livro descrevendo o que se tornaria o precursor de sua lei homônima, sem a previsão numérica explícita. Dois anos depois, ele publicou um artigo na revista Electronics, de grande circulação, intitulado "Amontoando mais componentes em circuitos integrados".

"O artigo apresentou o mesmo argumento do capítulo do livro, com o acréscimo dessa previsão explicitamente numérica", disse David Brock, coautor de "Moore's Law: The Life of Gordon Moore, Silicon Valley's Quiet Revolutionary" [A Lei de Moore: A vida de Gordon Moore, o revolucionário silencioso do Vale do Silício].

Há poucas evidências de que muitas pessoas leram o artigo quando foi publicado, disse Brock.

"Ele continuou dando palestras com tabelas e gráficos, e as pessoas começaram a usar seus slides e reproduzir seus gráficos", disse Brock. "Então as pessoas viram o fenômeno acontecer. Os microchips de silício ficaram mais complexos e seu custo caiu."

Na década de 1960, quando Moore começou na eletrônica, um único transistor de silício era vendido por US$ 150. Mais tarde, US$ 10 comprariam mais de 100 milhões de transistores. Moore escreveu certa vez que, se os carros avançassem tão rapidamente quanto os computadores, "eles percorreriam 100 mil milhas por galão e seria mais barato comprar um Rolls-Royce do que estacioná-lo.

Moore deixa sua mulher e seus filhos Kenneth e Steven, além de quatro netos.

Em 2014, a Forbes estimou o patrimônio líquido de Moore em US$ 7 bilhões. No entanto, ele permaneceu muito discreto ao longo da vida, preferindo camisas surradas e calças cáqui a ternos sob medida. Ele fazia compras no atacadista Costco e tinha uma coleção de iscas e carretilhas de pesca sobre sua mesa de escritório.

A Lei de Moore está prestes a chegar ao fim, pois os engenheiros encontram alguns limites físicos básicos, bem como o custo excessivo de construir fábricas para atingir o próximo nível de miniaturização. E nos últimos anos o ritmo da miniaturização diminuiu.

O próprio Moore comentou algumas vezes sobre o fim inevitável da Lei de Moore. "Não pode continuar para sempre", disse numa entrevista em 2005 à revista Techworld. "A natureza dos exponenciais é que você os força a avançar e, um dia, o desastre acontece."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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