Vereador gaúcho é alvo de processo de cassação após discurso contra baianos

OUTRO LADO: Sandro Fantinel diz que está sendo tratado como criminoso e que vereadores não tinham outra saída após repercussão do caso

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Curitiba

O vereador Sandro Fantinel (sem partido), que em discurso na Câmara de Caxias do Sul (RS) aconselhou empresários e produtores rurais gaúchos a contratarem "funcionários limpos", "não aquela gente lá de cima" em referência a baianos, virou alvo de um processo de cassação por quebra de decoro parlamentar.

A decisão do Legislativo foi tomada por unanimidade pelos vereadores durante sessão nesta quinta-feira (2). A declaração de Fantinel ocorreu após trabalhadores de colheita de uva serem resgatados em regime análogo à escravidão no Rio Grande do Sul.

Fantinel não participou da sessão, que foi acompanhada por manifestantes que pediam a cassação do mandato. À Folha o vereador declarou que seus pares "não tinham outra saída".

"Depois de um turbilhão nacional, afundando o nome de uma pessoa que nunca matou ninguém, e simplesmente proferiu algumas palavras indevidas e pediu desculpas, meus colegas vereadores não tinham como não aprovar [o pedido de abertura de cassação]."

sessão da Câmara de Caxias do Sul com manifestantes ao fundo
Câmara de Caxias do Sul (RS) aceita pedidos de cassação do vereador Sandro Fantinel (sem partido), em sessão nesta quinta-feira (2) acompanhada por manifestantes - Bianca Prezzi/Câmara de Caxias do Sul

"Agora cabe a mim mostrar o grande crime que foi feito, por várias entidades, destruindo um ser humano correto. Sou tratado nacionalmente como um criminoso. Este é o novo Brasil. Essa é a nova democracia", disse Fantinel.

O plenário acolheu quatro denúncias por suposta quebra de decoro do parlamentar. O processo tem prazo de 90 dias para ser concluído.

As denúncias foram apresentadas pelo ex-vice-prefeito municipal Ricardo Fabris de Abreu, pela presidente municipal do PDT, Maria Cecilia Pozza, pelo secretário-geral do Patriota em Porto Alegre, Davi Catarino Santana, e pelas Defensorias Públicas dos Estados da Bahia e do Rio Grande do Sul.

Além do pedido de cassação, Fantinel já foi expulso do Patriota e também é alvo de um inquérito policial e de uma investigação aberta pelo Ministério Público do Trabalho. O Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul também estuda medidas contra o parlamentar, nas esferas criminal e civil.

O inquérito na Polícia Civil foi aberto na quarta-feira (1º) pelo delegado Rafael Keller, da 1ª Delegacia de Caxias do Sul. Ele disse que vai apurar eventual crime de racismo nas falas do vereador, com base nos artigos 2º e 20º da Lei 7.716/1989.

O Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul também abriu, de ofício, investigação contra o vereador.

Para o procurador do Trabalho Italvar Medina, a fala do vereador "minimiza, indevidamente, a extrema gravidade da escravidão contemporânea, busca culpabilizar as próprias vítimas pelos ilícitos sofridos, tem conteúdo preconceituoso e, para piorar, estimula a discriminação nas relações de trabalho".

Na semana passada, na cidade de Bento Gonçalves (RS), uma operação encabeçada pelo Ministério Público do Trabalho retirou 207 trabalhadores de situação análoga a de escravidão —a Bahia era o estado de origem da grande maioria dos trabalhadores resgatados.

beliches em quarto apertado
Quarto alvo de pperação com PRF, MPT e Ministério do Trabalho resgatou trabalhadores que atuavam em colheita de uva em Bento Gonçalves (RS) - Divulgação

Ao começar seu discurso na Câmara, na terça-feira (28), Fantinel disse que subia à tribuna para prestar solidariedade aos empresários e produtores rurais e que conhecia o problema da falta de mão de obra para o trabalho no campo.

"Essa pauta ganhou grande repercussão em função dos acontecimentos em Bento Gonçalves, que na minha visão são exagerados e midiáticos. Me deparei com uma avalanche de críticas e até ofensas a empresas e empresários do setor de vinícolas que são desmedidas e injustas. Empresas que são muito importantes para a nossa serra gaúcha e nosso país e estão sofrendo um verdadeiro linchamento virtual", disse ele.

Na sequência, ele afirma ter apenas um conselho aos empresários e produtores rurais: "Não contratem mais aquela gente lá de cima. Conversem comigo e vamos contratar os argentinos. São limpos, trabalhadores, corretos, cumprem o horário, mantêm a casa limpa e, no dia de ir embora, ainda agradecem ao patrão pelo dinheiro que receberam".

Com os baianos, seguiu o vereador, "a única cultura que eles têm é viver na praia, tocando tambor, era normal que fosse ter este tipo de problema". "Então, deixem de lado aquele povo, que é acostumado com Carnaval e festa, para vocês não se incomodarem novamente".

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